Fato Jurídico

Conceito



Quando o direito valora um acontecimento natural ou humano, isto é, quando um evento derivado de um acontecimento humano ou da natureza repercute na ciência jurídica, este é um fato jurídico.

Fato Jurídico: aquilo que gera aquisição, modificação ou extinção de direitos e deveres. É o fato real, o acontecimento da vida, associado a sua relação com o homem e a sua relevância para o Direito.

Segundo Marcos Bernardes de Mello, é “resultado da incidência da norma jurídica sobre seu suporte fáctico quando concretizado no mundo dos fatos”.

O fato jurídico abrange o acontecimento e as consequências, mas estes, no Código, não precisam estar expressos em uma mesma norma. Uma norma pode ser integrativa, isto é, integrar o conteúdo de outra para concretizar o fato jurídico; ou remissiva, que retorna à outra norma para efetuar sua completude. O que importa de fato é que as normas que, juntas, abrangem um determinado fato jurídico façam parte do mesmo ordenamento. Em resumo, a norma jurídica prevê fatos (suporte fáctico) aos quais imputa certa consequência (eficácia jurídica).

Quando o fato não repercurte juridicamente a doutrina o determina como fato material ou ajurídico. Assim, para que um fato seja classificado como material ou jurídico deve-se analisar as circunstâncias do caso concreto e dos efeitos produzidos. Entretanto, quando o fato se enquadra nas normas abstratas do ordenamento jurídico é um fato jurídico, uma vez que gera efeitos tutelados pelo Direito.

Classificação dos fatos jurídicos

 

Fato Jurídico: Acontecimento da vida que é relevante ao Direito. São fatos naturais, sem conduta humana. Carlos Roberto Gonçalves os divide em ordinários (nascimento e morte) e extraordinários (caso fortuito e força maior)

Via de regra, os fatos jurídicos sobrevivem ainda que a norma ou o suporte fático deixem de existir. Para defender tal conceito, o Código protege o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada. O princípio da irretroatividade das leis serve ao mesmo objetivo.

O fato jurídico pode ser classificado quanto a sua licitude, isto é, se está ou não em conformidade com o Direito.

Art. 188. Não constituem atos ilícitos:

I - os praticados em legítima defesa ou no exercício regular de um direito reconhecido;

II - a deterioração ou destruição da coisa alheia, ou a lesão a pessoa, a fim de remover perigo iminente.

Parágrafo único. No caso do inciso II, o ato será legítimo somente quando as circunstâncias o tornarem absolutamente necessário, não excedendo os limites do indispensável para a remoção do perigo.

Fato Jurídico Contrário ao Direito

Fatos que de alguma forma produzem sanções em razão de violarem a ordem jurídica. Deve, de forma impreterível, haver um comportamento humano transgressor da norma. Podem ser classificados como:

Ato-ilícito subjetivo

Conduta permeada pelo elemento culpa. Para haver o ilícito subjetivo civil é necessário dano. O dano é elemento do ato ilícito de natureza subjetiva no Direito Civil, conforme o art. 186 CC.

Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.

Ato-ilícito objetivo

Abuso do direito. Fatos humanos que, de alguma forma, violam a ordem jurídica. Analisa-se a conduta no exercício de direitos subjetivos que excedem os limites impostos pela função social, função econômica.

Art. 187. Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes.

Fato Jurídico em Conformidade com o Direito

Os efeitos do fato são tutelados pelo Direito, assim, não há sanção. Os fatos lícitos que produzem efeitos válidos podem ser: ato jurídico, ato-fato jurídico, fato jurídico em sentido estrito. A classificação é baseada na conduta volitiva humana.  

Atos Jurídicos

São ações humanas que exigem manifestação de vontade e criam, modificam, transferem ou extinguem direitos. São classificadas como negócio jurídico ou ato jurídico stricto sensu.

Negócio Jurídico: a pessoa natural/jurídica que o realiza pode interferir nos efeitos que se realizam com aquele contrato (arts. 104 a 184 CC). Exemplo: compra e venda; a pessoa decide sobre valor, entrega, forma de pagamento, etc.

Art. 104. A validade do negócio jurídico requer:

I - agente capaz;

II - objeto lícito, possível, determinado ou determinável;

III - forma prescrita ou não defesa em lei.

Ato Jurídico Stricto Sensu: a pessoa natural/jurídica não interfere nos efeitos, não existindo possibilidade de escolha, pois estes já estão previstos por lei. A intenção ou declaração de vontade (exigida por lei) qualifica o ato jurídico stricto sensu. Exemplo: casamento (todos os efeitos são aqueles previstos em lei); reconhecimento de paternidade (basta o reconhecimento, não cabendo condição, termo ou encargo).

