Conceito

A fiscalização levada a cabo pela Administração Pública trata-se da realização de atos que visem à verificação da ocorrência de fatos tributários ou infrações tributárias, os quais serão vigiados à luz das normas tributárias.

Princípio da Legalidade

Como todo ato da Administração Pública, a fiscalização tributária está sujeita ao princípio da legalidade.

Pelo princípio da legalidade administrativa (artigo 37, caput, CF), toda e qualquer atividade administrativa deve ser autorizada por lei. Ou seja, a Administração Pública só pode fazer aquilo que a lei autoriza.

Porém, aqui, não se trata de legalidade em sentido estrito.

É importante destacar que o Código Tributário Nacional (CTN) utiliza as expressões:

  • lei, quando se refere à lei em sentido estrito (lei complementar ou ordinária, elaborada pelo Poder Legislativo); e
  • legislação tributária, dizendo respeito a qualquer ato normativo (decreto, portaria, instrução normativa, etc.).

Assim, pela redação do artigo 194 do CTN, a fiscalização tributária poderá ser regulamentada por qualquer ato normativo.

Art. 194. A legislação tributária, observado o disposto nesta Lei, regulará, em caráter geral, ou especificamente em função da natureza do tributo de que se tratar, a competência e os poderes das autoridades administrativas em matéria de fiscalização da sua aplicação.

Parágrafo único. A legislação a que se refere este artigo aplica-se às pessoas naturais ou jurídicas, contribuintes ou não, inclusive às que gozem de imunidade tributária ou de isenção de caráter pessoal.

 Todos os contribuintes estão sujeitos à fiscalização, mesmo aqueles que são imunes ou isentos.

Nesses casos de imunidade e isenção, a fiscalização precisa atender aos critérios da proporcionalidade e razoabilidade, o que significa que deve ser exercida de forma proporcional, com equilíbrio e sem excessos, dentro dos padrões normais de aceitabilidade.

Impossibilidade de Limitação nos Atos de Fiscalização

Não pode haver lei ou instrução normativa que preveja impossibilidade de exercício da fiscalização. Ou seja, a autoridade administrativa não pode ter seu direito de fiscalização diminuído ou tolhido, nem mesmo por meio de lei.

CTN

Art. 195. Para os efeitos da legislação tributária, não têm aplicação quaisquer disposições legais excludentes ou limitativas do direito de examinar mercadorias, livros, arquivos, documentos, papéis e efeitos comerciais ou fiscais, dos comerciantes industriais ou produtores, ou da obrigação destes de exibi-los.

Parágrafo único. Os livros obrigatórios de escrituração comercial e fiscal e os comprovantes dos lançamentos neles efetuados serão conservados até que ocorra a prescrição dos créditos tributários decorrentes das operações a que se refiram.

Atenção à seguinte súmula:

Súmula 439 - STF

Estão sujeitos à fiscalização tributária ou previdenciária quaisquer livros comerciais, limitado o exame aos pontos objeto da investigação.

Contudo o poder de fiscalização também não pode ser irrestrito e limitado, devendo incidir somente nos itens essenciais à fiscalização.

Posicionamento do STF quanto às medidas coercitivas de fiscalização

O Supremo Tribunal Federal (STF) entende que, no momento da fiscalização, as medidas coercitivas não podem ser utilizadas com a intenção de cobrar o tributo.

Assim, são inconstitucionais as seguintes hipóteses, cujo entendimento restou sumulado:

Súmula 70

É inadmissível a interdição de estabelecimento como meio coercitivo para cobrança de tributo.

Súmula 323

É inadmissível a apreensão de mercadorias como meio coercitivo para pagamento de tributos.

Súmula 547

Não é lícito à autoridade proibir que o contribuinte em débito adquira estampilhas, despache mercadorias nas alfândegas e exerça suas atividades profissionais.

 Em suma: O contribuinte não pode ser impedido de realizar sua atividade apenas em razão da verificação de débitos tributários.

Meio de Controle da Regularidade das Diligências

Tendo em vista a impossibilidade de restrição no exercício do poder de fiscalização da autoridade administrativa, é necessário que, em seu exercício, seja observada uma série de formalidades como meio de controle da regularidade dessas diligências.

1 – Necessidade de lavratura de termo de fiscalização

A primeira das mencionadas formalidades é a necessidade de lavratura de termo de fiscalização, principalmente aqueles em que conste a data de início e término da fiscalização.

CTN

Art. 196. A autoridade administrativa que proceder ou presidir a quaisquer diligências de fiscalização lavrará os termos necessários para que se documente o início do procedimento, na forma da legislação aplicável, que fixará prazo máximo para a conclusão daquelas.

Parágrafo único. Os termos a que se refere este artigo serão lavrados, sempre que possível, em um dos livros fiscais exibidos; quando lavrados em separado deles se entregará, à pessoa sujeita à fiscalização, cópia autenticada pela autoridade a que se refere este artigo.

2 – Dever de prestar informações ao Fisco

Também deve haver a prestação de informação ao Fisco. Será intimado a prestar informações o rol de pessoas estabelecidas no CTN:

Art. 197. Mediante intimação escrita, são obrigados a prestar à autoridade administrativa todas as informações de que disponham com relação aos bens, negócios ou atividades de terceiros:

I - os tabeliães, escrivães e demais serventuários de ofício;

II - os bancos, casas bancárias, Caixas Econômicas e demais instituições financeiras;

III - as empresas de administração de bens;

IV - os corretores, leiloeiros e despachantes oficiais;

V - os inventariantes;

VI - os síndicos, comissários e liquidatários;

VII - quaisquer outras entidades ou pessoas que a lei designe, em razão de seu cargo, ofício, função, ministério, atividade ou profissão.

