A Eficácia dos Direitos Fundamentais
Eficácia Vertical dos Direitos Fundamentais
A eficácia vertical dos direitos fundamentais é a aplicação de tais direitos na relação entre o particular e o Estado. Trata-se da amplitude da vinculação do poder público aos direitos fundamentais, de forma que cada ato do poder público deve ter os direitos fundamentais como baliza e referencial.
A vinculação do Estado pode ser vista sob o prisma formal ou institucional, significando a vinculação dos órgãos dos 3 poderes, mas também pode ser vista sob a ótica material ou funcional (todas as funções estatais são vinculadas aos direitos fundamentais).
Vinculação do Poder Legislativo
- Sentido negativo: proibição de edição de atos legislativos contrários às normas de direitos fundamentais;
- Acepção positiva: dever de conformação de acordo com os parâmetros fornecidos pelas normas de direitos fundamentais e, neste sentido, um dever de realização destes;
- Inércia do legislador em face de uma imposição contida nas normas de direitos fundamentais pode ensejar a inconstitucionalidade por omissão;
- Até mesmo o legislador constitucional está vinculado.
Vinculação do Poder Executivo
- Os órgãos administrativos devem executar apenas as leis que sejam conformes aos direitos fundamentais, bem como executá-las de forma constitucional, ou seja aplicando-as e interpretando-as em conformidade com os direitos fundamentais;
- A não observância desses postulados pode levar a invalidação judicial dos atos administrativos;
- A Administração pode se recusar a aplicar normas manifestamente inconstitucionais, carregadas de inconstitucionalidade inequívoca - nas situações em que há dúvida sobre a constitucionalidade, o poder executivo não pode exercer o controle por si só, devendo aplicar a norma.
Vinculação do Poder Judiciário
- Constitucionalização da própria organização dos tribunais e do procedimento judicial e vinculação do conteúdo dos atos jurisdicionais aos direitos fundamentais;
- Exercício do controle de constitucionalidade dos atos dos demais órgãos estatais;
- Os atos judiciais que atentam contra os direitos fundamentais podem constituir objeto de controle jurisdicional (função de Corte Constitucional do STF).
Eficácia Horizontal dos Direitos Fundamentais
A eficácia horizontal dos direitos fundamentais refere-se a aplicação desses direitos na esfera jurídico-privada, ou seja, no âmbito das relações jurídicas entre particulares. A eficácia horizontal representa uma constatação de que a opressão e a violência não advém somente do Estado, mas também de múltiplos atores privados, fazendo com que a incidência dos direitos fundamentais fosse estendida para as relações particulares.
No Estado Social de Direito, não apenas o Estado ampliou as suas atividades e funções, mas também a sociedade, cada vez mais, participa ativamente do exercício do poder. Isso faz com que seja necessária a proteção da liberdade individual não apenas contra os poderes públicos, mas também contra os mais fortes no âmbito da sociedade.
A Constituição, então, coloca-se como um marco para a construção de um direito privado mais social e preocupado com os atores sociais mais vulneráveis (A CF atua como um limite e uma garantia do direito privado). Em tese, os particulares encontram-se em situação de igualdade jurídica, porém o próprio texto constitucional reconhece determinadas distorções na sociedade, as quais podem condicionar o modo de aplicação dos direitos fundamentais.
Uma parte da doutrina usa a expressão "eficácia diagonal" para se referir especificamente às relações em que os particulares não possuem equilíbrio fático/jurídico - relações trabalhistas, consumeristas, etc.
De acordo com o grau de incidência, podem ser destacados três modelos de eficácia horizontal:
- Teoria da Ineficácia Horizontal: nega a possibilidade de produção de efeitos dos direitos fundamentais nas relações entre particulares (teoria menos prestigiada);
- Teoria da Eficácia Horizontal Indireta: reconhece um direito geral de liberdade;
- Teoria da Eficácia Horizontal Direta: incidência dos direitos fundamentais mais ampla, estendida.
Teoria da Ineficácia Horizontal
Também chamada de doutrina do "state action", trata-se de uma teoria com bases no direito estadunidense. Prega o entendimento de que , com exceção da 13ª emenda (proibição da escravidão), os direitos fundamentais impõem limitações apenas aos poderes públicos, não vinculando a conduta dos particulares.
O fundamento da teoria está no próprio texto constitucional dos Estados Unidos (1787). A doutrina parte da premissa de que os direitos fundamentais protegem os indivíduos em face do Estado e, po risso, não devem ser aplicados nas relações particulares.
Teoria da Eficácia Horizontal Indireta
Modelo adotado pela Alemanha e por grande parte da doutrina, reconhece um direito geral de liberdade. Trata-se da possibilidade de os participantes de uma relação privada afastarem as disposições de direitos fundamentais, sem a qual a liberdade contratual estaria comprometida. É portanto, uma linha de pensamento que traz a possibilidade de relativização dos direitos fundamentais nas relações contratuais a favor da "autonomia privada" e da "responsabilidade individual".
Para essa doutrina, os direitos fundamentais não podem ser invocados a partir da Constituição pois não ingressam no cenário privado como direitos subjetivos. A incidência direta dos direitos fundamentais nas relações entre particulares aniquilaria a autonomia da vontade, causando uma desfiguração do direito privado.
Nesse sentido, cabe ao legislador a tarefa de mediar a aplicação dos direitos fundamentais às relações privadas, por meio de regulamentação compatível com os valores constitucionais (eficácia indireta).
Teoria da Eficácia Horizontal Direta
Doutrina defendida a partir de 1950, com números majoritários na Espanha, na Itália e em Portugal. De acordo com a teoria, a incidência dos direitos fundamentais deve ser estendida às relações entre particulares, independentemente de qualquer intermediação legislativa, ainda que não se negue a existência de certas especificidades nesta aplicação (ponderação dos direitos fundamentais com a autonomia da vontade).
Os efeitos inerentes aos direitos fundamentais tornam desnecessárias maiores interpretações para a sua aplicação nas relações entre particulares. Porém, a teoria admite a diferença na forma e na intensidade de aplicação dos direitos fundamentais em relação ao poder público e aos particulares.
As críticas mais contundentes à teoria da eficácia horizontal direta são as seguintes:
- Desfiguração e perda da clareza conceitual do direito privado;
- Ameaça à sobrevivência da autonomia privada;
- Incompatibilidade com os princípios democrático, da separação de poderes e da segurança jurídica.
As críticas também apontam que deve-se preocupar em estabelecer os parâmetros específicos de aplicação desses direitos nas relações particulares, evitando o subjetivismo judicial, o casuísmo e a insegurança jurídica.