Arquivamento: Introdução

Como já vimos, a autoridade policial não poderá mandar arquivar os autos de inquérito, de acordo com o art. 17 do CPP (“A autoridade policial não poderá mandar arquivar autos de inquérito”). 

O arquivamento também não pode ser determinado de ofício pela autoridade judiciária, pois incompatível com a função de julgador imparcial a que o juiz deve se prestar. Esse entendimento, inclusive, já foi exarado pelo Supremo Tribunal Federal no HC nº 88.589/GO e Inq. 2.913. 

Assim, incumbe exclusivamente ao Ministério Público avaliar se os elementos de informação que constituem os autos do inquérito são suficientes ou não para o oferecimento da denúncia e, em razão disso, nenhum inquérito policial pode ser arquivado sem expressa determinação do Ministério Público nesse sentido. 

Arquivamento: Hipóteses

Embora o Código de Processo Penal silencie a respeito das hipóteses que autorizam o arquivamento do inquérito policial, são aplicadas, analogicamente, as hipóteses de rejeição da peça acusatória e de absolvição sumária, previstas no art. 395 e 397 do CPP, sendo elas, basicamente:

  • Ausência de pressuposto processual ou de condição para o exercício da ação pena (ex: retratação da representação);
  • Falta de justa causa para o exercício da ação penal (ex: ausência de lastro probatório mínimo quanto à prática do delito e à autoria);
  • Quando o fato investigado evidentemente não constituir crime (ex: atipicidade da conduta, com aplicação do princípio da insignificância);
  • Existência de manifesta causa excludente de ilicitude (ex: legítima defesa)
  • Causa extintiva de punibilidade;
  • Cumprimento de acordo de não persecução penal

Atualmente, com o advento do Pacote Anticrime, a Lei 13.964/19 trouxe uma nova redação para o art. 28 do CPP, simplificando o procedimento de arquivamento e consagrando expressamente mais um pilar do sistema processual acusatório.

Antes dessa alteração, o arquivamento do inquérito devia ser requerido à autoridade judiciária que, não concordando, podia remeter os autos ao procurador-geral, para que este: a) oferecesse a denúncia; b) designasse outro órgão do Ministério Público pra oferecê-la; ou c) reiterasse o pedido de arquivamento, ao qual o juiz estaria vinculado. 

Contudo, o artigo 28 do CPP foi alterado para a seguinte redação: 

Art. 28. Ordenado o arquivamento do inquérito policial ou de quaisquer elementos informativos da mesma natureza, o órgão do Ministério Público comunicará à vítima, ao investigado e à autoridade policial e encaminhará os autos para a instância de revisão ministerial para fins de homologação, na forma da lei. 
§ 1º Se a vítima, ou seu representante legal, não concordar com o arquivamento do inquérito policial, poderá, no prazo de 30 (trinta) dias do recebimento da comunicação, submeter a matéria à revisão da instância competente do órgão ministerial, conforme dispuser a respectiva lei orgânica. 
§ 2º Nas ações penais relativas a crimes praticados em detrimento da União, Estados e Municípios, a revisão do arquivamento do inquérito policial poderá ser provocada pela chefia do órgão a quem couber a sua representação judicial. 

Dessa forma, é possível notar que a atuação do Ministério Público no pedido de arquivamento não mais está adstrita à análise do Poder Judiciário, deixando de ser um requerimento para ser uma comunicação. Assim, não há mais que se falar em controle judicial do arquivamento, pois se trata de uma decisão do Ministério Público de não acusar. 

Ocorrendo discordância por parte da vítima ou de seu representante legal com a decisão de arquivamento por parte do MP, a providência a ser tomada também está estabelecida na letra da lei, devendo a vítima (ou o representante), no prazo de 30 dias contados a partir do recebimento da comunicação, submeter a matéria à revisão da instância competente do órgão ministerial. Para o professor Renato Brasileiro, o §1º do art. 28 do CPP funciona como um verdadeiro consectário do direito de petição da vítima, nos exatos termos do art. 5º, XXXIV da CF/88 (Renato Brasileiro, 2020, p. 245). 

Ainda, nos termos do art. 19 do CPP, há determinação para que os autos do inquérito de crime em que não caiba ação penal pública sejam remetidos ao juízo competente, onde aguardarão a iniciativa do ofendido ou de seu representante legal. Na prática, o que ocorre é que, por vezes, os autos são enviados ao Ministério Público para que se averigue a existência de eventual crime de ação penal pública. 

Art. 19.  Nos crimes em que não couber ação pública, os autos do inquérito serão remetidos ao juízo competente, onde aguardarão a iniciativa do ofendido ou de seu representante legal, ou serão entregues ao requerente, se o pedir, mediante traslado.

Observação

O novo procedimento de arquivamento proposto pela Lei 13.964/2019, constante do art. 28 do CPP, que estava com a eficácia suspensa, em razão da medida cautelar concedida pelo Min. Luiz Fux nos autos da ADI nº 6305 (j. 22/01/2020), foi atribuído "interpretação conforme, para assentar que, ao se manifestar pelo arquivamento do inquérito policial ou de quaisquer elementos informativos da mesma natureza, o órgão do Ministério Público submeterá sua manifestação ao juiz competente e comunicará à vítima, ao investigado e à autoridade policial, podendo encaminhar os autos para o Procurador-Geral ou para a instância de revisão ministerial, quando houver, para fins de homologação, na forma da lei, vencido, em parte, o Ministro Alexandre de Moraes, que incluía a revisão automática em outras hipóteses (STF proclama julgamento do instituto do juiz das garantias (migalhas.com.br))". Portanto, a nova redação passa a valer novamente.

Desarquivamento

Como vimos anteriormente, o inquérito policial pode ser desarquivado caso haja notícia de novas provas pela autoridade policial. Contudo, para que esse procedimento não se dê de forma arbitrária, é necessário pensar no que são as “provas novas” a que se refere o art. 18 do CPP (“Art. 18.  Depois de ordenado o arquivamento do inquérito pela autoridade judiciária, por falta de base para a denúncia, a autoridade policial poderá proceder a novas pesquisas, se de outras provas tiver notícia”). 

Como vimos, o entendimento do STJ é de que tais provas precisam ser substancialmente novas (inéditas, desconhecidas até então, porque ocultas ou inexistentes); formalmente novas (já conhecidas e até já utilizadas, mas que ganham nova versão – como exemplo, uma testemunha que havia sido ameaçada em seu primeiro depoimento); e aptas a produzir alguma alteração no panorama probatório dentro do qual foi concebido e acolhido o pedido de arquivamento. 
 

Encontrou um erro?