Cooperação Jurídica Internacional - Carta Rogatória
O que é a cooperação jurídica internacional?
Entraremos agora em um tema de extrema relevância no mundo atual: a cooperação jurídica internacional. Esse instituto é o conjunto de mecanismos jurídicos pelos quais um determinado Estado pode solicitar o auxílio de outro para prosseguir com um processo judicial ou executar determinada decisão.
Por exemplo: se um juiz brasileiro precisa ouvir uma testemunha que se encontra na Argentina para que siga com o processo e profira a sua decisão, será necessário que o Estado argentino contribua com o Brasil para atingir o objetivo.
É possível também que o pedido de cooperação jurídica seja feito para que a autoridade do Estado estrangeiro decida sobre determinado litígio que ocorreu em território nacional.
A cooperação jurídica internacional é regrada pelos tratados internacionais dos quais o Brasil faz parte e possui alguns princípios e orientações que estão dispostos no CPC. Vejamos:
Art. 26. A cooperação jurídica internacional será regida por tratado de que o Brasil faz parte e observará:
I - o respeito às garantias do devido processo legal no Estado requerente;
II - a igualdade de tratamento entre nacionais e estrangeiros, residentes ou não no Brasil, em relação ao acesso à justiça e à tramitação dos processos, assegurando-se assistência judiciária aos necessitados;
III - a publicidade processual, exceto nas hipóteses de sigilo previstas na legislação brasileira ou na do Estado requerente;
IV - a existência de autoridade central para recepção e transmissão dos pedidos de cooperação;
V - a espontaneidade na transmissão de informações a autoridades estrangeiras.
Observa-se, portanto, que os pedidos de cooperação internacional estão sujeitos tanto à lei brasileira como à lei do outro Estado de acordo com a situação.
Basicamente a preocupação deste artigo introdutório é garantir o cumprimento dos princípios basilares do Processo como um todo, evitando a violação de preceitos fundamentais e de interesse público brasileiro.
Além das disposições gerais, é importante entender quais são as possíveis diligências a serem realizadas por meio de cooperação internacional:
Art. 27. A cooperação jurídica internacional terá por objeto:
I - citação, intimação e notificação judicial e extrajudicial;
II - colheita de provas e obtenção de informações;
III - homologação e cumprimento de decisão;
IV - concessão de medida judicial de urgência;
V - assistência jurídica internacional;
VI - qualquer outra medida judicial ou extrajudicial não proibida pela lei brasileira.
Temos um rol amplo de medidas a serem tomadas, as quais podem ser efetivadas de maneira direta ou indireta. Trataremos primeiramente das formas de auxílio indireto, como a carta rogatória e a homologação de sentença estrangeira.
Carta Rogatória
A carta rogatória é um mecanismo de cooperação em que uma autoridade judicial solicita o auxílio de uma autoridade estrangeira. Portanto, participam do procedimento de carta rogatória o Estado rogante (envia a carta) e o Estado rogado (recebe a carta).
A rogatória ativa é a situação em que o Estado brasileiro envia o pedido de auxílio, já a rogatória passiva se dá na situação oposta.
O conteúdo da carta rogatória é disciplinado pela norma do Estado rogante, aquele que envia o pedido. Quanto ao seu cumprimento, aplicam-se as normas do Estado rogado.
Previsão Legal
Art. 36. O procedimento da carta rogatória perante o Superior Tribunal de Justiça é de jurisdição contenciosa e deve assegurar às partes as garantias do devido processo legal.
§ 1º A defesa restringir-se-á à discussão quanto ao atendimento dos requisitos para que o pronunciamento judicial estrangeiro produza efeitos no Brasil.
§ 2º Em qualquer hipótese, é vedada a revisão do mérito do pronunciamento judicial estrangeiro pela autoridade judiciária brasileira.
Requisitos
O instrumento jurídico de cooperação deverá conter a indicação da autoridade judicial que efetua o pedido (autoridade de origem) e a autoridade a que se destina (juiz de cumprimento).
Além disso, é necessário dispor sobre o teor da petição, do despacho judicial, das procurações dos advogados e outros documentos relevantes. Indica-se também o objeto do auxílio com referência aos sujeitos que devem ser citados ou intimados.
O encerramento da carta contém a assinatura do juiz e o prazo para o cumprimento, de forma que o processo não se extenda demasiadamente.
Nas hipóteses em que o Brasil é o Estado rogado, ou seja, recebe o pedido, a carta rogatória é recepcionada pelo STJ, que é responsável pelo exame de delibação. Nessa etapa, o tribunal verifica se estão presentes os requisitos legais para que a determinação judicial seja cumprida ou efetivada no Brasil.
Caso o juízo de delibação seja positivo, o STJ procede ao "exequatur", que nada mais é que a ordem de execução da determinada diligência no território brasileiro. A Justiça Federal é a responsável por dar o devido cumprimento à decisão.
O juízo de delibação é negativo quando a carta rogatória tratar de assuntos de competência exclusiva da justiça brasileira. Esses assuntos estão previstos em lei e geralmente tratam de temas de ordem pública, vide os arts. 17 da LINDB e 23 do CPC:
LINDB
Art. 17. As leis, atos e sentenças de outro país, bem como quaisquer declarações de vontade, não terão eficácia no Brasil, quando ofenderem a soberania nacional, a ordem pública e os bons costumes.
CPC
Art. 23. Compete à autoridade judiciária brasileira, com exclusão de qualquer outra:
I - conhecer de ações relativas a imóveis situados no Brasil;
II - em matéria de sucessão hereditária, proceder à confirmação de testamento particular e ao inventário e à partilha de bens situados no Brasil, ainda que o autor da herança seja de nacionalidade estrangeira ou tenha domicílio fora do território nacional;
III - em divórcio, separação judicial ou dissolução de união estável, proceder à partilha de bens situados no Brasil, ainda que o titular seja de nacionalidade estrangeira ou tenha domicílio fora do território nacional.