Princípio da Legalidade

O primeiro princípio do rol do art. 37 da CF que vamos falar é o da Legalidade.

Definição

Resumidamente, Legalidade indica harmonia de um estado, uma ação ou um comportamento com o ordenamento jurídico.

No Estado de Direito a legalidade se expandiu, atingindo não só os particulares, mas qualquer agente público, inclusive os agentes políticos. Ademais, no modelo democrático, a Legalidade serve como um instrumento comunicativo, na medida em que o povo pode transmitir suas vontades, por meio de seus representantes eleitos, aos agentes públicos que formam o Estado. Isso é feito principalmente por meio das leis, feitas pelos representantes eleitos a partir das necessidades e anseios da população.

Na prática, porém, o processo legislativo nem sempre é desenvolvido de acordo com as vontades do povo. Assim, nem sempre o que é colocado nas leis é o desejado pela sociedade, ou seja, a legalidade (o que está na lei) nem sempre é compatível com a legitimidade (compatibilidade da lei com os anseios da população).

Legalidade como Supremacia do Direito

O princípio da Legalidade Administrativa indica a supremacia da lei na medida em que a Administração Pública deve executar suas tarefas à luz do ordenamento jurídico, e não pode, em nenhuma hipótese, atuar contra ele. Isso porque o Estado é criado e sustentado pelo povo, devendo, portanto, agir em benefício do povo. Assim, resumidamente, cabe à Administração observar sempre o que determina o ordenamento construído pelos representantes do povo.

É importante salientar que isso não significa que a Administração só possa fazer o que está literalmente expresso no texto legislativo. Esse tópico será aprofundado mais a frente.

Em sentido amplo, a Legalidade abrange várias camadas de normas jurídicas, ou seja, analisa-se a compatibilidade do comportamento do agente público com:

  • Legalidade estrita: as normativas internas do órgão ou entidade e as leis, ordinárias ou complementares;
  • Constitucionalidade: normas constitucionais (Constituição Federal, Constituições estaduais e leis orgânicas dos Municípios);
  • Convencionalidade: tratados internacionais firmados pelo Brasil;
  • Juridicidade: todas as normas expressas ou implícitas do ordenamento jurídico. O direito não se esgota no que está escrito nos textos legais, como demonstra, por exemplo, o art. 2º, parágrafo único, da Lei de Processo Administrativo Federal (Lei nº 9.784/99):

Art. 2º.  A Administração Pública obedecerá, dentre outros, aos princípios da legalidade, finalidade, motivação, razoabilidade, proporcionalidade, moralidade, ampla defesa, contraditório, segurança jurídica, interesse público e eficiência.

Parágrafo único. Nos processos administrativos serão observados, entre outros, os critérios de:

I - atuação conforme a lei e o Direito;

Legalidade Forte e Fraca

Existem vários padrões de legalidade, os quais variam de acordo com o setor, com o tipo de ato e com a função administrativa exercida. Como citado anteriormente, Legalidade não significa que todo comportamento da Administração deva estar descrito no texto normativo. De acordo com Charles Eisenmann, destacam-se dois padrões de legalidade:

  • Legalidade Fraca: indica uma relação de compatibilidade da conduta com o ordenamento jurídico, ou seja, tudo é permitido, desde que a lei não proíba. Assim, basta a comprovação de que o agente público não fez algo que o ordenamento jurídico proíba.
  • Legalidade Forte: exige a conformidade do comportamento com o texto legal, ou seja, o agente pode fazer apenas aquilo que o Direito expressamente autoriza.

É importante salientar que esses padrões de Legalidade convivem no ordenamento jurídico. Haverá preferência pelo padrão de Legalidade Forte quando a Administração Pública restringir a liberdade dos particulares. Isso porque, de acordo com o art. 5º, inciso II da CF, a restrição da liberdade dos indivíduos (ou seja, forçá-los a fazer ou deixar de fazer algo) pela Administração depende de uma autorização em lei.

Art. 5º. [...]

II - ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei;

A Legalidade Forte, portanto, é uma reserva legal, ou seja, todas as ações restritivas do Estado necessitam de previsão legal anterior.

Contrariamente, as ações benéficas ou prestativas não se enquadram no art. 5º, inciso II, da CF, quer dizer, se enquadram no padrão de Legalidade Fraca.

Derivações da Legalidade

São subprincípios derivados do princípio da Legalidade Administrativa:

  • Subprincípio da tutela ou supervisão que os entes da Administração Direta (secretarias ou Ministérios), exercem sobre a Indireta (autarquias, empresas estatais etc.). Há, portanto, uma relação de vinculação, visto que os entes da Administração Direta zelam para que os entes especializados da Administração Indireta exerçam suas funções adequadamente, respeitem normas orçamentárias, finalidades, entre outros aspectos.
  • Subprincípio da autotutela das entidades públicas, pelo qual a Administração Pública pode anular, revogar, confirmar, convalidar ou revisar seus próprios atos de ofício, independentemente de uma manifestação judicial prévia (Súmulas 346 e 473 do STF).
  • Presunção relativa de legalidade e de veracidade favorável à Administração Pública, ou seja, acredita-se que os atos do Estado são verdadeiros e estão alinhados com a legislação. A partir da presunção, é possível entender a proibição constitucional de recusar fé a documentos públicos (art. 19, II, CF) e o poder de qualquer agente autenticar documentos (art. 22, §3º, Lei de Processo Administrativo).
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