  • Potestativo: atos que a ordem jurídica confere efeitos invariáveis adstritos tão somente ao resultado da ação. Alguns autores os denominam atos materiais ou reais, neles incluindo a ocupação, a fixação e transferência de domicílio, a percepção de frutos etc.
  • Participação: consiste apenas em declaração para ciência de terceiros ou comunicação de intenções ou de fatos, como se dá com as intimações, interpelações e notificações. Têm necessariamente destinatário, mas não conteúdo negocial.

Assim, quando alguém estabelece sua residência com ânimo definitivo, constitui, nesse local, o seu domicílio, mesmo não tendo feito nenhuma declaração nesse sentido. Porém, não lhe é permitido determinar em contrário nem lhe atribuir outro efeito que não seja o previsto pela norma jurídica.

Ato Jurídico em Sentido Estrito Negócio Jurídico
É sempre unilateral e potestativo É, em regra, bilateral, havendo, todavia, alguns poucos negócios jurídicos unilaterais
É menos rico de conteúdo. O efeito da manutenção da vontade está previsto na lei e não pode ser alterado pelo agente Permite a escolha da categoria jurídica almejada e o autorregramento de condutas, ou seja, a obtenção de múltiplos efeitos no exercício da autonomia privada
Em alguns casos, a lei exige uma manifestação da vontade; em outros, contenta-se com a mera intenção ou comportamento do agente Exige uma vontade qualificada, sem vícios, manifestada por pessoa maior e que tenha o necessário discernimento. 

Ato-Fato Jurídico

A vontade é irrelevante para que se realize o acontecimento, mas existe fato resultante de ação. Comportamento humano independente de vontade humana, assim, desencadeando fatos previstos em lei. A diferença entre o ato jurídico stricto sensu e o ato-fato jurídico é que este não tem necessariamente uma conduta volitiva. Atos dotados de ampla aceitação social que não tenham manifestação de vontade explícita, ainda que devendo tê-la, são considerados atos-fatos jurídicos. No ato​-fato jurídico, ressalta​-se a consequência do ato, o fato resultante, sem se levar em consideração a vontade de praticá​-lo. Exemplo: achar tesouro.

Assim, por exemplo, não se considera nula a compra de um doce ou sorvete feita por uma criança de sete ou oito anos de idade, malgrado não tenha ela capacidade para emitir a vontade qualificada que se exige nos contratos de compra e venda (GONÇALVES, 2014).

  • Atos reais: independe da vontade, importando apenas o resultado, como a aquisição de tesouro, especificação, produção de obras artísticas, literárias, pesca...
  • Ato indenizativo: dever de indenizar prejuízo gerado a outrem, ainda que dentro da lei em atividade lícita, quando causa dano, como o caso em que vaza material radioativo de uma indústria.
  • Ato caducificantes: extinção de determinado direito devido a inércia e o tempo (não exprime resultados ao longo do tempo). Exemplo: prescrição e decadência.

O novo Código, com relação aos atos jurídicos lícitos que não sejam negócios jurídicos (portanto, ato jurídico stricto sensu e ato​-fato jurídico), abriu​-lhes um título, com artigo único, em que se determina, à semelhança do que o faz o art. 295 do Código Civil português de 1966, que se lhes apliquem, no que couber, as disposições disciplinadoras do negócio jurídico (GONÇALVES, 2014).

Fato jurídico em sentido estrito

Evento da natureza que traz consequências jurídicas. A exemplo da morte, nascimento com vida, eventos de força maior como terremotos, enchentes, decurso do tempo.

Exame de Ordem Unificado - XXIII (FGV) - 2017
Questão 1.

Em ação judicial na qual Paulo é réu, levantou-se controvérsia acerca de seu domicílio, relevante para a determinação do juízo competente. Paulo alega que seu domicílio é a capital do Estado do Rio de Janeiro, mas o autor sustenta que não há provas de manifestação de vontade de Paulo no sentido de fixar seu domicílio naquela cidade.

Sobre o papel da vontade nesse caso, assinale a afirmativa correta.  

