Competência Pelo Lugar da Infração - Domicílio do Réu

Introdução

O art. 69, I, CPP, como visto, coloca o lugar da infração como um critério de fixação de competência. Conforme o art. 70, CPP, a regra é que o lugar seja aquele em que se consumou a infração. A consumação é a última etapa do iter criminis, isto é, todo o caminho que se percorre ao longo do crime. 

É importante relembrar que, quanto à consumação, o crime pode ser formal (aquele em que o resultado não é necessário para que ocorra o crime, como na extorsão, que se consuma mesmo que o agente não receba a vantagem), material (aquele em que o resultado é necessário, como no homicídio, que exige a morte para a consumação) e de mera conduta (aquele que sequer apresenta algum resultado, como a embriaguez ao volante).

Retomando, o Código de Processo Penal adota a Teoria do Resultado, ou seja, o lugar da infração é aquele em que se consumou a infração. Por exemplo, o local do banco roubado é que define a competência territorial. Sendo caso de tentativa, é competente o último local de execução.

É importante não confundir os critérios adotados no Código de Processo Penal e no Código Penal. O CPP, ao tratar da competência, ou seja, ao definir onde será processado e julgado o delito, adota o local da consumação pela Teoria do Resultado, ou seja, será competente o juízo de onde se consumou o crime.

O Código Penal, por sua vez, ao definir o local do crime no seu art. 6º, ou seja, para definir, por exemplo, se ele foi cometido no Brasil ou não, adota a Teoria da Ubiquidade, ou seja, o crime ocorreu tanto onde foi a ação ou omissão quanto onde foi o resultado ou consumação. Por exemplo, se o agente dispara contra a vítima na Argentina e esta vem a falecer no Brasil, considera-se que o crime aconteceu em ambos os países.

A Lei 9.099/1995, Lei do JECrim, que cuida das infrações de menor potencial ofensivo, aponta como regra de competência o local da ação ou omissão, sendo diferente da regra do CPP (Teoria da Ação).

No caso de tentativa, será competente o local do último ato de execução. A tentativa interrompe o iter criminis por motivos alheios à vontade do agente. O crime começa a ser executado quando o agente começa o verbo núcleo do tipo, mas o agente não consegue completar sua execução. Por exemplo, o agente tenta furtar um carro e é impedido – a competência é deste local.

Se a infração for iniciada no Brasil e se completar fora, será considerado o local do último ato de execução no território brasileiro. É a mesma regra do caput adotada à transnacionalidade.

Se o último ato de execução foi pratica no exterior, será considerado o local no Brasil em que ocorreu o resultado ou onde ele deveria ter ocorrido. Por exemplo, um argentino manda uma bomba para matar um brasileiro, mas ela foi interceptada. Será competente o juiz do lugar em que o crime ocorreria, ou seja, onde o brasileiro deveria receber a bomba e morrer.

Casos Especiais Trazidos Pela Lei 14.155/2021 – Art. 70, § 4º, CPP.

§4º Nos crimes previstos no art. 171 do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal), quando praticados mediante depósito, mediante emissão de cheques sem suficiente provisão de fundos em poder do sacado ou com o pagamento frustrado ou mediante transferência de valores, a competência será definida pelo local do domicílio da vítima, e, em caso de pluralidade de vítimas, a competência firmar-se-á pela prevenção.

Existe um novo critério especial criado pelo legislador na Lei 14.155/2021, que criou o art. 70, § 4º, CPP. É o caso do estelionato praticado mediante depósito, cheque sem fundo, pagamento frustrado ou transferência de valores. Nestes casos, o domicílio da vítima será o local competente para o processo e julgamento do crime. Se houver pluralidade de vítimas, ocorrerá a prevenção.

Da Competência Pelo Domicílio/Residência do Réu

É uma aplicação subsidiária em relação ao local da infração, acima estudado. Se se sabe onde ocorreu a infração, aplica-se a Teoria do Resultado; caso contrário, domicílio ou residência do réu. 

Exceções

Em alguns casos, aplica-se a Teoria da Atividade, ou seja, considera-se como local do crime e juízo competente aquele em que aconteceu a ação ou omissão (não o resultado), como no caso das infrações de menor potencial ofensivo, por força da Lei 9.099/1995, do ato infracional (não é crime, mas segue esta regra de fixação da competência) e do homicídio plurilocal. Por exemplo, alguém recebeu um tiro em Cravinhos, mas o sujeito faleceu em um hospital de Ribeirão Preto. Pela questão probatória e pelo impacto que um crime de homicídio traz numa sociedade, que inclusive irá julgar através do Tribunal do Júri, considera-se o crime cometido em Cravinhos. Se os “iguais” irão julgar o homicida, normal que ele seja julgado onde praticou a conduta.

Crime de Ação Privada

Conforme art. 73 do Código de Processo Penal, existe uma hipótese de foro de eleição em Direito Processual Penal: nos casos de ação penal privada, o querelante pode optar pelo foro de domicílio ou residência do réu, mesmo que conhecido o lugar da infração. Portanto, enquanto a regra é que o domicílio do réu somente fixa a competência quando não se sabe o lugar da infração, na ação penal privada pode o querelante escolher.

Em resumo, a regra básica é que a competência territorial é determinada com base no local da consumação – sendo tentativa, no último ato executório. Os §§ 1º e 2º tratam de crimes à distância ou de espaço máximo, aqueles em que há territórios nacional e estrangeiro envolvidos.

  • Crimes formais: o principal exemplo está no crime de extorsão mediante telefone. O agente fez a ligação de Bangu para a cidade de São Paulo (local da vítima), exigindo a entrega do dinheiro no Guarujá. De quem é a competência territorial deste crime de extorsão? O local da ligação é o local da ação ou omissão; o Guarujá é o local do exaurimento do delito (crime formal). Logo, o local da consumação do delito é onde a vítima se viu constrangida (São Paulo). 
  • Crime permanente que se prolonga por várias comarcas: o exemplo principal é a extorsão mediante sequestro que envolve diversos cativeiros. Em tese, como a consumação se prolonga no tempo, houve consumação em todas as comarcas. Logo, o critério é a prevenção (critério residual), ou seja, qual juiz praticou o primeiro ato decisório.
  • Crimes plurilocais de homicídio (princípio do esboço do resultado): é aquele crime em que a ação ou omissão ocorre em uma determinada comarca, ao passo que o resultado ocorre em outro. Alguém é agredido em Sete Lagoas, encaminhado ao hospital de Belo Horizonte e lá morre. Pela regra do art. 70, a competência seria do Tribunal do Júri de Belo Horizonte, pois o homicídio se consuma com o óbito. Porém, neste caso, os Tribunais Superiores dizem que a competência é do local da conduta, do local do esboço do resultado. Isto se dá, primeiramente, pela maior facilidade probatória e pela política criminal, porque é a comunidade de Sete Lagoas que fica abalada com o acontecimento.
  • Competência territorial com fundamento no domicílio do acusado: ocorre em duas hipóteses. Primeiramente, nos casos de exclusiva ação penal privada, onde surge o que a doutrina chama de foro de eleição do processo penal – o querelante pode escolher em propor a demanda no local de consumação do delito ou no domicílio do acusado. A segunda hipótese acontece quando incerto o local da consumação do delito (art. 72, CPP). Ex.: crime de furto cometido durante uma viagem de ônibus.
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