Seja bem-vindo ao curso de Tópicos em Direito Ambiental do Trilhante!
Ao longo das aulas, estudaremos aspectos centrais do Direito Ambiental, começando por compreender por que protegemos o meio ambiente e como essa proteção é justificada juridicamente.
Vamos explorar:
O termo "paradigma" se refere ao modelo ou à base de compreensão a partir da qual se estrutura um campo de conhecimento. No Direito Ambiental, os paradigmas indicam por que e para quem protegemos o meio ambiente.
Duas grandes correntes filosóficas sustentam essa discussão:
O antropocentrismo coloca o ser humano no centro do universo. A natureza, nesse modelo, é protegida em função do homem — isto é, porque ela serve a ele.
Essa visão tem uma abordagem utilitarista: protege-se o meio ambiente para garantir o seu uso pelos seres humanos, regulando a exploração dos recursos naturais para que ela seja sustentável e vantajosa ao homem.
Exemplos no ordenamento jurídico:
Essas normas demonstram que, nesse paradigma, a natureza não é protegida por ela mesma, mas pelo que proporciona ao ser humano.
Com o tempo, a visão antropocêntrica começou a ser criticada. As razões foram:
Esse contexto motivou o surgimento de um olhar mais sensível às necessidades da própria natureza. A virada filosófica e jurídica aconteceu na Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente Humano, realizada em Estocolmo (Suécia), em 1972.
Essa conferência é um marco no Direito Ambiental, pois:
Um exemplo concreto dessa virada é o famoso habeas corpus concedido à gorila Cecília. Mantida isolada em um zoológico, ela apresentava sinais de sofrimento. Com base na ideia de que animais podem ser reconhecidos como sujeitos de direitos, o tribunal concedeu liberdade à gorila, permitindo sua transferência para um santuário.
O biocentrismo propõe um novo paradigma: todos os seres vivos — e não apenas os humanos — ocupam o centro da consideração moral e jurídica. Ou seja, a natureza possui valor intrínseco, independente de seu uso pelo homem.
Nesse modelo:
| Critério | Antropocentrismo | Biocentrismo |
|---|---|---|
Valor da natureza |
Instrumental (serve ao ser humano) |
Intrínseco (possui valor próprio) |
Sujeito de direitos |
Apenas o ser humano |
Todos os seres vivos |
Foco normativo |
Uso sustentável e racional dos recursos |
Preservação da biodiversidade por si só |
Exemplo normativo |
Código das Águas, Código de Mineração |
CF/88 (art. 225), Convenções Internacionais |
Fundamento filosófico |
Utilitarismo e domínio humano |
Igual consideração moral à vida não humana |
Exemplo prático |
Regras para uso industrial da água |
Habeas corpus para a gorila Cecília (valor da vida animal) |
Apesar do avanço de uma consciência biocentrista, o Brasil ainda adota majoritariamente o paradigma antropocentrista. No entanto, há importantes aberturas legais e constitucionais para o biocentrismo.
A CF/88 é o principal marco jurídico da proteção ambiental no Brasil. O artigo 225 traz elementos que incorporam valores biocentristas, como o dever do Poder Público e da coletividade de proteger o meio ambiente para as presentes e futuras gerações.
Além disso, a própria Constituição e convenções internacionais — como a de Estocolmo (1972) — tensionam o modelo vigente, indicando um movimento de transição entre o antropocentrismo e o biocentrismo.
Na próxima aula, aprofundaremos a leitura do art. 225 da Constituição Federal, discutiremos como os paradigmas antropocentrista e biocentrista influenciam a formulação de normas jurídicas no Brasil.