Infrações Leves
Como infração administrativa, as infrações disciplinares devem ser decididas por uma autoridade no exercício de função administrativa, o que no âmbito da Ordem dos Advogados do Brasil se dá por suas Secionais, Subseções, Turmas dos Tribunais de Ética, Turmas de Ética e Disciplina e os órgãos fracionados ou colegiados plenos do Conselho Federal da OAB, dependendo da infração.
Todo aquele que exerce ilegalmente a profissão de advogado, embora não haja tipo penal para tal, pode ser enquadrado na figura típica do estelionato na forma do art. 171, caput, do Código Penal. Assim, como não está inscrito na OAB, quem exerce a profissão ilegalmente não está sujeito às infrações ética-disciplinares.
Nessa aula, estudaremos as infrações mais leves previstas no EAOAB. Elas possuem como sanção a censura (e a sua possível conversão em advertência). Todas as infrações constantes nos incisos do art. 34 do EAOAB são taxativas, não admitindo interpretações extensivas ou analógicas.
Inciso I - Exercer a profissão, quando impedido de fazê-lo, ou facilitar, por qualquer meio, o seu exercício aos não inscritos, proibidos ou impedidos.
O dispositivo trata de hipóteses do exercício irregular da profissão de advogado. Faz-se essa ressalva já de início, para distingui-lado exercício ilegal da advocacia. A primeira fica no âmbito das infrações disciplinares, enquanto que, a segunda, constitui ilícito penal. Essa primeira distinção também ajuda a perceber o destinatário da norma: os bacharéis regularmente inscritos nos quadros da OAB.
A primeira parte do inciso diz respeito ao advogado impedido. O impedimento é a vedação parcial ao exercício da advocacia – art. 27 da EAOAB. Alcança aqueles já inscritos nos quadros da OAB e que, por alguma razão, passam a ficar impedidos de exercer a profissão em sua plenitude. Os casos de impedimento estão explicados detalhadamente nas aulas sobre “Incompatibilidades e Impedimentos”.
É também hipótese do exercício irregular da profissão permitir o exercício da advocacia a quem não esteja habilitado. Todos os não inscritos na OAB, assim como os total ou parcialmente proibidos de exercer advocacia são alcançados pela norma. A facilitação do exercício profissional a qualquer deles constituiu infração disciplinar.
Inciso II - Manter sociedade profissional fora das normas e preceitos estabelecidos nesta Lei.
De maneira geral, tais sociedades representam modelo societário especial, motivo pelo qual ficam sujeitas a regras também especiais. São prioritariamente regidas pelo Estatuto da OAB, o Regulamento Geral da Advocacia e demais Provimentos editados pelos Conselhos Federal e Seccionais. Assim, apenas subsidiariamente buscarão fundamento no Código Civil. Estando em descordo com essa estrutura de regras, é possível caracterizar-se a infração disciplinar.
Inciso III - Valer-se de agenciador de causas, mediante participação nos honorários a receber.
Sobre o agenciador, Gisela Gondin Ramos esclarece tratar-se daquele que
[...] encaminha negócios para outrem, sendo remunerado com uma percentagem sobre este mesmo negócio.
Ao se valer de agenciador de causas, remunerando-o, o advogado não apenas desprestigia toda a classe, como também prejudica os interesses de seus constituintes, os quais, quando agenciados com intuito meramente lucrativo, não raro tem os seus interesses tratados de forma indolente pelo profissional.
Inciso IV - Angariar ou captar causas, com ou sem a intervenção de terceiros.
Diversamente da regra anterior, a infringência ao inc. IV, do art. 34 do EAOAB, independe da atuação de terceiros para fins de consumação, sendo, inclusive, mais abrangente, pois proíbe ao profissional da advocacia angariar (pedir para si) e/ou captar (atrair, conquistar).
Com efeito, no art. 39 do CED, há permissão para que o advogado divulgue ao público anúncio a respeito de seus serviços profissionais, de forma individual ou coletiva, desde que o faça, contudo, com discrição e moderação, respeitada a finalidade exclusivamente informativa, sendo vedada a divulgação de forma conjunta com outra atividade.
Inciso V - Assinar qualquer escrito destinado a processo judicial ou para fim extrajudicial que não tenha feito, ou em que não tenha colaborado.
A hipótese prevista neste dispositivo tipifica como infração disciplinar os casos de falsa autoria. Ocorrerá sempre que a conduta do advogado, no exercício da profissão, venha a caracterizar falta de honestidade e veracidade no que diz respeito ao vínculo autoral entre a sua pessoa, na qualidade de subscritor, e o conteúdo do escrito. Agindo de tal forma, o advogado viola regras éticas fundamentais da advocacia.
Inciso VI - Advogar contra literal disposição de lei, presumindo-se a boa-fé quando fundamentado na inconstitucionalidade, na injustiça da lei ou em pronunciamento judicial anterior.
Esse dispositivo visa reprimir o advogado que age de forma temerária no ato de postular em Juízo, punindo quem advoga contra literal disposição de lei. É exigida demonstração de má-fé do advogado, até por conta da complexidade do ordenamento jurídico brasileiro e do elevado número de leis editadas no país. Aliás, presume-se a boa-fé do advogado quando sua tese tenha por fundamento a inconstitucionalidade, a injustiça da lei ou a existência de precedente jurisprudencial sólido que justifique sua atuação.
Inciso VII - Violar, sem justa causa, sigilo profissional.
