Extorsão Mediante Sequestro

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Previsão Legal

O crime de extorsão mediante sequestro está previsto no artigo 159 do Código Penal:

Art. 159 - Sequestrar pessoa com o fim de obter, para si ou para outrem, qualquer vantagem, como condição ou preço do resgate:

Pena - reclusão, de oito a quinze anos.

Assim, nesse crime, o sequestro é puramente um meio para a obtenção de condição ou preço de resgate.

São os elementos do tipo a privação da liberdade da vítima e o fim específico de agir visando a obter para si ou para outrem vantagem. Em geral, falamos de condição de preço ou resgate.

Vale ressaltar que, embora a lei não o determine, a jurisprudência e a doutrina majoritária entendem que se aplica, nesse tipo penal, apenas a vantagem econômica, não se aplicando outros tipos de vantagem (como por exemplo, sexual).

É importante observar, conduto, que há posição minoritária (por exemplo, Damásio de Jesus) que entende ser cabível qualquer tipo de vantagem.

Quando pensamos em extorsão mediante sequestro, geralmente imaginamos a vítima sendo levada para um cativeiro. Contudo, não é necessário que haja um efetivo deslocamento da vítima para que o crime se caracterize.

Uma pessoa pode ser vítima desse tipo penal em sua própria residência, desde que o agente a prive de sua liberdade e exija preço ou condição de resgate para que ela possa voltar a exercer seu direito de ir e vir.

Condição de resgate e preço de resgate

O tipo penal fala em condição ou preço do resgate, expressões que podem causar confusão.

Para facilitar o entendimento da diferença entre eles, utilizaremos o entendimento do professor Cleber Masson:

Condição de resgate diz respeito a qualquer tipo de comportamento, por parte do sujeito passive, idôneo a proporcionar uma vantagem econômica ao criminoso. A vítima patrimonial faz ou deixa de fazer algo que possa beneficiar o sequestrador. Exemplos: a assinatura de um cheque, entrega de um documento, elaboração de uma nota promissória, etc. De outro lado, a elementar preço de resgate se relaciona à exigência de um valor em dinheiro ou em qualquer outra utilidade econômica. Neste caso, o ofendido ou seus familiares pagam alguma quantia em troca da liberdade do sequestrado

Dessa forma, enquanto a condição envolve uma ação ou omissão da vítima almejada pelo agente, o preço envolve tão somente o pagamento de uma quantia pela liberdade.

Possibilidade de multiplicidade de sujeito passivo

É bastante comum que, no crime de extorsão mediante sequestro, a vítima seja obrigada a acionar seus familiares para o pagamento do preço de resgate.

Contudo, nada impede que o próprio sequestrado satisfaça a exigência do agente.

Ter em mente essas duas situações é importante para definirmos a possibilidade de multiplicidade de sujeitos passivos no crime de extorsão mediante sequestro, ou seja, a possibilidade de que haja mais de uma vítima para o mesmo crime exercendo papéis diferentes dentro dele.

Tal posição é defendida na doutrina, por exemplo, por Cezar Roberto Bitencourt, e é bem aceita pela jurisprudência. Teríamos, de acordo com este entendimento, na hipótese de uma pessoa ser sequestrada e outra for acionada para pagamento, mais de uma vítima (a que foi sequestrada e aquela de quem se demandou o pagamento de resgate), sendo uma atingida em sua liberdade e outra em seu patrimônio. Diferentes, mas as duas sujeitos passivos de extorsão mediante sequestro.

Na hipótese de a própria vítima efetuar o pagamento, naturalmente, temos um único sujeito passivo.

Consumação e tentativa

O crime de extorsão mediante sequestro é formal, ou seja, não se exige que alcance um resultado material para a sua consumação.  A própria conduta do agente já basta para que fique caracterizado o crime.

Dessa forma, uma vez que a vítima foi privada de sua liberdade com a intenção de obter a condição ou preço do resgate, não importa que este fim tenha sido efetivamente atingido para a consumação do crime ser considerada completa.

Caso ocorra a condição ou o pagamento do preço, estaremos diante de exaurimento do crime, cuja definição já vimos anteriormente.

Isso não quer dizer que a tentativa não é possível. A conduta de privação da liberdade da vítima pode ser interrompida por circunstância alheia à vontade do agente, quando, por exemplo, é abordado no momento em que tenta capturá-la.

Elemento subjetivo do crime

O elemento subjetivo do crime de extorsão mediante sequestro é o dolo. Não existe previsão legal de modalidade culposa para esse tipo penal.

Além disso, é necessário ainda o dolo especial, ou seja, a finalidade específica de obter vantagem mediante condição ou preço de resgate.

Vale ressaltar ainda que tal vantagem pode ser obtida para si ou para outrem, ou seja, é possível que o agente do crime esteja agindo a mando de outra pessoa, que será o destinatário da vantagem indevida. Nessa situação, aquele que priva a vítima de sua liberdade, ainda que não seja aquele que receberá a vantagem, continuará respondendo por extorsão mediante sequestro.

Modalidades qualificadoras

Assim como os outros tipos penais que vimos, na extorsão mediante sequestro também temos modalidades qualificadas.

Vale lembrar que as qualificadoras alteram a pena base a ser aplicada pelo legislador, que passa, a partir desse novo patamar para o cálculo da dosimetria.

As qualificadoras estão previstas nos parágrafos 1º a 4º do artigo 159 do Código Penal. Veremos abaixo cada uma dessas possibilidades:

§ 1º Se o sequestro dura mais de 24 (vinte e quatro) horas, se o sequestrado é menor de 18 (dezoito) ou maior de 60 (sessenta) anos, ou se o crime é cometido por bando ou quadrilha.

