Noções Gerais e Classificação Doutrinária

A Constituição Federal deu grande importância ao trabalho humano. Pelo texto constitucional, é possível notar que os valores sociais e do trabalho são fundamentos da República. Além disso, o livre exercício do trabalho é um direito fundamental e social. Observe:

Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:

IV - os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa;

[...]

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

XIII - é livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer;

[...]

Art. 6º São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o transporte, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição.

Essas previsões constitucionais fundamentam a elaboração de delitos contra a organização do trabalho.

Competência

De acordo com a CF, a competência para processar e julgar os crimes contra a organização do trabalho é dos juízes federais. Veja:

Art. 109. Aos juízes federais compete processar e julgar:

VI - os crimes contra a organização do trabalho e, nos casos determinados por lei, contra o sistema financeiro e a ordem econômico-financeira;

Em uma interpretação restritiva desse dispositivo, os Tribunais Superiores entenderam que cabe à Justiça Federal julgar crimes que envolvam lesão a direito dos trabalhadores coletivamente considerados. Quando envolver direitos individuais a determinado trabalhador, a competência é da Justiça Estadual.

ATENÇÃO: A Justiça do Trabalho não tem competência criminal. Os crimes serão sempre julgados na Justiça Federal ou Estadual.

Modalidades Especiais de Constrangimento Ilegal

Falando do texto do Código Penal propriamente dito, a doutrina considera os crimes tipificados pelos artigos 197 a 199 como modalidades especiais de constrangimento ilegal. Nos três tipos penais, o verbo núcleo é "CONSTRANGER", que envolve obrigar alguém a fazer ou deixar de fazer algo contra a sua vontade, retirando-lhe a sua autodeterminação.

Vamos analisar cada um desses artigos.

Atentado Contra a Liberdade de Trabalho

O artigo 197 do Código Penal aborda o atentado contra a liberdade de trabalho:

Art. 197 - Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça:

I - a exercer ou não exercer arte, ofício, profissão ou indústria, ou a trabalhar ou não trabalhar durante certo período ou em determinados dias:

Pena - detenção, de um mês a um ano, e multa, além da pena correspondente à violência;

II - a abrir ou fechar o seu estabelecimento de trabalho, ou a participar de parede ou paralisação de atividade econômica:

Pena - detenção, de três meses a um ano, e multa, além da pena correspondente à violência.

Além do verbo núcleo do tipo, já destacado, podemos salientar a forma de realização do tipo mediante violência (força física) ou grave ameaça (violência moral, intimidação).

No inciso I, o legislador procurou abarcar todas as modalidades de atividade laboral, quais sejam:

  • Arte: atividade econômica que requer técnica ou habilidade manual;
  • Ofício: ocupação remunerada e habitual consistente na prestação de serviços manuais;
  • Profissão: atividade exercida habitualmente com o fim de lucro compreendendo comércio e profissões liberais;
  • Indústria: atividade econômica que tem por fim a transformação de produtos para melhor afeiçoá-los as necessidades humanas.

No inciso II, há três pontos que podemos destacar.

O estabelecimento de trabalho pode ser qualquer lugar onde se exerce uma atividade econômica, por exemplo, uma fábrica, uma fazenda, entre outros.

Parede (movimento paredista) se diferencia de greve. A greve é um direito fundamental do trabalhador, previsto na CF. Já a parede é o abandono coletivo de trabalho que ocorre mediante o constrangimento por violência ou grave ameaça, ou seja, as pessoas são constrangidas a participarem do movimento paredista.

A paralisação da atividade envolve a cessação da atividade temporária ou definitiva. Nesse caso, também é necessário que se verifique o constrangimento por violência ou grave ameaça para que haja o crime. A paralisação da atividade, por si só, não se enquadra em nenhum tipo penal.

Classificação Doutrinária

O artigo 197 do CP que acabamos de estudar tem a seguinte classificação doutrinária:

  • Crime comum: pode ser praticado por qualquer pessoa;
  • Crime material: o resultado naturalístico deve ocorrer no mundo fático para que o crime seja consumado;
  • Crime doloso (não há previsão de modalidade culposa);
  • Crime praticado de forma livre: o delito pode ser cometido de qualquer maneira, porque o tipo penal não prevê uma forma específica para a sua execução;
  • Crime unissubjetivo: basta uma única pessoa praticar a conduta para a realização dele;
  • Em regra plurissubsistente: a conduta pode ser fracionada em vários atos e, portanto, há possibilidade de tentativa;
  • Crime permanente: a consumação se prolonga no tempo, enquanto está sendo praticado, está sendo consumado;
  • Concurso material obrigatório: além da pena prevista para a conduta no próprio artigo 197, há a imposição das penas previstas para a violência;
  • Crime de menor potencial ofensivo: conforme o art. 61 da Lei n. 9.099/95, os crimes de menor potencial ofensivo são crimes em que a pena máxima não é superior a dois anos. Por isso, eles serão processados e julgados a partir do rito sumaríssimo previsto nessa lei, e também atraem para si a possibilidade de aplicação de despenalizadoras, como a transação penal e a suspensão condicional do processo.
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