A
Por se tratar de um fato jurídico em sentido estrito, a vontade de Paulo na fixação de domicílio é irrelevante, uma vez que não é necessário levar em consideração a conduta humana para a determinação dos efeitos jurídicos desse fato.
B
Por se tratar de um ato-fato jurídico, a vontade de Paulo na fixação de domicílio é irrelevante, uma vez que, embora se leve em consideração a conduta humana para a determinação dos efeitos jurídicos, não é exigível manifestação de vontade.
C
Por se tratar de um ato jurídico em sentido estrito, embora os seus efeitos sejam predeterminados pela lei, a vontade de Paulo na fixação de domicílio é relevante, no sentido de verificar a existência de um ânimo de permanecer naquele local.
D
Por se tratar de um negócio jurídico, a vontade de Paulo na fixação de domicílio é relevante, já que é a manifestação de vontade que determina quais efeitos jurídicos o negócio irá produzir.
Questão 2.

Assinale a alternativa INCORRETA:

A
A decadência extingue o direito e a prescrição extingue a pretensão
B
O ato jurídico stricto sensu é unilateral e potestativo
C
O ato jurídico stricto sensu tem efeitos previstos em lei, não sendo alterados pela vontade do agente
D
O negócio jurídico independe da manifestação de vontade
E
No negócio jurídico, a pessoa pode exercer sua autonomia privada e escolher a categoria jurídica a qual atender
Exame de Ordem - Cespe 2008 (CESPE) - 2008
Questão 3.
A respeito do fato jurídico, assinale a opção correta.
A
A decadência extingue a pretensão e, por via oblíqua, o direito.
B
Pode haver renúncia à prescrição antes da consumação do respectivo prazo, desde que não haja prejuízo a terceiros.
C
Ato jurídico em sentido estrito é o que surge como mero pressuposto de efeito jurídico preordenado pela lei sem função e natureza de autorregulamento.
D
O negócio jurídico, ato independente da vontade humana, produz efeitos jurídicos, criando, modificando ou extinguindo direitos.
Questão 4.
O fato jurídico em sentido amplo:
A
É todo e qualquer fato de caráter físico ou social.
B
É sempre natural e ocorre independentemente da ação humana.
C
Ocorre sempre de maneira natural, podendo ser subdividido em ordinário ou extraordinário.
D
É todo e qualquer fato, de ordem física ou social, que provoca a tensão do ordenamento jurídico.
Questão 5.
Os atos jurídicos:
A
Não são um fato jurídico.
B
São sempre negócios jurídicos.
C
Podem ser não negociais ou negociais.
D
Não ocorrem pela manifestação consciente da vontade.
Analista Judiciário - Área Direito (FCC) - 2009
Questão 6.
O fato jurídico é todo acontecimento da vida relevante para o direito, mesmo que ilícito, podendo-se afirmar que:
A
os fatos humanos por si só, ou atos jurídicos em sentido amplo, não criam nem modificam direitos.
B
fatos humanos e fatos naturais significam a mesma coisa, ainda que decorram uns da atividade humana e outros da natureza.
C
os fatos naturais não se confundem, por exemplo, com o nascimento, a morte e a maioridade.
D
os fatos extraordinários não guardam relação com tempestades, terremotos e raios, por exemplo.
E
os fatos extraordinários não se enquadram na categoria dos fortuitos ou de força maior.
Exame de Ordem Unificado - XXXVI (FGV) - 2022
Questão 7.

João dirigia seu carro, respeitando todas as regras de trânsito, quando foi surpreendido por uma criança que atravessava a pista. Sendo a única forma de evitar o atropelamento da criança, João desviou seu veículo e acabou por abalroar um outro carro, que estava regularmente estacionado.

Passado o susto e com a criança em segurança, João tomou conhecimento de que o carro com o qual ele havia colidido era dos pais daquela mesma criança. Diante das circunstâncias, João acreditou que não seria responsabilizado pelo dano material causado ao veículo dos pais. No entanto, para sua surpresa, os pais ingressaram com uma ação indenizatória, requerendo o ressarcimento pelos danos materiais.

Diante da situação hipotética narrada, nos termos da legislação civil vigente, assinale a opção correta.

A
João cometeu um ato ilícito e, como consequência, deverá indenizar pelos danos materiais causados, visto inexistir causa excludente de ilicitude da sua conduta.
B
A ação de João é lícita, pois agiu em estado de necessidade, evitando um mal maior e, sendo assim, não deverá indenizar os pais da criança.
C
A ação de João é lícita, pois agiu em estado de necessidade, evitando um mal maior, porém subsiste o seu dever de indenizar os pais da criança.
D
João cometeu um ato ilícito, porém o prejuízo deverá ser suportado pelos pais da criança.
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