Impacto dos desastres no Brasil e a incapacidade do cenário jurídico hermético

Para muitas pessoas, desastres ainda são vistos como “eventos imprevisíveis e incontroláveis”, ou mesmo atos de Deus(es) para “castigar” ou “ensinar” uma comunidade. Essa lógica, embora não seja mais aceita do ponto de vista científico, é recorrentemente utilizada por gestores públicos para justificar eventos catastróficos ocorridos em determinados locais. 

Utilizando a desculpa de que não se poderia evitar um deslizamento de terra ou uma forte enchente, tenta-se excluir a responsabilização nesses casos, beneficiando aquele gestor público que não adotou as atividades cabíveis para evitar o desastre. 

Todavia, falar sobre desastres no Brasil é enfrentar uma triste realidade: muitas famílias perdem entes queridos, recursos financeiros, moradias e saúde mental por conta de eventos catastróficos todos os anos. 

Segundo dados do Banco Mundial (2012) os fortes deslizamentos de terra na Região Serrana do Rio de Janeiro deixaram mais de novecentos mortos, trezentas mil pessoas diretamente afetadas e perdas e danos estimados em quatro bilhões setecentos e oitenta milhões de reais. 

Já o rompimento da Barragem de Fundão (Mariana/MG) gerou danos à infraestrutura e prejuízos em duzentos e cinquenta milhões de reais somente na escala microrregional, conforme dados do relatório produzido pela Secretaria de Estado de Desenvolvimento Regional, Política Urbana e Gestão Metropolitana de Minas Gerais (2016).

Por sua vez, o Atlas da Mortalidade e das Perdas Econômicas devido ao Clima (1970-2019), desenvolvido pela Organização Meteorológica Mundial (2021) nos informa entre os anos analisados no relatório, ocorreram 867 desastres, 57.982 mortes e U$100.900.000.000,00 em perdas econômicas apenas na América do Sul, sendo que de todos esses eventos, 59% dos desastres na América do Sul decorreram de inundações.

Observada a magnitude da questão, é importante comentar que os desastres possuem a característica da multiplicidade de danos, ou seja, desastres geram no curto, médio e longo prazo:

  • Danos à qualidade de vida;
  • Danos patrimoniais;
  • Danos ambientais;
  • Danos psicológicos;
  • Danos culturais, dentre outros

Inclusive, danos podem ocorrer mesmo antes do evento catastrófico em si, pois o risco, preocupação e mesmo necessidade de realocação de comunidades com possibilidade significativa de serem atingidas por eventuais desastres já pode ser considerado um dano a essas pessoas. 

Mas como o Direito pode enfrentar esse problema?

De plano, é importante notar a insuficiência de apenas um “ramo” do Direito. Os desastres socioambientais relacionam-se com o Direito Administrativo, Ambiental, Civil, Internacional, Urbanístico, Sociologia do Direito, etc. Ou seja, é importante que exista uma visão sistêmica e integrada na relação entre o Direito e o desastre.

Daí surge o Direito dos Desastres como um ramo jurídico para compreender o caráter multifacetado que caracteriza o desastre e reagir à complexidade do referido evento.

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