Nesta aula, analisaremos a relação entre o Presidente da República e seus auxiliares diretos, os Ministros de Estado, com base nas competências privativas estabelecidas nos incisos I e II do Artigo 84 da Constituição Federal de 1988 (CF/88).
Como vimos na aula anterior, o Art. 84 estabelece um rol de competências privativas do Presidente, o que significa que a titularidade das funções é dele, embora a execução de algumas possa ser delegada.
O primeiro inciso da competência privativa presidencial estabelece:
Art. 84. Compete privativamente ao Presidente da República:
I - nomear e exonerar os Ministros de Estado;
Os Ministros de Estado são frequentemente descritos como longamanus (literalmente, "mãos longas") do Presidente da República. Eles são os agentes responsáveis por fazer a conexão entre a tarefa política, definida pelo Chefe do Executivo (o Presidente), e a tarefa administrativa de executar essa política.
A Administração Pública Federal é vasta e dividida em "pastas" (Ministérios), cada qual com uma atribuição específica (ex: Economia, Justiça, Saúde, Relações Exteriores). Como é impossível que o Presidente da República gerencie pessoalmente todos esses assuntos simultaneamente, ele nomeia Ministros como seus representantes de confiança para executar essas funções.
Os Ministros de Estado são classificados pelo Direito Administrativo como agentes políticos. Isso significa que sua investidura não depende de concurso público, mas sim de um critério de confiança política.
O ato de "nomear e exonerar" é, portanto, um ato de natureza puramente discricionária do Presidente, baseado em critérios de conveniência e oportunidade política. Os Ministros permanecem no cargo enquanto gozarem da confiança do Presidente.
A transcrição faz uma distinção técnica importante:
O segundo inciso complementa o primeiro, definindo a estrutura de comando:
Art. 84. Compete privativamente ao Presidente da República:
II - exercer, com o auxílio dos Ministros de Estado, a direção superior da administração federal;
Este inciso confirma que, embora os Ministros executem tarefas em suas pastas, a direção superior (a definição de estratégias, metas e a palavra final) pertence ao Presidente da República. Os Ministros atuam como seus auxiliares nessa direção.
Se o Presidente, por exemplo, estiver descontente com o trabalho do Ministro da Economia, ele pode, usando sua competência do Inciso I, exonerar o antigo e nomear um novo que esteja mais alinhado com sua visão para a direção da administração.
É crucial diferenciar o agente (a pessoa) do órgão (a estrutura):
Agentes (Pessoas):
Órgãos (Estruturas):
O Art. 84, I, trata da nomeação e exoneração dos agentes (os Ministros), e não da extinção dos órgãos (os Ministérios), que geralmente depende de lei.
Além do Art. 84, I e II, o papel dos Ministros é detalhado no Art. 87:
Art. 87 da CF/88. Os Ministros de Estado serão escolhidos dentre brasileiros maiores de vinte e um anos e no exercício dos direitos políticos.
Parágrafo único. Compete ao Ministro de Estado, além de outras atribuições estabelecidas nesta Constituição e na lei:
I - exercer a orientação, coordenação e supervisão dos órgãos e entidades da administração federal na área de sua competência e referendar os atos e decretos assinados pelo Presidente da República;
II - expedir instruções para a execução das leis, decretos e regulamentos;
III - apresentar ao Presidente da República relatório anual de sua gestão no Ministério;
IV - praticar os atos pertinentes às atribuições que lhe forem outorgadas ou delegadas pelo Presidente da República.
Note que o Inciso IV do parágrafo único do Art. 87 confirma exatamente o que foi dito na transcrição: os Ministros praticam os atos que lhes forem delegados pelo Presidente da República, nos termos do Art. 84, Parágrafo Único.
A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (STF) consolida a natureza desses atos:
O STF entende que a nomeação e a exoneração de Ministros de Estado são atos que se inserem na esfera de absoluta discricionariedade (poder de escolha) do Presidente da República. São cargos de livre provimento e exoneração, chamados ad nutum (expressão latina que significa "por um aceno" ou "por simples vontade").
Ao Judiciário não cabe analisar o mérito dessa decisão (se o Ministro é bom, ruim, competente ou se a troca foi politicamente correta). O controle judicial se limita à legalidade formal, como, por exemplo, verificar se o nomeado cumpre os requisitos do Art. 87 (ser brasileiro, maior de 21 anos, etc.).
Jurisprudência (Exemplo de Raciocínio): No julgamento do MS 32.748/DF (Rel. Min. Celso de Mello), embora o caso tratasse do Advogado-Geral da União (que possui status de Ministro), o STF reiterou que a nomeação e exoneração de cargos dessa natureza (Art. 84, I) são expressões do "poder discricionário do Chefe do Executivo", fundadas na "relação de confiança" (fidúcia) que deve existir entre o Presidente e seus auxiliares diretos.
O STF classifica Ministros de Estado como agentes políticos. Isso tem consequências relevantes, como o fato de responderem por crimes de responsabilidade e, no caso de crimes comuns (como corrupção ou peculato), serem julgados originariamente pelo próprio Supremo Tribunal Federal.
Fundamento Legal: Art. 102 da CF/88. Compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a guarda da Constituição, cabendo-lhe:
I - processar e julgar, originariamente:
(...)
c) nas infrações penais comuns, [...] os Ministros de Estado [...];