Artigos 197 -201 CC

A prescrição pode ser paralisada por causas que a suspende ou a interrompe. Essas causas variam conforme a capacidade de reiniciar ou não o prazo.

As causas suspensivas não zeram o prazo, mas permitem que ele seja retomado de onde parou. Por exemplo, se a prescrição foi interrompida no oitavo ano, restam dois anos para completar o tempo necessário.

Já as causas interruptivas fazem o prazo voltar ao início, como se nunca tivesse corrido antes. Ou seja, a prescrição, ao ser paralisada, será reiniciada do zero.

Art. 197. Não corre a prescrição:

I - entre os cônjuges, na constância da sociedade conjugal;

II - entre ascendentes e descendentes, durante o poder familiar;

III - entre tutelados ou curatelados e seus tutores ou curadores, durante a tutela ou curatela.

Art. 198. Também não corre a prescrição:

I - contra os incapazes de que trata o art. 3º;

II - contra os ausentes do País em serviço público da União, dos Estados ou dos Municípios;

III - contra os que se acharem servindo nas Forças Armadas, em tempo de guerra.

Os artigos 197 e 198 do código civil tratam dos casos que impedem ou suspendem a prescrição. A diferença entre eles está no momento em que a causa age. Se a causa impede o início do prazo, temos um impedimento. Se o prazo já estiver correndo, a causa será suspensiva.

Ou seja:

  • Impedimento: o prazo sequer começa.
  • Suspensão: o prazo é interrompido, mas continua a contar do ponto em que parou.

A prescrição pode ser paralisada por diferentes causas; dividimos em 3 causas para facilitar a sua compreensão:

  1. Paralisação em razão do estado civil
  2. Paralisação em razão de missão
  3. Paralisação em razão de negócio

Essas causas suspensivas variam conforme a situação do indivíduo ou a natureza da sua obrigação. Vamos analisar cada uma delas de forma detalhada e com exemplos práticos:

Paralisação em razão do estado civil

Em algumas situações, o estado civil de uma pessoa pode justificar a suspensão da prescrição. Isso acontece em relações que envolvem vínculo familiar ou tutelar, onde o princípio da proteção do mais vulnerável prevalece. As situações que geram essa suspensão são as seguintes:

  • Cônjuges: não ocorre a prescrição entre os cônjuges enquanto durar a sociedade conjugal. Isso é válido mesmo para uniões estáveis, como se observa no Art. 197, I. A ideia aqui é que, enquanto casados, as partes estão em um estado de proteção recíproca, o que justifica a suspensão do prazo de prescrição.

  • Ascendentes e descendentes: da mesma forma, entre pais e filhos, a prescrição não corre enquanto existir o poder familiar (Art. 197, II). Por exemplo, se um pai tem uma dívida, o prazo de prescrição só começará a contar quando o filho completar 18 anos, quando sai do poder familiar.

  • Tutela e curatela: nos casos de tutela ou curatela, a prescrição também fica suspensa, visto que o tutor ou curador age em nome do incapaz, protegendo seus direitos durante a vigência da tutela ou curatela (Art. 197, III).

  • Absolutamente incapaz: a prescrição não corre contra os absolutamente incapazes (menores de 16 anos, por exemplo), como previsto no Art. 198, I. Isso visa garantir que a pessoa incapaz de exercer plenamente seus direitos não seja prejudicada por prazos que não poderia controlar.

Paralisação em razão de missão

A prescrição pode ser suspensa quando a pessoa está cumprindo uma missão específica, geralmente de interesse público ou nacional, que a impossibilita de exercer seus direitos de forma normal. As causas são:

  • Serviço público no exterior: se a pessoa está a serviço do Estado em outro país, a prescrição será suspensa, pois sua ausência física e/ou a dificuldade de comunicação pode inviabilizar o exercício de seus direitos.

  • Forças Armadas: de mesma forma, se alguém estiver servindo nas Forças Armadas em tempo de guerra, a prescrição será suspensa, já que esse indivíduo está comprometido com a defesa do país e não pode ser prejudicado por prazos processuais.

Paralisação em razão de negócio

Existem situações em que a prescrição fica suspensa por condições específicas relacionadas ao contrato ou à relação de negócios entre as partes. Exemplos incluem:

  • Não estando vencido o prazo: não temos a capacidade de exigir um determinado comportamento, portanto não há prescrição.

  • Condição suspensiva: se a obrigação está sujeita a uma condição suspensiva, ou seja, o seu cumprimento depende de um evento futuro e incerto (acidental do negócio jurídico), o prazo da prescrição fica suspenso até que essa condição se concretize (Art. 199, I). Esses eventos só se consumam se algo ocorrer, seja uma condição, termo ou encargo.

