Contratação Direta Ilegal

Da Contratação Direta

Art. 337-E. Admitir, possibilitar ou dar causa à contratação direta fora das hipóteses previstas em lei: 

Pena - reclusão, de 4 (quatro) a 8 (oito) anos, e multa.

A Lei de Licitações (tanto a Lei 8.666/1993 quanto a Lei 14.133/2021) apresenta as situações de contratação direta. Não é o escopo exaurir neste momento todas essas hipóteses, mas são situações em que a Administração Pública está autorizada a contratar alguém sem realizar um processo de licitação. 

A contratação direta, em suma, se divide em inexigibilidade e dispensa. No caso de inexigibilidade, a licitação seria impossível, seria inviável, de maneira que não faz sentido abrir uma licitação que não conseguiria se desenvolver. Logo, está prevista em rol exemplificativo. A dispensa ocorre quando a licitação até seria viável, mas a legislação entende que ela seria contrária ao interesse público, pois traria mais prejuízos que benefícios. São situações previstas em rol taxativo.

Portanto, a própria lei enumera hipóteses em que o administrador poderá não realizar a licitação, seja por força de inexigibilidade, seja por força de dispensa, motivando a decisão. O crime estudado ocorre exatamente quando o administrador admite, possibilita ou dá causa a uma contratação direta fora das hipóteses legais, ou seja, quando o administrador contrata sem licitação numa situação não prevista em lei.

A sua pena é de reclusão de 4 a 8 anos. Logo, pela alta penalidade, não caberá transação penal ou suspensão condicional do processo.

Percebe-se que o objetivo é tutelar os interesses da Administração Pública na contratação de terceiros, o que resguarda não somente o patrimônio público, mas também os princípios administrativos, tais como impessoalidade, moralidade e eficiência.

Mudanças na Lei

A Lei 8.666/1993 tinha disposição semelhante, mas falava em dispensa e inexigibilidade fora das hipóteses legais, ao passo que o legislador atual utiliza uma legislação mais ampla, incluindo tudo que envolva qualquer contratação direta fora das hipóteses que a lei admite. A pena subiu (antes era detenção de 3 a 5 anos), logo, ela só se aplica para os crimes cometidos a partir de sua vigência.

A Lei 8.666/1993 também punia quem concorresse para a consumação do delito, tendo benefício da contratação direta ilegal. Atualmente, não há previsão específica, mas é possível aplicar a sistemática geral do Direito Penal, pois todo aquele que concorre à prática do ilícito irá se enquadrar em algum dos núcleos do novo tipo penal, como quando um advogado que atua em uma licitação emite parecer favorável à contratação direta, a fim de favorecer a si mesmo ou a outrem. Antes, ele seria punido por força dessa norma de equiparação, ao passo que atualmente responderá pelo próprio caput, pois possibilitou ou deu causa à contratação direta.

Características do Crime

É um crime próprio, pois o sujeito ativo só pode ser o funcionário público com atribuição de atuar nessa contratação direta ilegal. Aquele que concorrer para a contratação responde pelo crime, como preceitua o art. 29 do Código Penal (a mencionada sistemática geral do Direito Penal brasileiro), além de provavelmente já se enquadrar nas próprias condutas listadas no caput.

As condutas são admitir, possibilitar e dar causa às contratações diretas fora das hipóteses legais. Logo, é norma penal em branco, pois é necessário perquirir quais são as hipóteses de contratação direta que a lei prevê.

Existem algumas hipóteses mais comuns na prática em que a contratação direta ilegal ocorre. Primeiramente, o fracionamento ilegal de despesas cujos valores excedam o limite previsto para a dispensa de licitação. Assim, uma das hipóteses de dispensa de licitação é o baixo valor da contratação (existem alguns valores diferentes a depender do tipo de contratação, conforme previsão na própria lei).

É comum que o administrador venha a dividir a obra ou o serviço em outros menores para se enquadrar neste limite. Por exemplo, ao invés de contratar de uma vez toda a pavimentação da orla da praia do município, o que levaria necessariamente a uma licitação, o prefeito contrata várias pequenas obras, por exemplo de alguns quarteirões, contratando diretamente o beneficiário.

Também é comum que o administrador público forje uma situação de emergência ou calamidade pública, situação em que a contratação poderia se dar de forma direta. Porém, na realidade, aquela emergência não existe, como alegar uma chuva forte que irá chegar e atingir locais da cidade.

Uma terceira situação comum ocorre nas licitações desertas ou fracassadas (quando a licitação ocorre, mas não chega ao seu final, seja por falta de concorrente, seja por falta de habilitação ou por propostas inexequíveis, respectivamente). Neste caso, o administrador finge que houve uma licitação deserta ou fracassada parra realizar a contratação diretamente, seja manipulando para que ninguém compareça (como não divulgando devidamente o edital), seja para que ninguém se habilite (colocando requisitos impossíveis).

O crime é somente doloso (não há crime culposo no art. 337-E, CP), exigindo-se o fim específico de causas prejuízo ao erário, como vinha decidindo o Superior Tribunal de Justiça sob a égide da Lei 8.666/1993. Portanto, o intuito de lesar o erário público é necessário para que o crime esteja configurado. Logo, não se admite a tentativa, por uma impossibilidade lógica.

Quando o crime se consuma? Existia uma controvérsia doutrinária e que não deve deixar de existir com a inclusão do tipo penal no Código Penal. Uma primeira corrente sustenta que se consuma o crime quando a dispensa ou inexigibilidade é formalizada. A segunda corrente defende que o crime somente se consuma quando há a celebração efetiva do contrato administrativo.

Por fim, uma terceira corrente pugna que a consumação ocorre somente com o prejuízo ao erário, haja vista o fim específico que o STJ exige no elemento subjetivo do tipo penal.

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