O sigilo profissional é dever que, caso seja descumprido, gera infração profissional do advogado. Comete infração ética quem viola o dever do sigilo profissional, sem justa causa. Exemplos de justa causa são elencados no art. 37 do CED, incluindo a grave ameaça ao direito à vida, à honra, ou quando o advogado se vê afrontado pelo próprio cliente e, em defesa própria, necessita revelar segredo.
Inciso VIII - Estabelecer entendimento com a parte adversa sem autorização do cliente ou ciência do advogado contrário.
O dispositivo visa resguardar o cliente relativamente ao advogado que firma acordo que não convém com seus interesses. Da mesma maneira, impede que o advogado não seja surpreendido com acordo feito pelo advogado da parte contrária e firmado diretamente com seu cliente, sem seu conhecimento.
Inciso IX - Prejudicar, por culpa grave, interesse confiado ao seu patrocínio.
Ressalta-se que não basta haver prejuízo ao cliente, mas que decorra de culpa grave do advogado, ou seja, que esta ultrapasse a tomada das medidas mínimas necessárias para o bom andamento do patrocínio.
Inciso X - Acarretar, conscientemente, por ato próprio, a anulação ou a nulidade do processo em que funcione.
É defesa a prática de quaisquer atos que atentem ao normal andamento processual ou que, premeditados, acarretem nulidade ou anulação do processo. Para essa infração é exigido o ato doloso voltado à prática do ato prejudicial ao andamento processual.
Inciso XI - Abandonar a causa sem justo motivo ou antes de decorridos dez dias da comunicação da renúncia.
Não é aceito como justo motivo ao abandono a inexistência de prejuízo à parte, decorrente de sua absolvição criminal ou a ausência de pagamento dos honorários do advogado, nem a dificuldade de contato com o cliente. Nos termos do art. 6º do Regulamento Geral do Estatuto da Advocacia e da OAB:
Art.6º. O advogado deve notificar o cliente da renúncia ao mandato, preferencialmente mediante carta com aviso de recepção, comunicando, após, o Juízo.
Inciso XII - Recusar-se a prestar, sem justo motivo, assistência jurídica, quando nomeado em virtude de impossibilidade da Defensoria Pública.
O tipo infracional reside na negativa imotivada do advogado à sua nomeação pela OAB para prestar a assistência. O titular do interesse protegido no presente caso é a administração da Justiça. A recusa motivada é direito do advogado.
Inciso XIII - Fazer publicar na imprensa, desnecessária e habitualmente, alegações forenses ou relativas a causas pendentes.
O tipo é a conjugação dos eventos publicar na imprensa, fatos relacionados a causas sob seu patrocínio e pendentes de julgamento, com habitualidade, por ato de vontade do advogado, sobre cujo conteúdo não haja interesse público.
Inciso XIV - Deturpar o teor de dispositivo de lei, de citação doutrinária ou de julgado, bem como de depoimentos, documentos e alegações da parte contrária, para confundir o adversário ou iludir o juiz da causa.
Para a configuração da infração deve restar evidenciado o objetivo do profissional em deturpar o texto para o fim de atrapalhar o adversário ou iludir o julgador, não havendo que se falar no malferimento do dispositivo em decorrência de corrigíveis erros materiais, dos quais não exsurge manipulação fraudulenta.
Nas palavras de Paulo Lôbo, atesta-se que a infração do art. 34, XIV, do EAOAB, restará configurada quando:
[...] cumulativamente: a) o texto é deturpado; b) há intenção de fazê-lo; c) visa a confundir o adversário ou o julgador.
Dessa forma, não é necessária a exigência de comprovação de um resultado, positivo ou negativo, oriundo do comportamento danoso para além da intenção de confundir adversário ou iludir magistrado.
Inciso XV - Fazer, em nome do constituinte, sem autorização escrita deste, imputação a terceiro de fato definido como crime.
A caracterização da infração sob comento dependeria da coexistência de três requisitos, segundo Gisela Gondin Ramos:
- O fato criminoso referido pelo Estatuto tanto pode ser verdadeiro como falso. Não importa. Basta que seja legalmente tipificado como crime;
- O destinatário deve ser um terceiro. Creio que, assim, apenas o próprio advogado e seu cliente estariam excluídos da definição;
- Por último, o ato não pode ter sido previamente autorizado pelo cliente.
Inciso XVI - Deixar de cumprir, no prazo estabelecido, determinação emanada do órgão ou autoridade da Ordem, em matéria da competência desta, depois de regularmente notificado.
Embora esse dispositivo seja autoexplicativo, algumas observações devem ser feitas. Para que exista o descumprimento de ordem emanada de órgão ou autoridade da OAB, necessário que seja legítima e lícita. Ademais, a conduta infracional disciplinar exige que o advogado destinatário da determinação tenha sido regularmente notificado. A notificação regular se dá de forma pessoal ou por publicação oficial.
Inciso XXIX - Praticar, o estagiário, ato excedente de sua habilitação.
O art. 29 do Regulamento Geral especifica quais atos podem ser realizados pelo estagiário isoladamente ou em conjunto com o advogado. Permite-se ao estagiário praticar isoladamente:
- A retirada e devolução de autos em cartório, assinando a respectiva carga;
- A obtenção junto aos escrivães e chefes de secretarias de certidões de peças ou autos de processos em curso ou findos;
- Assinar petições de juntada de documentos a processos judiciais ou administrativos.
De resto, todos os atos inerentes à atividade da advocacia (art. 1º do EAOAB) poderão ser subscritos pelo estagiário, desde que em conjunto com o advogado e sob a responsabilidade expressa deste.