    • Exemplo de encargo: "Te dou 1000 reais se você doar algo para uma instituição beneficente." Nesse caso, a doação é a condição suspensiva. O cumprimento da obrigação (entregar os 1000 reais) só acontecerá se a doação for realizada.

    • Exemplo de termo: "Quando eu falecer, o carro será seu." O prazo de prescrição ficará suspenso até que o evento futuro e incerto (o falecimento) se concretize.

  • Evicção: quando ocorre a evicção, o prazo de prescrição para o comprador buscar reparação (como indenização do vendedor) fica suspenso até a resolução definitiva da ação de evicção (Art. 199, III). Isso garante que o comprador tenha tempo de buscar seus direitos sem ser prejudicado pela prescrição enquanto a situação é resolvida judicialmente.

A boa-fé é crucial na evicção, pois se refere à crença legítima do comprador de que adquiriu o bem legalmente, sem saber de problemas de titularidade.

Evicção ocorre quando o comprador perde a posse do bem por decisão judicial que reconhece que outra pessoa tem o direito sobre ele, como quando o vendedor não tinha o direito de transferir a propriedade e um terceiro entra com ação para recuperar o bem.

Se o comprador agiu de boa-fé, acreditando que o vendedor tinha o direito de transferir a propriedade, ele pode ter direito à reparação. A boa-fé protege o comprador que não teve culpa na perda do bem.

Exemplo: João comprou um terreno de Maria acreditando que ela era a legítima proprietária. Porém, Pedro entra com uma ação e comprova que o terreno era dele. João, vítima de evicção, tem direito a indenização de Maria, que não tinha a propriedade legítima.

A boa-fé do comprador pode influenciar na decisão judicial, garantindo a reparação por parte do vendedor.

Art. 200. Quando a ação se originar de fato que deva ser apurado no juízo criminal, não correrá a prescrição antes da respectiva sentença definitiva.

Quando ocorre uma ação com origem em fato a ser apurado na esfera criminal, a prescrição não começará a correr até que haja uma sentença definitiva no processo criminal. Esse dispositivo visa assegurar que a apuração de um fato no âmbito criminal seja concluída antes de qualquer prescrição, o que pode ser crucial para a defesa dos direitos da parte envolvida, especialmente em casos que envolvem repercussões cíveis ou administrativas.

Em determinadas situações, uma mesma conduta pode gerar repercussões nas esferas cível, administrativa e criminal. Nesse sentido, vigora o princípio da independência relativa das instâncias, que determina que o que ocorre em uma esfera não afeta diretamente as demais, em regra. Em outras palavras, os processos cíveis e administrativos podem seguir seu curso independentemente da decisão criminal, e vice-versa.

Contudo, essa independência não é absoluta. Existem exceções em que a conclusão de uma instância pode influenciar ou vincular as demais, como, por exemplo, quando há a inexistência do fato ou a inexistência de autoria. Quando essas questões são apuradas na esfera criminal e restam decididas, elas podem ter efeitos nas demais esferas, vinculando as decisões cível e administrativa.

O dispositivo do Art. 200 é claro ao afirmar que a prescrição não ocorrerá antes da sentença definitiva, o que revela um imperativo legal. Isso significa que, em uma ação que envolva um fato a ser apurado criminalmente, o prazo de prescrição só passará a contar após o julgamento final do processo criminal.

Esse entendimento não se confunde com o caso em que uma ação criminal é proposta no decorrer de uma demanda cível já em andamento. Nesse tipo de situação, ajustada a ação criminal, o juiz cível pode suspender o processo até a sentença criminal, mas não está obrigado a fazê-lo. A suspensão é uma faculdade do magistrado cível, que pode decidir suspender o andamento do processo cível até que a decisão criminal seja proferida, ou pode seguir com a análise da demanda cível independentemente.

Exemplo: Imagine que uma pessoa seja processada civelmente por danos materiais, mas a causa do dano envolva um fato criminoso, como uma agressão física. A ação criminal será proposta para apurar a autoria do crime. Nesse caso, ajustada a ação criminal, a prescrição da ação cível ficará suspensa até a sentença definitiva da ação criminal. Caso a sentença criminal declare a inexistência do fato ou a inexistência de autoria, essa decisão pode ter impacto na ação cível, vinculando-a.

E se a ação criminal for ajuizada depois da ação cível?

