Interpretação Quanto aos Meios

Interpretação racional

O método de interpretação racional ou lógica baseia-se na investigação da ratio legis (da razão da lei) e exige um pressuposto lógico para a sua utilização. Dessa forma, utiliza argumentos lógicos para descobrir o sentido da lei sem o auxílio de qualquer elemento externo senão a própria norma e sua racionalidade. Busca estudar o pensamento expresso na norma em sua estrutura formal. Este método pode ser analisado em 5 componentes diferentes: mens legis, mens legislatoris, occasio legis, contrario sensu, a fortiori.

Mens legis

Significa espírito da lei, a vontade da lei. É a análise do que foi dito pelo legislador sem considerar suas intenções.

Mens legislatoris

A vontade do legislador, a verdadeira intenção do legislador, independente do que foi escrito.

 Exemplo: Utilização pelo Ministério Público das medidas protetivas de urgência previstas na Lei Maria da Penha para o caso de um idoso que sofria agressões de um rapaz que morava com ele. Como essa lei foi editada para proteger a vulnerabilidade da mulher dentro do âmbito doméstico, a vítima deveria ser uma mulher. Entretanto, o Ministério Público utilizou a lei para proteger um homem. Pela mens legislatoris, intenção do legislador, este criou a lei para proteger o sexo feminino e portanto, não seria possível aplicá-la ao caso. Entretanto, se levar em consideração o espírito da lei, mens legis, é possível utilizar a mesma lei para proteger outras pessoas em caso de vulnerabilidade, como no caso, um idoso.

A contrario sensu

Pode ser visto como o real componente da interpretação lógica. A partir daquilo que não está expressamente permitido ou proibido, é possível definir direitos ou determinar proibições. A conclusão é obtida através da exclusão. Ou seja, tudo que não é proibido é permitido.

 Exemplos: Se o voto é obrigatório para os adultos entre 18 e 70 anos, conclui-se que não é obrigatório para os menores de 18 anos e nem para os maiores de 70 anos. Dessa forma, o voto é facultativo nessas idades, sendo que não é autorizado para os menores de 16 anos.

Além disso, existe o exemplo do crime de peculato, estabelecido no art. 312 do CP: “Apropriar-se o funcionário público de dinheiro, valor ou qualquer outro bem móvel, público ou particular, de que tem a posse em razão do cargo, ou desviá-lo, em proveito próprio ou alheio”. Assim, por a contrario sensu, aquele que não for funcionário público, não responde por este crime.

A fortiori

Parte de uma premissa básica de quem pode o mais pode o menos. Se o direito te deu um direito maior, aquele direito acessório segue o principal, isto é, o direito menor é englobado. Não confunda o sentido do "acessório seguir o principal" com o sentido da mesma fala aplicada ao direito das coisas! 

 Exemplos: Se a lei concede um benefício a um delito mais grave, deve conceder o mesmo benefício a um crime menos grave, portanto, se desapropriação acarreta indenização, interferência ilegal de autoridade em propriedade alheia também implicará. Outro exemplo é, se o crime culposo deve ser punido, tanto mais o crime doloso.

Occasio legis

É a ocasião da lei, isto é, entender o conjunto de circunstâncias que foram determinantes para a formatação daquela norma jurídica é imprescindível. A interpretação será realizada a partir do contexto em que a lei foi criada, quanto aos os fatores conjunturais de ordem política, social e econômica que motivaram a medida legislativa em causa.

 Exemplo: A agressão que a Maria da Penha, e muitas outras mulheres, sofriam no âmbito doméstico fizeram o contexto de criação da Lei Maria da Penha. O Estatuto do Idoso também é uma lei que foi criada num contexto de expressivo número populacional dessa faixa etária e de exigência da garantia de seus direitos específicos.

Interpretação histórica

É interpretada através de precedentes normativos, se necessários, até documentos históricos, em razão da mudança do sentido de expressões presentes na norma com o decorrer do tempo. Esse método nos remete ao convívio antigo, a situação histórica de vida naquele momento, buscando identificar os costumes, o contexto e motivos utilizados para a elaboração de determinada lei. É uma investigação da vontade do legislador no momento passado.

Diferença entre a occasio legis:

A occasio legis é mais pontual, ou seja, de uma ocasião específica que precisava ser regulamentada, como é o caso da Lei Maria da Penha. Já a interpretação histórica não analisa somente a ocasião, mas os costumes, a cultura e os motivos da situação. A História, propriamente dita, fornece-nos a noção dos costumes e tradições naquela época.

Interpretação gramatical (literal ou filológico)

É o primeiro método a ser utilizado quando em contato com  a lei, pois é a sua leitura, propriamente dita. O exame gramatical das palavras utilizadas. Entenda-se: não das regras gramaticais, mas do sentido semântico da escrita da lei. Esse método foi incluído no direito após a Revolução Francesa, quando a criação de leis tomou um patamar mais elevado em que a lei deveria ser protegida, e não interpretada para garantir que não houvesse nenhuma interpretação subjetiva que pudesse levar ao estado absolutista.

 Exemplo: Segundo a Constituição Federal de 1891: “os que aceitarem condecorações ou títulos nobiliárquicos estrangeiros perderão todos os direitos políticos”. Dessa forma, quando Rui Barbosa aceitou uma condecoração estrangeira, seus adversários pediram a perda de seus direitos políticos. Entretanto, o jurista realizou uma interpretação gramatical na sua defesa, alegando que o adjetivo nobiliárquico (relativo à nobreza) também se referia à condecorações e, portanto, não estaria proibido de aceitar uma condecoração simples como a que recebeu.

Interpretação sistemática

É a organização sistemática das leis dentro do ordenamento jurídico de forma coerente e lógica. Através do pressuposto de que não existem incompatibilidades dentro do ordenamento, pois este é um todo unitário, ocorre o diálogo das fontes coerentes ao conjunto. Dessa forma, uma lei de determinada matéria, comunica-se com outra matéria.

 Exemplo: A interpretação do artigo 240 do Código Civil deve ser feita em consideração de que este está presente no Título - Dos Efeitos Jurídicos do Casamento, componente do Livro de Direito da Família, e que está sujeito à todos os princípios da Constituição Federal.

Interpretação teleológica ou sociológica

É uma das mais importantes dentro do judiciário pois busca a finalidade da lei. Procura saber o fim social da lei, ou seja o que o legislador visou a proteger na sua elaboração. Desse modo, a interpretação é feita para que a lei seja aplicada da melhor forma possível dentro da sociedade. Tem como objetivo fazer uma ligação entre lei, causa e finalidade.

 Exemplo: O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) tem como finalidade proteger de forma ampla e o mais abrangente possível a criança e o adolescente. Assim, quando uma lei é omissa ou não possui o alcance necessário para a proteção, é papel do Judiciário realizar uma interpretação teleológica para ampliar a sua aplicação quando necessário. É uma interpretação pro sociedade, que visa a ampliar o alcance da lei para que um direito não seja negado a nenhuma pessoa humana.
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