Pena - reclusão, de doze a vinte anos

A primeira delas é o sequestro que dura mais de 24 horas. O legislador entendeu que, nessa situação, a reprovação moral do ato criminoso é maior em razão do tempo prolongado, que provoca mais danos à vítima e seus familiares.

Ainda, temos a situação em que o sequestrado é menor de 18 anos ou maior de 60 anos. Vítimas nessas condições têm uma maior vulnerabilidade, justificando-se uma reprimenda maior para a conduta.

É importante destacar que essa circunstância precisa ser de conhecimento do agente, ou seja, ele precisa saber que a vítima tem menos de 18 ou mais de 60 anos. Caso contrário, será possível alegar o erro de tipo, previsto no artigo 20 do CP. Tais circunstâncias serão avaliadas de acordo com cada caso específico, pois pode ser, por exemplo, que o agente alegue verdadeiramente não saber qual a idade da vítima, mas que esteja bem óbvio que se trata de uma criança ou de um ancião.

No erro de tipo, o agente desconhece que está praticando uma das elementares do tipo e, por tal motivo, apenas pode ser punido se o crime for previsto em sua modalidade culposa.

Nessa situação, não se aplicará a qualificadora, mas sim a figura do caput.

Ainda no mesmo parágrafo temos a situação em que o crime é praticado por quadrilha ou bando.

Lembre-se de que a Lei 12.850/2013 alterou o crime até então chamado de quadrilha ou bando, que passou a se chamar associação criminosa, previsto no artigo 288 do Código Penal.

Além disso, a referida lei também alterou o número de participantes necessários para que se caracterize a associação, que passou a ser de 3 ou mais.

A associação criminosa, além da quantidade de pessoas, também exige certa estabilidade ou permanência do vínculo entre elas, bem como a finalidade de praticar um número indeterminado de delitos (ou seja, não existe associação para prática de um único crime, ainda que existam três ou mais envolvidos).

Para que se possa então aplicar a qualificadora, é preciso que fique demonstrada a real existência de associação criminosa, observados todos os requisitos acima.

Modalidades qualificadoras – lesão corporal de natureza grave

Continuando o estudo das qualificadoras do crime de extorsão mediante sequestro, vamos agora para a previsão contida no parágrafo 2° do artigo 159 do Código Penal:

§ 2º - Se do fato resulta lesão corporal de natureza grave:

Pena - reclusão, de dezesseis a vinte e quatro anos.

É importante observar que somente ocorrerá a qualificadora se a vítima do sequestro for a vítima da lesão corporal grave e não qualquer outro envolvido.

Há, contudo, posição minoritária em sentido contrário, representada por Cezar Roberto Bitencourt. O doutrinador entende que a qualificadora se aplica tanto para a vítima da privação da liberdade quanto para outra vítima de extorsão (por exemplo, familiar que levou o preço do resgate até o local combinado).

A qualificadora se aplica tanto no caso das lesões corporais graves, previstas no artigo 129, §2º do Código Penal, quanto nas gravíssimas, previstas no artigo 129, §3º do mesmo código.

É importante também destacar que a qualificadora se aplica para lesões provocadas por dolo ou culpa.

Somente não se aplicará a qualificadora se a lesão for provocada por motivo de força maior ou caso fortuito. Aqui é necessário nos lembrarmos da previsão do artigo 19 do Código Penal, segundo o qual o agente só responde pelo resultado que agrava especialmente a pena se o houver provocado ao menos culposamente.

Modalidades qualificadas – se do crime resulta morte

§ 3º - Se resulta a morte:

Pena - reclusão, de vinte e quatro a trinta anos.

Aqui valem as mesmas observações feitas na lesão corporal.

A qualificadora somente se aplica se a morte for da vítima da privação da liberdade, não se aplicando se a vítima foi outro envolvido no evento.

Caso ocorra a morte de qualquer outro envolvido, o agente responderá por dois crimes, homicídio e extorsão mediante sequestro.

A morte pode ser ainda provocada por dolo ou culpa (negligência ou imprudência).

A qualificadora somente não será aplicada se a morte for provocada por caso fortuito ou força maior, também em obediência ao previsto no artigo 19 do Código Penal.

Delação premiada

§ 4º - Se o crime é cometido em concurso, o concorrente que o denunciar à autoridade, facilitando a libertação do sequestrado, terá sua pena reduzida de um a dois terços.

A delação premiada é uma forma de beneficiar o agente que, tendo participado do crime em concurso com outros agentes, facilita a apuração do crime por meio de denúncia espontânea dos demais envolvidos.

A delação permite a redução da pena de um a dois terços e observa alguns requisitos: o crime deve ter sido praticado em concurso; um dos agentes deve tê-lo denunciado à autoridade e deve ter havido, por conseguinte, a facilitação da liberdade do sequestrado.

Há posicionamento da doutrina no sentido de que a delação prevista no parágrafo 4° do artigo 159 do Código Penal foi revogada tacitamente pela Lei 12.85/2013, que disciplinou a delação premiada impondo outros procedimentos.

Embora exista esse entendimento, ele não está consolidado, havendo ainda julgados reconhecendo a validade da delação prevista no crime de extorsão.

Destaques

Pode ocorrer a existência de mais de uma qualificadora na mesma situação. Por exemplo, a extorsão mediante sequestro pode ser praticada contra menor de 18 anos e com resultado morte.

Nessa situação, a doutrina e jurisprudência apontam que deve prevalecer a qualificadora mais grave, não se somando duas penas qualificadas em hipótese alguma.

Se ambas tiverem a mesma gravidade (na situação do §1º), o juiz pode utilizar a gradação prevista no artigo, lembrando sempre da necessidade de fundamentação para o aumento.

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