Princípio da Moralidade

Moral e Direito

A relação da moral com o direito é abordada por vários ramos da ciência jurídica. De maneira simplificada, há três modelos descritivos da relação entre a moral e o direito.

  1. O Estado e o Direito como instrumentos da moral preexistente. Esse modelo é comum nos Estados Totalitários de caráter religioso, na medida em que o Direito é um fruto das concepções religiosas ou ideológicas dos líderes do Estado.
  2. A moral como expressão da legalidade e do Direito. Nesse modelo, a moral é completamente absorvida pelo Direito, na medida em que só é moral aquilo que o Direito diz que é lícito na sociedade.
  3. A moral e o direito como círculos que se interpenetram. O campo da moral e o campo do direito são diferentes e, por vezes, podem se comunicar.

O terceiro modelo é o mais adequado para a realidade brasileira. Na prática, significa que o direito abarca normas morais (compatíveis com a moral dominante), amorais (independentes ou não se relacionam com a moral dominante) e imorais (contrárias à moral dominante).Como exemplos de normas imorais, podemos citar a autorização de o agente público, em certos casos, decidir o aumento da própria remuneração ou de receber auxílio moradia, mesmo que já tenha casa própria.

Moralidade

A ação administrativa necessita sempre observar o princípio da moralidade. No Direito Administrativo, a moralidade administrativa pode se desdobrar em:

  1. A moralidade como probidade;
  2. A moralidade como razoabilidade; e
  3. A moralidade como cooperação.

Probidade

A probidade significa honestidade no exercício das funções públicas. No Brasil, as ações de improbidade administrativa tendem a ser vulgarizadas, devido à confusão entre a honestidade e as possíveis falhas cometidas pelos agentes públicos.

Entretanto, é importante destacar que a improbidade ou desonestidade não pode ser confundida com irregularidade ou falhas funcionais (erros do agente público no exercício de suas funções). As falhas configuram infração disciplinar e podem gerar responsabilidade civil do Estado. Porém, nem toda falha profissional ou irregularidade será desonestidade.

Os atos que violam o dever de honestidade são descritos pela Lei nº 8.429/1992 (Lei de Improbidade Administrativa, atualizada pela Lei nº 14.230, de 2021). Essa norma contém um rol exemplificativo de ações que violam a probidade administrativa. De modo geral, o ato de improbidade depende de um resultado inaceitável. Ou seja, consistem em ações que:

  1. Dolosamente geram enriquecimento pessoal indevido;
  2. Dolosa ou culposamente causam dano ao Erário, inclusive por mal uso de benefício financeiro ou tributário;
  3. Dolosamente importam em violação de princípio da Administração.

Além das hipóteses previstas na Lei nº 8.429/1992, também existem atos de improbidade em leis especiais, como o Estatuto da Cidade (improbidade urbanística), a Lei Federal de Conflito de Interesses, entre outras.

Razoabilidade ou Proporcionalidade em Sentido Amplo

Esse princípio deriva da moralidade e guia ações discricionárias do Estado, principalmente as de caráter restritivo de direitos. Em termos simples, o Poder Discricionário é aquele que permite à Administração Pública praticar atos com a liberdade de escolha, com base na conveniência e oportunidade.

O termo "Proporcionalidade em Sentido Amplo" é utilizado pelos doutrinadores e juristas alemães como sinônimo de "Razoabilidade". Para ser razoável, uma medida administrativa deve cumulativamente:

  1. Ser adequada (apta a atingir o fim público);
  2. Necessária (mais branda dentre as medidas adequadas disponíveis para o administrador público); e
  3. Proporcional em sentido estrito (ou seja, que seus benefícios superem os malefícios).

Se algum desses requisitos não for observado, a medida administrativa será automaticamente irrazoável, contrária ao princípio da moralidade e inconstitucional.

Cooperação

O princípio da cooperação deve aparecer nas relações externas e interadministrativas da Administração Pública. Nas relações externas, ou seja, nas relações com o cidadão, a Administração Pública deve agir para facilitar o exercício de direitos e auxiliar os cidadãos no cumprimento de seus deveres. Esse mandamento consta no art. 3º, I da Lei de Processo Administrativo Federal:

Art. 3º O administrado tem os seguintes direitos perante a Administração, sem prejuízo de outros que lhe sejam assegurados:

I - ser tratado com respeito pelas autoridades e servidores, que deverão facilitar o exercício de seus direitos e o cumprimento de suas obrigações;

A Administração Pública pode agir de maneira colaborativa para com o cidadão de diversas maneiras, como, por exemplo, por fomento, acesso à informação, prestação de esclarecimentos, facilitação de obtenção de provas em processos administrativos, editar cartilhas e guias, entre outros.

Nas relações interadministrativas também deverá ocorrer a cooperação, na medida em que órgãos públicos trabalhem em conjunto tanto quanto for possível, por exemplo, por mecanismos de cooperação técnica, humana e financeira, por meio de atuação supletiva na insuficiência de outro órgão, por meio de delegação de tarefas etc.

Um exemplo de como essa cooperação ocorre na prática é no que se refere ao licenciamento ambiental (LC 140/2011):

Art. 4º  Os entes federativos podem valer-se, entre outros, dos seguintes instrumentos de cooperação institucional: [...]

II - convênios, acordos de cooperação técnica e outros instrumentos similares com órgãos e entidades do Poder Público, respeitado o art. 241 da Constituição Federal; [...]

V - delegação de atribuições de um ente federativo a outro, respeitados os requisitos previstos nesta Lei Complementar; 

VI - delegação da execução de ações administrativas de um ente federativo a outro, respeitados os requisitos previstos nesta Lei Complementar.

Meios de Controle

O ordenamento jurídico oferece uma série de instrumentos para combater violações à moralidade. A CF/1988 prevê ação popular para atacar atos que ofendam a moralidade administrativa (art. 5º, LXXIII) e também mandado de segurança para atacar abuso de poder (art. 5º, LXIX), uma forma de imoralidade administrativa.

Art. 5º. [...]

LXIX - conceder-se-á mandado de segurança para proteger direito líquido e certo, não amparado por "habeas-corpus" ou "habeas-data", quando o responsável pela ilegalidade ou abuso de poder for autoridade pública ou agente de pessoa jurídica no exercício de atribuições do Poder Público;

LXXIII - qualquer cidadão é parte legítima para propor ação popular que vise a anular ato lesivo ao patrimônio público ou de entidade de que o Estado participe, à moralidade administrativa, ao meio ambiente e ao patrimônio histórico e cultural, ficando o autor, salvo comprovada má-fé, isento de custas judiciais e do ônus da sucumbência;

Violação da moralidade, por exemplo, também pode configurar infração disciplinar, crime de responsabilidade e ato de improbidade. Além disso, a inobservância da moralidade pode ocasionar a anulação de procedimentos, atos, contratos e normas.

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