Família Homoafetiva
Introdução
São as famílias decorrentes da união de pessoas do mesmo sexo.
Durante muito tempo, as relações homoafetivas ficaram excluídas do ordenamento jurídico devido ao preconceito e o estigma existente na sociedade. Mesmo no período contemporâneo ainda existe uma grande movimentação e esforço em prol dos direitos das pessoas LGBTQIA+.
Dessa forma, mesmo com o princípio da Igualdade e o princípio da Dignidade da Pessoa Humana positivados na Constituição, restava dúvida acerca da possibilidade de formalização das uniões homoafetivas.
Uma "virada de chave" neste aspecto foi o enfrentamento da questão pelo STF, onde o tribunal reconheceu a união homoafetiva como entidade familiar e consagrou o casamento entre pessoas do mesmo sexo.
Julgados importantes
Apelação Cível 70001388982 TJ-RS
Esse julgado inovou no tema, deixando de atribuir a característica de sociedade de fato aos companheiros do mesmo sexo, reconhecendo a relação como entidade familiar. Apesar disso, ainda era necessário ingressar no judiciário para obter reconhecimento.
Vejamos:
UNIÃO HOMOSSEXUAL. RECONHECIMENTO. PARTILHA DO PATRIMÔNIO. MEAÇÃO. PARADIGMA.
Não se permite mais o farisaísmo de desconhecer a existência de uniões entre pessoas do mesmo sexo e a produção de efeitos jurídicos derivados dessas relações homoafetivas. Embora permeadas de preconceitos, são realidades que o Judiciário não pode ignorar, mesmo em sua natural atividade retardatária. Nelas remanescem conseqüências semelhantes às que vigoram nas relações de afeto, buscando-se sempre a aplicação da analogia e dos princípios gerais do direito, relevados sempre os princípios constitucionais da dignidade humana e da igualdade. Desta forma, o patrimônio havido na constância do relacionamento deve ser partilhado como na união estável, paradigma supletivo onde se debruça a melhor hermenêutica. Apelação provida, em parte, por maioria, para assegurar a divisão do acervo entre os parceiros.
TJRS – AC 70001388982, 7ª C. Cív., Rel. Des. José Carlos Teixeira Giorgis, j. 14/03/2001.
ADI 4.277 + ADPF 132 STF
Este julgamento emblemático tornou possível a aplicação de todas as regras previstas para a União Estável no Código Civil às uniões homoafetivas. Segue abaixo um trecho do voto do relator ministro Carlos Ayres Brito:
Tem-se, pois, que a proteção constitucional da família não se deu com o fito de se preservar, por si só, o tradicional modelo biparental, com pai, mãe e filhos. Prova disso é a expressa guarida, no § 4.º do art. 226, das famílias monoparentais, constituídas apenas pelo pai ou pela mãe e pelos descendentes; também não se questiona o reconhecimento, como entidade familiar inteira, dos casais que, por opção ou circunstâncias da vida, não têm filhos. Bem ao contrário, a Constituição de 1988 consagrou a família como instrumento de proteção da dignidade dos seus integrantes e do livre exercício de seus direitos fundamentais, de modo que, independentemente de sua formação – quantitativa ou qualitativa –, serve o instituto como meio de desenvolvimento e garantia da existência livre e autônoma dos seus membros.
Dessa forma, o conceito constitucional pós-1988 de família despiu-se de materialidade e restringiu-se a aspectos meramente instrumentais, merecendo importância tão-somente naquilo que se propõe à proteção e promoção dos direitos fundamentais dos indivíduos. Em síntese, não pode haver compreensão constitucionalmente adequada do conceito de família que aceite o amesquinhamento de direitos fundamentais.
O que, então, caracteriza, do ponto de vista ontológico, uma família? Certamente não são os laços sanguíneos, pois os cônjuges ou companheiros não os têm entre si e, mesmo sem filhos, podem ser uma família; entre pais e filhos adotivos também não os haverá
(...)
O que faz uma família é, sobretudo, o amor – não a mera afeição entre os indivíduos, mas o verdadeiro amor familiar, que estabelece relações de afeto, assistência e suporte recíprocos entre os integrantes do grupo. O que faz uma família é a comunhão, a existência de um projeto coletivo, permanente e duradouro de vida em comum. O que faz uma família é a identidade, a certeza de seus integrantes quanto à existência de um vínculo inquebrantável que os une e que os identifica uns perante os outros e cada um deles perante a sociedade. Presentes esses três requisitos, tem-se uma família, incidindo, com isso, a respectiva proteção constitucional.
BRASIL – STF ADPF Nº132, 2011.
Vale a pena ler também este artigo da advogada Marianna Chaves, publicado pela Associação dos Registradores de Pessoas Naturais do Estado de São Paulo (ARPEN-SP) no site JusBrasil: https://arpen-sp.jusbrasil.com.br/noticias/2978105/artigo-o-julgamento-da-adpf-132-e-da-adi-4277-e-seus-reflexos-na-seara-do-casamento-civil
Conversão da União Estável em Casamento
Permitido o reconhecimento da relação homoafetiva como entidade familiar e definida a aplicação das regras de União Estável, movimentou-se também no judiciário uma questão acerca do casamento.
O STJ em 2011 admitiu a habilitação direta para o casamento a partir de uniões homoafetivas (STJ, REsp 1.183.378-RS, 4ª T., j. 25/10/2011) e o CNJ em 2013 proibiu a recusa de habilitação e celebração de casamento civil ou da conversão de união estável em casamento (Resolução 175/2013).
Homoparentalidade
Trata-se da existência de famílias homoafetivas com filhos. Elas se constituem através de:
- adoção;
- reprodução assistida heteróloga (resolução CFM 2.168/2017);
- gestação compartilhada (casais homoafetivos femininos);
- útero de substituição (casais homoafetivos masculinos).