A Lógica da Preservação das Empresas
Porque preservar a empresa com resultados ruins?
O capitalismo tem como fundamento a livre concorrência e, com isso, tem-se a regra básica de que as decisões empresariais acertadas são premiadas com o lucro e as erradas penalizadas pelas perdas, até a falência. No entanto, a atividade empresarial não é objeto unicamente dos interesses do empresário, mas também abarca as necessidades e apreensões de toda a sociedade, principalmente dos credores, trabalhadores da empresa e consumidores.
A linha tênue entre a punição do empresário que realizou decisões econômico-financeiras erradas e, ao mesmo tempo, a proteção dos interesses multilaterais sobre a atividade empresarial revelam a grande importância dos institutos da Recuperação Judicial e da Falência.
O instituto da recuperação judicial pode ser entendido como a evolução da concordata e é tratado pela Lei 11.101/2005, com as alterações mais relevantes promovidas pela Lei 14.112/20. É através da recuperação judicial que a lei definiu o procedimento que pretende a superação de crises econômicas-financeiras dos empresários, mantendo a produção da atividade empresarial. Dessa forma, pretende-se manter a função social da empresa e a garantia dos diversos interesses que abrangem ela, como o dos trabalhadores, credores, consumidores e a sociedade em geral.
Cenário de Recuperação Judicial
Como apontado anteriormente, a Recuperação Judicial é um instrumento utilizado em um cenário de crise financeira-econômica de uma empresa , que se encontra com dificuldade ou impossibilidade de cumprir com suas obrigações pecuniárias.
Esse estado de insolvência pode levar, em último caso, à falência, mas tal situação não é positiva para nenhum ator (credores, trabalhadores, consumidores), então a Recuperação é tida como uma "última esperança" de manter a empresa.
É possível notar a importância do princípio da preservação da empresa na própria Lei 11.101/05:
Art. 47. A recuperação judicial tem por objetivo viabilizar a superação da situação de crise econômico-financeira do devedor, a fim de permitir a manutenção da fonte produtora, do emprego dos trabalhadores e dos interesses dos credores, promovendo, assim, a preservação da empresa, sua função social e o estímulo à atividade econômica.
Objetivo: superar a situação de crise econômico-financeira.
Finalidades:
- Manutenção da fonte produtora e dos empregos;
- Atendimento aos interesses dos credores;
- Preservação da empresa e sua função social; e
- Estímulo à atividade econômica.
Pode-se concluir, portanto, que o art. 47 estabelece a diretriz finalística da Recuperação Judicial, devendo ser interpretada em conjunto com as demais normas da legislação. Assim, A Recuperação é aplicável às empresas economicamente viáveis - para as inviáveis a solução apontada é a decretação da falência.
Cenário de Falência
O cenário de falência é a hipótese em que a empresa encontra-se em insolvência e não há a mínima viabilidade de recuperá-la. A lógica de preservação ainda está presente, mas entende-se ser menos prejudicial a falência da empresa do que um longo processo de recuperação.
A falência, então, deve ser entendida como um meio de preservação e proteção dos créditos e da unidade produtora: faz-se a transferência do ativo para garantir a continuação da atividade empresária. Essa é uma visão refletida na legislação, abarcando não só o aspecto processual falimentar, mas também o viés econômico e social.
Lei 11.101/05
Art. 75. A falência, ao promover o afastamento do devedor de suas atividades, visa a:
I - preservar e a otimizar a utilização produtiva dos bens, dos ativos e dos recursos produtivos, inclusive os intangíveis, da empresa;
II - permitir a liquidação célere das empresas inviáveis, com vistas à realocação eficiente de recursos na economia; e
III - fomentar o empreendedorismo, inclusive por meio da viabilização do retorno célere do empreendedor falido à atividade econômica.
Além disso, alguns princípios comuns ao processo civil estão presentes também no procedimento de falência:
§ 1º O processo de falência atenderá aos princípios da celeridade e da economia processual, sem prejuízo do contraditório, da ampla defesa e dos demais princípios previstos na Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015 (Código de Processo Civil).
§ 2º A falência é mecanismo de preservação de benefícios econômicos e sociais decorrentes da atividade empresarial, por meio da liquidação imediata do devedor e da rápida realocação útil de ativos na economia.