Direitos e Interesses
Direitos difusos e coletivos
A disciplina da tutela coletiva subdivide os direitos transindividuais em categorias que foram sistematizadas pelo Código de Defesa do Consumidor no art. 81, são elas: direitos difusos, coletivos em sentido estrito e individuais homogêneos.
Antes de analisar cada uma das espécies, a doutrina estabeleceu que os direitos difusos e coletivos em sentido estrito são essencialmente coletivos, enquanto que os direitos individuais homogêneos são acidentalmente coletivos, ou de transindividualidade artificial.
Isso porque os direitos difusos e coletivos em sentido estrito, como veremos, trazem no seu bojo a ideia de direitos transindividuais pertencentes a coletividade. Já os direitos individuais homogêneos são, em última análise, direitos subjetivos individuais que, quando observada a origem comum, são reunidos e demandados em juízo como forma de tutela coletiva.
Com o estudo de cada categoria essa percepção se tornará mais clara.
CDC
Art. 81. A defesa dos interesses e direitos dos consumidores e das vítimas poderá ser exercida em juízo individualmente, ou a título coletivo.
Parágrafo único. A defesa coletiva será exercida quando se tratar de:
I - interesses ou direitos difusos, assim entendidos, para efeitos deste código, os transindividuais, de natureza indivisível, de que sejam titulares pessoas indeterminadas e ligadas por circunstâncias de fato;
II - interesses ou direitos coletivos, assim entendidos, para efeitos deste código, os transindividuais, de natureza indivisível de que seja titular grupo, categoria ou classe de pessoas ligadas entre si ou com a parte contrária por uma relação jurídica base;
III - interesses ou direitos individuais homogêneos, assim entendidos os decorrentes de origem comum.
Os direitos difusos são aqueles em que não podem ser identificados os determinados os titulares. A indivisibilidade deste direito justifica-se pois os direitos difusos pertencem a todos os titulares simultânea e indistintamente, não podem ser compartilhados, só podem ser considerados como um todo. Quanto à origem não há relação jurídica base. Os titulares estão unidos por uma circunstância fática.
Os direitos coletivos em sentido estrito são aqueles cujos titulares são determináveis em razão de uma relação jurídica base, que é anterior à lesão. A indivisibilidade do direito ocorre, pois, a lesão ou satisfação do direito prejudica ou atende simultaneamente o interesse do todo.
Direitos individuais homogêneos
Os direitos individuais homogêneos são a terceira espécie prevista no art. 81 como direitos coletivos.
Os direitos individuais homogêneos possuem titularidade determinável no momento da liquidação e execução da sentença coletiva. Não importa se há uma relação jurídica anterior ou vínculo entre os titulares entre si. Por fim, a relação que se forma com a parte contrária decorre somente da lesão sofrida.
A categorização dos direitos individuais homogêneos como direitos coletivos tem o condão de oportunizar que os indivíduos que sofreram lesão em seus direitos subjetivos pleiteiem seus direitos de forma coletivamente considerada, tendo em vista que, em certas circunstâncias, a tutela individual não é adequada.
Por exemplo: um fabricante de um gênero alimentício subtrai de cada embalagem deste produto 10g. É uma quantia irrisória para que o particular veicule tutela individual, mas se considerado de forma coletiva, não.
Outro viés para a tutela dos direitos individuais homogêneos é o seguinte: a lesão individual pode até ser requerida individualmente, mas a lesão é de tamanha proporção que o ressarcimento pra os poucos autores que ajuizarem suas ações não faz frente ao prejuízo como um todo. Assim, os legitimados buscam a condenação do sujeito passivo mesmo que os particulares não buscarem o ressarcimento.
Os direitos individuais homogêneos possuem a predominância de questões comuns sobre as individuais. A doutrina então identifica que há um núcleo de homogeneidade e uma margem de heterogeneidade.
O núcleo de homogeneidade é a existência da obrigação comum (an debeatur); a natureza da prestação devida (quid debeatur); e o sujeito passivo (quis debeatur). Já a margem de heterogeneidade é a identidade do sujeito ativo (cui debeatur) e a específica vinculação jurídica.
Os direitos individuais homogêneos são tutelados por um processo trifásico.
Em primeiro lugar há um processo de conhecimento: tutela do macrobem. Neste momento é analisado o núcleo de homogeneidade, quer dizer, a existência da obrigação, a natureza da prestação que se assevera devida e o sujeito passivo da contenda.
A segunda etapa é a liquidação e a execução: tutela do microbem. Nesta fase, os direitos individuais homogêneos são isolados e individualmente considerados. A analise agora é da margem de heterogeneidade, pois se verificará se o sujeito ativo tem o direito pleiteado e se existe relação jurídica entre o particular e o sujeito passivo da ação coletiva.
Por fim, a terceira etapa é chamada de fluid recovery, momento em que novamente se tutela o macrobem. Nesta fase, quando não houver resultado compatível com a gravidade do dano nas liquidações e execuções individuais, os valores serão revertidos para o fundo de defesa dos direitos difusos. O objetivo é garantir a integral reparação do dano.
Para concluir o estudo das características e diferenças entre direitos difusos, coletivos e individuais homogêneos, veja este resumo do tema:
DIFUSOS | COLETIVOS (em sentido estrito) | INDIVIDUAIS HOMOGÊNEOS |
Essencialmente coletivos | Essencialmente coletivos | Acidentalmente coletivos |
Transindividualidade real | Transindividualidade real | Transindividualidade artificial |
Natureza indivisível | Natureza indivisível | Natureza divisível |
Indeterminabilidade absoluta | Indeterminabilidade relativa | Determinabilidade |
Titulares ligados por circunstâncias de fato | Titulares ligados por relação jurídica base | Titulares têm uma origem em comum |
Ex.: direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado. | Ex.: interesses ligados aos membros de um mesmo sindicato ou partido. | Ex.: determinado lote de um produto causou lesão a alguns consumidores. |
Dano moral coletivo
Inicialmente, danos extrapatrimoniais relacionavam-se unicamente com a violação de aspectos da personalidade individual. Contudo houve uma evolução do sistema de responsabilidade e o dano extrapatrimonial passou a ser admitido com relação à direitos pertencentes a sociedade como um todo. O dano moral coletivo surge a partir do momento que o direito reconhece a existência de bens coletivos.
Configura dano moral coletivo a injusta lesão a esfera moral de certa comunidade, violação a determinado círculo de valores coletivos que não se confundem com os valores dos indivíduos que formam a coletividade. A coletividade é passível de ser indenizada pelo abalo moral, independente dos danos individuais considerados.
Não é, portanto, o resultado da lesão à esfera extrapatrimonial de determinada comunidade. Ocorre quando a conduta praticada agride de modo intolerável os valores normativos fundamentais da sociedade em si considerada, a provocar repulsa e indignação na consciência coletiva. Prescinde de comprovação da dor, sofrimento ou abalo psicológico suscetíveis de apreciação na esfera do indivíduo, mas inaplicável aos interesses difusos e coletivos.
Não significa, da mesma forma, a soma de uma série de danos morais individuais. A ocorrência de inúmeros episódios de danos morais individuais não gera necessariamente a constatação de que houve um dano moral coletivo.
Por fim, é importante frisar que não é qualquer atentado que acarretará dano moral coletivo. É necessário que esse ato ilícito seja de razoável significância e desdobre os limites da tolerabilidade.