Constituição das S.A.
Sociedade Institucional
Sendo a sociedade anônima uma sociedade institucional, e não contratual, ela se constitui não por meio de um contrato social, mas de um ato institucional ou estatutário (estatuto social). E mais: ausente a contratualidade, a constituição da sociedade anônima deve seguir uma série de requisitos formais previstos na legislação acionária.
Estes requisitos são divididos na LSA em duas fases distintas: primeiramente, devem ser observados os chamados requisitos preliminares; em sequência, devem ser observadas algumas formalidades complementares.
Requisitos Preliminares de Constituição
De acordo com o art. 80 da LSA:
A constituição da companhia depende do cumprimento dos seguintes requisitos preliminares:
I – subscrição, pelo menos por 2 (duas) pessoas, de todas as ações sem que se divide o capital social fixado no estatuto;
II – realização, como entrada, de 10% (dez porcento), no mínimo, do preço de emissão das ações subscritas em dinheiro;
III – depósito, no Banco do Brasil S/A., ou em outro estabelecimento bancário autorizado pela Comissão de Valores Mobiliários, da parte do capital realizado em dinheiro.
No que tange à determinação do inciso I, vê-se, pois, que também se exige a pluralidade de sócios para a constituição de uma sociedade anônima, não sendo permitida a criação de sociedade anônima unipessoal, com única exceção da chamada sociedade subsidiária integral (que tem apenas um sócio), disciplinada pelo art. 251 da LSA.
Importante mencionar, ainda, que, em se tratando de companhia aberta, o número mínimo de acionistas é de três pessoas físicas, uma vez que essas companhias devem possuir, obrigatoriamente, Conselho de Administração, e tal órgão deve ser composto, como veremos, por pelo menos três acionistas pessoas físicas (arts. 138, § 2.º, 140 e 146 da LSA).
Por outro lado, no que se refere à exigência do inciso II, de realização mínima de 10% do preço de emissão das ações subscritas em dinheiro, há casos especiais em que se exige percentual maior, conforme previsão do parágrafo único do dispositivo em análise, segundo o qual “o disposto no número II não se aplica às companhias para as quais a lei exige realização inicial de parte maior do capital social”.
Mencione-se, ainda, quanto às instituições financeiras, o art. 27, caput, da Lei 4.595/1964:
“Art. 27. Na subscrição do capital inicial e na de seus aumentos em moeda corrente, será exigida no ato a realização de, pelo menos 50% (cinquenta por cento) do montante subscrito.”
Quanto ao disposto no inciso III, que alude ao depósito da parcela do capital social integralizado em dinheiro, está expresso no art. 81 da LSA que o depósito referido no inciso III do artigo 80 será realizado pelo fundador, no prazo de 5 (cinco) dias contados do recebimento das quantias, em nome do subscritor e a favor da sociedade em organização, que só poderá levantá-lo após haver adquirido personalidade jurídica.
No Brasil, como se sabe, a personalidade jurídica só se inicia com o registro da sociedade na Junta Comercial. Portanto, somente depois de estar devidamente registrada na Junta é que a companhia poderá levantar o valor depositado inicialmente a título de integralização do capital social por parte dos seus primeiros acionistas.
Se o registro não se concretizar, estabelece o parágrafo único do art. 81 que:
Art. 81 - “...caso a companhia não se constitua dentro de 6 (seis) meses da data do depósito, o banco restituirá as quantias depositadas diretamente aos subscritores”.
Constituição por Subscrição Pública
Nesse passo, existem duas formas de constituição de uma sociedade anônima: por subscrição pública ou particular.
Vimos que, de acordo com o art. 4.º da LSA, as companhias podem ser classificadas em abertas e fechadas, residindo a diferença entres ambas na possibilidade de negociação de seus valores mobiliários no mercado de capitais.
Pois bem, as companhias abertas se constituem por meio de subscrição pública de ações, ou seja, oferecimento destas ações a quaisquer investidores que as queiram subscrever (“comprar”). Nessa modalidade de constituição, exigem-se algumas formalidades específicas, tais como:
- o registro prévio na Comissão de Valores Mobiliários (CVM),
- a colocação das ações à disposição dos investidores interessados; e
- a realização de assembleia inicial de fundação.
De acordo com o art. 82 da LSA, “a constituição de companhia por subscrição pública depende do prévio registro da emissão na Comissão de Valores Mobiliários, e a subscrição somente poderá ser efetuada com a intermediação de instituição financeira”.
Destarte, evidente que o sócio fundador de uma sociedade aberta estará obrigado contratar os serviços de uma empresa especializada para constituí-la. Esse serviço denomina-se underwriting. Essa empresa contratada deverá não simplesmente realizar as ações junto aos investidores, mas também preparar diversos documentos que serão apresentados à CVM.
Então, com base nessa documentação apresentada – estudo, projeto e prospecto – caberá à CVM avaliar o empreendimento. Assim, conforme disposto no § 2.º do mesmo art. 82 da LSA:
Art. 82 - “a Comissão de Valores Mobiliários poderá condicionar o registro a modificações no estatuto ou no prospecto e denegá-lo por inviabilidade ou temeridade do empreendimento, ou inidoneidade dos fundadores”.