Se a ação criminal for ajuizada primeiro, a ação cível poderá ser suspensa até a sentença definitiva do processo criminal, de forma a garantir que a apuração do fato criminoso tenha sido resolvida antes da continuação da demanda cível.

Isso visa assegurar que a decisão criminal seja tomada primeiro, e só depois a justiça cível continue. Mas atenção: o juiz não é obrigado a suspender o processo cível; ele pode decidir que a ação cível continue mesmo enquanto a ação criminal está em andamento.

Art. 201. Suspensa a prescrição em favor de um dos credores solidários, só aproveitam os outros se a obrigação for indivisível.

A solidariedade é o fenômeno jurídico em que todos os credores ou devedores se tornam responsáveis pela totalidade da obrigação, ou seja, cada um pode ser cobrado pelo valor total, e o pagamento de qualquer um exime os demais.

Nesse contexto, temos a solidariedade e a indivisibilidade, dois conceitos que se inter-relacionam. A solidariedade não é presumida; ela deve estar expressamente prevista na lei ou em um contrato. Por exemplo, se quatro pessoas devem R$ 1.000,00 de forma solidária, qualquer um dos credores pode exigir o pagamento total (e não de R$ 250,00), e, uma vez pago, a dívida estará quitada para todos, independentemente de quem tenha efetuado o pagamento.

A solidariedade implica que, embora haja múltiplos devedores ou credores, todos são responsáveis pela totalidade da obrigação, não sendo possível dividir a responsabilidade entre eles de forma individualizada, exceto se houver uma divisão expressa no contrato ou na lei.

É um fenômeno excepcional que só pode ser determinado quando a lei ou contrato indicarem expressamente.

A característica mais marcante da solidariedade é a confiança, de forma que um credor pode receber em nome de todos, ou um devedor pode pagar em nome dos demais, sem precisar de caução de ratificação.

Caução de ratificação é uma garantia oferecida para confirmar ou reforçar um compromisso assumido. No caso de quatro credores solidários, qualquer um deles pode exigir a totalidade da obrigação do devedor, independentemente da confiança entre as partes. A solidariedade independe de questões subjetivas, como a confiança, pois decorre da lei ou do contrato.

Solidariedade x indivisibilidade

Existem relações jurídicas que podem ser ao mesmo tempo solidárias e indivisíveis, mas é importante destacar que a indivisibilidade não presume a solidariedade. Isso significa que um vínculo indivisível pode existir sem que haja solidariedade entre os envolvidos.

A indivisibilidade ocorre quando a obrigação não pode ser fracionada, seja por sua própria natureza (indivisibilidade natural) ou por disposição contratual (indivisibilidade artificial). Já a solidariedade exige previsão expressa, ou seja, não pode ser presumida.

O artigo 201 do Código Civil informa que a regra é a suspensão afetar apenas um dos credores solidários, permitindo que os demais continuem cobrando.

O legislador determinou que a suspensão da prescrição é um efeito pessoal, ou seja, ela afeta apenas um credor ou devedor e não se comunica automaticamente aos demais, ainda que haja solidariedade entre eles.

Isso ocorre porque as causas suspensivas, em regra, são personalíssimas, ou seja, aplicam-se somente à pessoa diretamente envolvida.

Exemplo: Imagine que quatro irmãos sejam credores de uma dívida solidária. Se um deles for casado e a prescrição da dívida for suspensa devido à relação conjugal com o devedor, essa suspensão não afetará os outros três irmãos, que ainda poderão cobrar a dívida normalmente. Afinal, eles não têm qualquer vínculo com a relação conjugal do irmão com o devedor.

Exceção: solidariedade e indivisibilidade

Quando a obrigação é ao mesmo tempo solidária e indivisível, a suspensão da prescrição pode ser comunicada aos demais credores ou devedores. Isso ocorre porque:

  • Existe um elemento de confiança entre os envolvidos.
  • A prestação não pode ser dividida devido à sua natureza ou por disposição contratual.

Exemplo de obrigação solidária e indivisível: suponha que quatro pessoas herdem um piano de grande valor e o vendam juntas a um comprador. Se o pagamento não for realizado, elas podem exigir a dívida solidariamente. No entanto, como o piano é indivisível, se a prescrição da cobrança for suspensa para um dos credores por um motivo legalmente reconhecido, essa suspensão poderá atingir os demais, pois todos compartilham o direito sobre um único bem.

Assim, a regra geral é que a suspensão não se comunica, salvo quando a obrigação for simultaneamente solidária e indivisível, pois nesse caso não há como separar os direitos e obrigações entre os envolvidos.