Conteúdo da Sentença
Introdução
O conteúdo da sentença está previsto no art.381 do CPP:
Art. 381. A sentença conterá:
I - os nomes das partes ou, quando não possível, as indicações necessárias para identificá-las;
II - a exposição sucinta da acusação e da defesa;
III - a indicação dos motivos de fato e de direito em que se fundar a decisão;
IV - a indicação dos artigos de lei aplicados;
V - o dispositivo;
VI - a data e a assinatura do juiz.
A partir desses tópicos, podemos dividir o conteúdo da sentença em requisitos intrínsecos (relatório, a fundamentação e o dispositivo) e requisitos extrínsecos (relacionados à autenticação da decisão, à legalidade formal).
Relatório
O relatório é um resumo da demanda, contendo os principais fatos apontados, as afirmações feitas pela acusação e pela defesa, assim como a identificação das partes. É imprescindível que as partes sejam corretamente identificadas para limitar a coisa julgada, impedindo que seus efeitos ultrapassem as pessoas envolvidas.
Quando não é possível identificar o acusado com o seu verdadeiro nome ou outros qualificativos, o juiz pode inserir na sentença as indicações necessárias para a sua identificação. Em caso de erro material quanto ao nome do acusado, entende-se que o erro não é substancial: a sentença pode se manter válida desde que a identidade física do acusado seja certa.
A falta do relatório, no entendimento majoritário da doutrina, é causa de nulidade absoluta da decisão. Excetuam-se os casos que tramitam nos juizados especiais, sendo permitida a dispensa do relatório (vide art. 81, §3º, Lei 9.099/95).
Fundamentação
A fundamentação é o conjunto de motivos que levam o magistrado a aplicar o direito ao caso concreto, ou seja, trata-se da motivação de fato e de direito. É nesta etapa em que o juiz enfrenta os argumentos trazidos pelas partes, discorrendo sobre como cada circunstância, fato e acontecimento se relaciona com o ordenamento jurídico, além de indicar os dispositivos de lei que devem ser aplicados.
A indicação dos dispositivos de lei é mandatória, mas sua ausência pode ser suprida por meio de referência implícita. Em caso de ausência total de tais referências, a sentença é considerada nula por falta de fundamentação:
CF/88
Art. 93. [...]
IX todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade, podendo a lei limitar a presença, em determinados atos, às próprias partes e a seus advogados, ou somente a estes, em casos nos quais a preservação do direito à intimidade do interessado no sigilo não prejudique o interesse público à informação;
CPP
Art. 564. A nulidade ocorrerá nos seguintes casos:
V - em decorrência de decisão carente de fundamentação.
Existem diversos instrumentos adequados para impugnar uma sentença desprovida de fundamentação, a depender das circunstâncias:
- Apelação: quando há um erro de procedimento intrínseco (error in procedendo), um erro de cunho formal;
- HC: se houver risco à liberdade de locomoção;
- Embargos de declaração: em caso de sentença "citra petita", ou seja, aquela que não analisou todos os argumentos apresentados.
O magistrado pode valorar livremente as provas que são apresentadas como meio de persuasão, mas tem o dever de fundamentar e justificar tal valoração. Assim, não é a lei que define que a prova documental é mais importante que a prova testemunhal: o juiz deve analisar o caso e suas especificidades, levar em consideração o peso de cada prova e fundamentar a sua conclusão.
Para compreender melhor o que é a fundamentação em uma sentença, podemos nos valer do art. 315 do CPP, que elenca algumas diretrizes:
Art. 315. [...]
§ 2º Não se considera fundamentada qualquer decisão judicial, seja ela interlocutória, sentença ou acórdão, que:
I - limitar-se à indicação, à reprodução ou à paráfrase de ato normativo, sem explicar sua relação com a causa ou a questão decidida;
II - empregar conceitos jurídicos indeterminados, sem explicar o motivo concreto de sua incidência no caso;
III - invocar motivos que se prestariam a justificar qualquer outra decisão;
IV - não enfrentar todos os argumentos deduzidos no processo capazes de, em tese, infirmar a conclusão adotada pelo julgador;
V - limitar-se a invocar precedente ou enunciado de súmula, sem identificar seus fundamentos determinantes nem demonstrar que o caso sob julgamento se ajusta àqueles fundamentos;
VI - deixar de seguir enunciado de súmula, jurisprudência ou precedente invocado pela parte, sem demonstrar a existência de distinção no caso em julgamento ou a superação do entendimento.
Fundamentação per relationem
A jurisprudência admite que o magistrado se utilize de referências concretas e transcrições das peças apresentadas pelas partes para legitimar seu raciocínio lógico e embasar sua conclusão. Assim, o juiz pode ratificar determinados argumentos apresentados, mas deve sempre explicar sua relação com as circunstâncias do caso concreto e porque o referido argumento atinge o seu convencimento.
Um acórdão que se limita a ratificar uma sentença ou adotar o parecer ministerial, sem transcrevê-los, é nulo.
Dispositivo
O dispositivo é a parte onde o magistrado insere sua conclusão decorrente da fundamentação (fato e direito), decidindo pela condenação ou absolvição do réu.
As sentenças absolutórias devem conter em seu dispositivo a indicação do fundamento adequado presente no art. 386 do CPP. Já as sentenças condenatórias devem mencionar os artigos de lei que forem usados para condenar o réu.
Diante da ausência de dispositivo em uma sentença é considerado que não houve provimento judicial, ou seja, que o judiciário não concedeu os pedidos de nenhuma das partes (não há sentença).
Requisitos Extrínsecos da Sentença
Como mencionado anteriormente, os requisitos extrínsecos são aqueles relacionados à autenticação da decisão, à legalidade formal. Os elementos de autenticidade da decisão são os seguintes:
- Data e assinatura do juiz (art. 381, VI, CPP);
- Rubrica do juiz em todas as páginas (art. 388, CPP).
Diante da ausência de assinatura do juiz, considera-se a sentença inexistente, já quanto à rubrica, a sua falta configura mera irregularidade.
Nas situações em que a sentença é proferida oralmente em audiência, entende-se que só será válida quando houver sua conferência, revisão e assinatura. Quanto ao registro dos termos da audiência de instrução e julgamento, existe um ponto controverso.
Art. 405. Do ocorrido em audiência será lavrado termo em livro próprio, assinado pelo juiz e pelas partes, contendo breve resumo dos fatos relevantes nela ocorridos.
§1º Sempre que possível, o registro dos depoimentos do investigado, indiciado, ofendido e testemunhas será feito pelos meios ou recursos de gravação magnética, estenotipia, digital ou técnica similar, inclusive audiovisual, destinada a obter maior fidelidade das informações.
§2º No caso de registro por meio audiovisual, será encaminhado às partes cópia do registro original, sem necessidade de transcrição.
O art. 405 permite o registro dos termos da audiência por meios audiovisuais, mas isso já gerou divergência dentro do STJ. Até outubro de 2018, a 5ª e a 6ª turma do STJ tinham fixado o entendimento de que todos os atos praticados em audiência que fossem registrados por meio audiovisual deveriam ser transcritos. Por outro lado, em novembro de 2018 a 3ª seção entendeu que a sentença proferida oralmente e registrada por meio audiovisual é válida, ainda que seu conteúdo não seja transcrito - este é o entendimento consolidado.