Parágrafo único. A obrigação prevista neste artigo não abrange a prestação de informações quanto a fatos sobre os quais o informante esteja legalmente obrigado a observar segredo em razão de cargo, ofício, função, ministério, atividade ou profissão.

3 – A questão do sigilo bancário

Este é um ponto polêmico no estudo da fiscalização tributária.

A Lei Complementar 105/01 dispõe que os agentes fiscais podem solicitar informações e livros aos bancos, mesmo sem autorização judicial:

Art. 6º As autoridades e os agentes fiscais tributários da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios somente poderão examinar documentos, livros e registros de instituições financeiras, inclusive os referentes a contas de depósitos e aplicações financeiras, quando houver processo administrativo instaurado ou procedimento fiscal em curso e tais exames sejam considerados indispensáveis pela autoridade administrativa competente.

A questão acabou sendo pacificada pelo STF no julgamento das ADIs 2.390, 2.386 e 2.859 (24/02/2016), em que o entendimento majoritário dos ministros foi de que a divulgação das informações por parte dos bancos não constitui quebra de sigilo bancário, e sim uma “transferência” de tal sigilo à Administração Pública, que deve guardá-lo.

Por sua vez, o STJ já decidiu em Habeas Corpus (HC 243.034/SP, 26/08/2014 ) que se, pela quebra de sigilo, a autoridade se deparar com crime, os dados obtidos não podem justificar ação penal. Trata-se da vedação às provas obtidas por meios ilícitos. Para que o Ministério Público possa denunciar o agente pelos fatos ilícitos, então, é necessário que se formem outros meios de convicção.

4 – Manutenção do sigilo pelas autoridades fazendárias

As informações fiscais obtidas por meio da quebra de sigilo devem também ser mantidas em sigilo pela autoridade administrativa, ressalvados os casos previstos em lei.

Assim, a autoridade administrativa não pode divulgar informações obtidas por meio da fiscalização, a não ser que haja expressa determinação em contrário.

CTN

Art. 198. Sem prejuízo do disposto na legislação criminal, é vedada a divulgação, por parte da Fazenda Pública ou de seus servidores, de informação obtida em razão do ofício sobre a situação econômica ou financeira do sujeito passivo ou de terceiros e sobre a natureza e o estado de seus negócios ou atividades.

São exceções ao dever de sigilo da Administração Pública, previstas nos parágrafos do mesmo dispositivo:

§1º Excetuam-se do disposto neste artigo, além dos casos previstos no art. 199, os seguintes:

I – requisição de autoridade judiciária no interesse da justiça;

II – solicitações de autoridade administrativa no interesse da Administração Pública, desde que seja comprovada a instauração regular de processo administrativo, no órgão ou na entidade respectiva, com o objetivo de investigar o sujeito passivo a que se refere a informação, por prática de infração administrativa. 

§2º O intercâmbio de informação sigilosa, no âmbito da Administração Pública, será realizado mediante processo regularmente instaurado, e a entrega será feita pessoalmente à autoridade solicitante, mediante recibo, que formalize a transferência e assegure a preservação do sigilo.

 A hipótese do inciso II só pode ocorrer caso tenha havido a instauração de procedimento administrativo para investigação do sujeito titular da informação.

Por fim, o parágrafo 3º enumera as hipóteses em que não se exige sigilo das informações:

§3º Não é vedada a divulgação de informações relativas a: 

I – representações fiscais para fins penais;

II – inscrições na Dívida Ativa da Fazenda Pública;

III – parcelamento ou moratoria.

Ademais, o CTN estabelece a possibilidade de troca de informação entre os entes públicos – União, estados, DF e municípios.

Assim, pode haver uma cooperação entre os entes, em caráter geral ou específico, a fim de garantir maior eficiência na fiscalização tributária.

Esta cooperação deve ser feita por meio de lei (caráter geral) ou por meio de convênios (caráter específico).

CTN

Art. 199. A Fazenda Pública da União e as dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios prestar-se-ão mutuamente assistência para a fiscalização dos tributos respectivos e permuta de informações, na forma estabelecida, em caráter geral ou específico, por lei ou convênio.

Parágrafo único. A Fazenda Pública da União, na forma estabelecida em tratados, acordos ou convênios, poderá permutar informações com Estados estrangeiros no interesse da arrecadação e da fiscalização de tributos.       

Embaraço à Fiscalização

Caso o sujeito tente dificultar ou impedir o exercício da fiscalização pelas autoridades administrativas, é permitido o uso de meio capazes para realizar a fiscalização, inclusive o uso da força policial:

CTN

Art. 200. As autoridades administrativas federais poderão requisitar o auxílio da força pública federal, estadual ou municipal, e reciprocamente, quando vítimas de embaraço ou desacato no exercício de suas funções, ou quando necessário à efetivação dê medida prevista na legislação tributária, ainda que não se configure fato definido em lei como crime ou contravenção.

 Atenção! Tais meios não podem ser exercidos diretamente pelo agente fiscalizador, e sim pelo agente público competente (autoridade policial, por exemplo).

É necessário lembrar que, apesar dos amplos poderes da fiscalização tributária, seu exercício não é irrestrito nem ilimitado, submetendo-se ao controle por parte do contribuinte, do Poder Judiciário e da própria Administração Pública.

Assim, em observância aos princípios da legalidade, proporcionalidade e razoabilidade que regem a Administração Pública, a fiscalização tributária deve dar-se estritamente dentro dos limites previstos nos diplomas legais – que, inclusive, já são bem amplos.

 

Encontrou um erro?