Artigo 48, parágrafo único
Deliberações
As pessoas jurídicas de direito privado atendem a diferentes finalidades, o que justifica a existência de tipos distintos.
No caso das associações e sociedades, há um grupo de pessoas que se forma antes da constituição do patrimônio. Por exemplo: eu, você e mais 10 pessoas podemos nos juntar para formar uma sociedade empresária, e só a partir desse grupo inicial é que incorporamos um patrimônio à sociedade.
Por outro lado, na fundação, o patrimônio surge antes das pessoas. Imagine que eu sou um multimilionário e deixo 1 bilhão de reais para criar uma fundação com fins educacionais. Esse patrimônio de 1 bilhão será alocado antes que um grupo de pessoas seja contratado para gerir esses recursos, sempre com o objetivo de atingir a finalidade educacional.
Associações e sociedades → pessoas antes do patrimônio;
Fundações → patrimônio é anterior às pessoas.
Como essas finalidades são atingidas? Por meio de deliberações, que podem se dar em assembleias ou reuniões.
As deliberações são resultado da natureza plural das pessoas jurídicas de direito privado, compostas, em sua maioria, por mais de uma pessoa física.
Reuniões x assembleias
As reuniões são mecanismos mais simples, enquanto as assembleias são mais formais, exigindo publicação em jornal, aviso aos interessados e quórum de instalação.
As reuniões são voltadas apenas para sociedades empresárias com até 10 membros, sendo mais informais, dispensando a publicação em jornal e tendo um desenvolvimento mais célere em comparação às assembleias.
Tanto as assembleias quanto as reuniões podem ser realizadas de forma física ou virtual, e até podem ser dispensadas caso todos os seus membros já tenham manifestado suas posições previamente por escrito.
As assembleias virtuais, aliás, ganharam previsão expressa na legislação (lei 14.309/22 que incluiu o art.48-A no Código Civil) devido às mudanças ocasionadas pela pandemia de Covid-19.
Art. 48-A. As pessoas jurídicas de direito privado, sem prejuízo do previsto em legislação especial e em seus atos constitutivos, poderão realizar suas assembleias gerais por meio eletrônico, inclusive para os fins do disposto no art. 59 deste Código, respeitados os direitos previstos de participação e de manifestação.
Reuniões |
Assembleias |
Mais simples e rápida |
Formais |
Não é exigida a publicação |
Publicação em jornal |
Sociedades com até 10 membros |
Aviso aos interessados |
Informal |
Quórum de instalação |
Físicas ou virtuais |
|
Dispensadas se todos os membros tiverem manifestado posições previamente por escrito |
Vícios
O art. 48, parágrafo único, estipula prazo decadencial de três anos para anular deliberações das pessoas jurídicas de direito privado.
Art. 48. [...]
Parágrafo único. Decai em três anos o direito de anular as decisões a que se refere este artigo, quando violarem a lei ou estatuto, ou forem eivadas de erro, dolo, simulação ou fraude.
Perceba que, novamente, trata-se do instituto da decadência, direito potestativo que não depende da manifestação de outras partes.
Seja qual for a modalidade — física, virtual ou dispensada —, é possível identificar vícios nas deliberações, que são semelhantes aos encontrados na Constituição Social.
Esses vícios podem ocorrer à margem da lei, contra a lei ou contra o próprio estatuto, podendo se manifestar na forma de erro, dolo, simulação, fraude ou coação.
Esses vícios afetam diretamente a legislação e, portanto, fazem surgir um prazo decadencial.
As anulações seguem esse prazo porque não é necessária a concordância de ninguém para demonstrar que algo está em desacordo com a lei. O simples fato de uma deliberação contrariar a lei já ignora qualquer vontade particular.
Enquanto as alterações do contrato social devem observar diretamente a lei, as deliberações precisam observar tanto o contrato quanto a lei.
É possível visualizar isso como uma hierarquia:
O contrato precisa apenas observar a lei, mas as deliberações precisam observar tanto a lei quanto o contrato.
Se uma deliberação for contrária à lei ou ao estatuto social, todos aqueles que votaram a favor serão responsabilizados.
Contudo, quem discordar e registrar sua posição em ata, documentando que discorda por considerar a deliberação contrária à lei ou ao estatuto, não será responsabilizado.
Portanto, o prazo decadencial de três anos se aplica tanto à anulação da constituição da sociedade quanto à anulação das deliberações, sejam estas realizadas em assembleias formais ou em reuniões informais.