Nesse passo, diante da aprovação da documentação pela CVM, esta também deferirá o registro e terá início a segunda etapa desse procedimento constitutivo da sociedade aberta, por meio da colocação das ações junto aos investidores interessados.
Resumidamente: caberá à instituição financeira denominada underwriter captar capital no mercado, angariando investidores para o empreendimento a ser desenvolvido pela sociedade. Sua tarefa é de extrema importância, porque nas companhias abertas todo o capital social deve ser subscrito, sob pena de cancelamento do registro de emissão anteriormente concedido pela CVM.
Os investidores que demonstrarem interesse e que a instituição underwriter reunir para o projeto, começarão a subscrever as ações da sociedade, conforme determinado pelo prospecto (art. 84, inciso I). O art. 85 regula o ato de subscrição:
Art. 85. No ato da subscrição das ações a serem realizadas em dinheiro, o subscritor pagará a entrada e assinará a lista ou o boletim individual autenticados pela instituição autorizada a receber as entradas, qualificando-se pelo nome, nacionalidade, residência, estado civil, profissão e documento de identidade, ou, se pessoa jurídica, pela firma ou denominação, nacionalidade e sede, devendo especificar o número das ações subscritas, a sua espécie e classe, se houver mais de uma, e o total da entrada.
§ 1º A subscrição poderá ser feita, nas condições previstas no prospecto, por carta à instituição, acompanhada das declarações a que se refere este artigo e do pagamento da entrada.
§ 2º Será dispensada a assinatura de lista ou de boletim a que se refere o caput deste artigo na hipótese de oferta pública cuja liquidação ocorra por meio de sistema administrado por entidade administradora de mercados organizados de valores mobiliários.
Após isso, passa-se à terceira etapa do procedimento, com a realização da assembleia de fundação. Com efeito, dispõe o art. 86 da LSA:
“Art. 86 - Encerrada a subscrição e havendo sido subscrito todo o capital social, os fundadores convocarão a assembleia geral que deverá:
I – promover a avaliação dos bens, se for o caso (artigo 8.º);
II – deliberar sobre a constituição da companhia”.
O quórum dessa assembleia de fundação está previsto no art. 87 da LSA: “a assembleia de constituição instalar-se-á, em primeira convocação, com a presença de subscritores que representem, no mínimo, metade do capital social, e, em segunda convocação, com qualquer número”.
Instalada a assembleia, iniciar-se-ão os trabalhos. Para que se aprove a constituição da companhia aberta, basta que não haja oposição de mais da metade do capital social, nos termos do § 3.º do art. 87 da LSA, que assim dispõe:
“Art. 87, §3º: verificando-se que foram observadas as formalidades legais e não havendo oposição de subscritores que representem mais da metade do capital social, o presidente declarará constituída a companhia, procedendo-se, a seguir, à eleição dos administradores e fiscais”.
Por fim, prevê o § 4.º que “a ata da reunião, lavrada em duplicata depois de lida e aprovada pela assembleia, será assinada por todos os subscritores presentes, ou por quantos bastem à validade das deliberações, ou seja, metade deles; um exemplar ficará em poder da companhia e o outro será destinado ao registro do comércio”.
Constituição por Subscrição Particular
No tocante à constituição de sociedades fechadas, o trâmite é bem simples, já que é realizado através de subscrição particular, sem a captação de capital junto a quaisquer investidores no mercado de capitais.
Conforme o art. 88 da LSA, “a constituição da companhia por subscrição particular do capital pode fazer-se por deliberação dos subscritores em assembleia geral ou por escritura pública, considerando-se fundadores todos os subscritores”.
Conclui-se então que podem ser utilizadas duas modalidades de constituição:
(i) a realização de assembleia dos subscritores; ou
(ii) a lavratura de escritura pública em cartório.
Caso a opção adotada seja a realização de assembleia de fundação, ela deverá submeter-se ao mesmo procedimento da assembleia de fundação da companhia aberta, analisado no tópico antecedente. É o que determina o § 1.º do art. 88:
“se a forma escolhida for a de assembleia geral, observar-se-á o disposto nos artigos 86 e 87, devendo ser entregues à assembleia o projeto do estatuto, assinado em duplicata por todos os subscritores do capital, e as listas ou boletins de subscrição de todas as ações”.
Por outro lado, se a opção adotada for a lavratura de escritura pública em cartório, devem ser observadas as formalidades constantes do § 2.º do art. 87:
“preferida a escritura pública, será ela assinada por todos os subscritores, e conterá:
a) a qualificação dos subscritores, nos termos do artigo 85;
b) o estatuto da companhia;
c) a relação das ações tomadas pelos subscritores e a importância das entradas pagas;
d) a transcrição do recibo do depósito referido no número III do artigo 80;
e) a transcrição do laudo de avaliação dos peritos, caso tenha havido subscrição do capital social em bens (artigo 8°);
f) a nomeação dos primeiros administradores e, quando for o caso, dos fiscais”.
Ultimadas as referidas providências, conforme o caso, passa-se à fase denominada pela legislação acionária de formalidades complementares de constituição da companhia.