Evolução do Conceito de Organização Criminosa

A primeira lei que tratou das organizações criminosas foi a Lei 9034/95. No entanto, ela não definiu o que seria uma organização criminosa, limitando-se a falar que o objeto da lei eram ilícitos decorrentes de ações praticadas por quadrilha ou bando ou organizações ou associações criminosas de qualquer tipo. Dessa forma, a aplicação dessa lei só ocorria nos crimes praticados por quadrilha ou bando (associação de mais de três pessoas para cometer crimes). Aos crimes realizados em associação ainda era aplicada a Lei de Drogas e a Lei do Genocídio. Por esse motivo, Luiz Flávio Gomes apelidou essa lei de “Lei Oca”, já que ela versa sobre quadrilha ou bando sem conceituar. 

Em 1998, foi aprovada a Lei de Lavagem de Capitais (Lei 9613/98), que dispôs sobre organização criminosa em seu artigo 1º, VI. No entanto, novamente essa lei não definiu Organização Criminosa de forma específica. Novamente, não havia possibilidade de aplicar esse dispositivo legal pela falta de conceituação. 

A Convenção de Palermo, tratado internacional estruturado para combater as Organizações Criminosas, e que finalmente traz um conceito de Organização Criminosa. O artigo 2º, a, desse tratado, dispõe que organizações criminosas são grupos de três ou mais pessoas, existentes há algum tempo e atuando com o propósito de cometer uma ou mais infrações grave e com objetivo de obter benefício econômico ou material de qualquer forma. 

Apesar dessa Convenção ter sido internalizada pelo Brasil, havia dúvidas sobre a possibilidade de utilizar esse conceito no direito interno. Para o STJ, inicialmente, seria possível utilizar essa convenção para complementar o direito interno (HC 77.771). O STF, no entanto, proibiu essa aplicação, entendendo que somente o Congresso Nacional é quem poderia legislar sobre crimes e penas (HC 96.007). Dessa forma, a Lei 9034/95 continuou oca, sem aplicabilidade, por não haver um conceito legal de organização criminosa aplicável no Brasil. 

A Lei do Julgamento Colegiado (Lei 12.694/12) surgiu no ano de 2012 em razão de vários juízes estarem sendo ameaçados e assassinados por conta de sentenças contrárias aos interesses do crime organizado. Seria possível que os casos fossem julgados por três magistrados, ao invés de apenas um. 
Essa lei, no artigo 2º, finalmente trouxe um conceito legal de organização criminosa. Vejamos:

Art. 2º. Para os efeitos desta Lei, considera-se organização criminosa a associação, de 3 (três) ou mais pessoas, estruturalmente ordenada e caracterizada pela divisão de tarefas, ainda que informalmente, com objetivo de obter, direta ou indiretamente, vantagem de qualquer natureza, mediante a prática de crimes cuja pena máxima seja igual ou superior a 4 (quatro) anos ou que sejam de caráter transnacional.

Essa lei apenas define organização criminosa, sem contudo considerar crime integrar essas organizações. Essa conduta passou a ser tipificada somente em 2013, quando da entrada em vigor da Lei das Organizações Criminosas (Lei 12.850/13). Essa lei conceitua organizações criminosas da seguinte forma:

Art. 1º (...)

§ 1º Considera-se organização criminosa a associação de 4 (quatro) ou mais pessoas estruturalmente ordenada e caracterizada pela divisão de tarefas, ainda que informalmente, com objetivo de obter, direta ou indiretamente, vantagem de qualquer natureza, mediante a prática de infrações penais cujas penas máximas sejam superiores a 4 (quatro) anos, ou que sejam de caráter transnacional.

É possível notar que houve mudanças na definição de organização criminosa, já que, enquanto a lei do julgamento colegiado traz a necessidade de associação de 3 ou mais pessoas, para a prática de crime de pena igual ou superior a 4 anos, a Lei de Organização Criminosa define Orcrim como a associação de 4 ou mais pessoas, com divisão de tarefas, para a prática de qualquer infração penal de pena máxima igual ou maior que 4 anos. 

Segundo a corrente majoritária, aplica-se o conceito da Lei de Organização Criminosa (LOC) em detrimento da Lei do Julgamento Colegiado. Por ser uma lei mais recente, o entendimento que prevalece é de que houve revogação tácita do conceito inscrito na Lei do Julgamento Colegiado. 

Questões

Inimputáveis

Dentro do número mínimo de integrantes, são contabilizados os menores de idade (inimputáveis), de acordo com a doutrina, da mesma forma como é computado nos demais delitos associativos. 

Membro referido

Segundo o entendimento majoritário, é possível considerar associação quando há prisão de três membros e o quarto é apenas referido pelos demais, através de codinome, ou simplesmente do primeiro nome (pessoa não identificada), desde que seja comprovado que a pessoa existe com certeza. 

Cômputo do agente infiltrado

O agente infiltrado na organização não pode ser contabilizado para fins de enquadramento no número mínimo, por uma questão lógica, já que só é possível o uso do agente infiltrado nas OCRIM que já existem (em que há ao menos 4 integrantes).

Associação criminosa x Concurso de agentes

A associação é marcada pela estabilidade dos membros do grupo, ao contrário da união do concurso de crimes, que é efêmera, passageira. No concurso, existe a união de esforços para um crime em específico, em regra. 

Além disso, a vantagem auferida pela organização criminosa não precisa necessariamente ser de cunho financeiro, já que a lei menciona “vantagens de qualquer natureza”, e haverá crime mesmo que os indivíduos exerçam atividades lícitas durante parte do tempo. 

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