Extinção da Punibilidade por Anistia, Graça ou Indulto

O inciso II do art. 107 do Código Penal prevê as hipóteses de exclusão de punibilidade por anistia, graça ou indulto, que são manifestações de indulgência soberana.

Anistia

A Anistia se dá por ato do Congresso Nacional e tem por objeto, preponderantemente, crimes políticos cometidos por motivos de utilidade e interesse público. Assim dispõe a Constituição Federal:

Art. 21. Compete à União:

XVII - conceder anistia

Art. 48. Cabe ao Congresso Nacional, com a sanção do Presidente da República, não exigida esta para o especificado nos arts. 49, 51 e 52, dispor sobre todas as matérias de competência da União, especialmente sobre:

VIII - concessão de anistia

Assim, a Anistia tem caráter objetivo, visto que se dirige a determinadas condutas especificamente descritas na lei que a conceder. Nestes casos, a anistia tem o efeito de extinguir todos os efeitos penais (anotação de antecedentes, pena, entre outros) apesar de se manterem os efeitos extrapenais da conduta – como vimos, são as decorrências civis do fato.

Vemos, com isso, outro aspecto importante da anistia: seu caráter formal, dado que é concedida por lei.

Como já vimos, também, a anistia é uma das exceções aos efeitos da extinção da punibilidade concretizada após a condenação, sendo que a lei que a concede tem efeitos retroativos. Deste modo, extinguem-se os efeitos penais desde seu primórdio, ainda que já se tenha condenação do agente. Nesses casos em que a anistia é concedida quando já havia tido condenação penal, tem-se o que classificamos como anistia imprópria. Por sua vez, tem-se a anistia própria, verificada quando é concedida antes de se chegar à sentença, no processo penal, caso em que este será extinto também com fundamento no art. 397, IV do Código de Processo Penal. No caso da anistia imprópria, uma vez que já se tem a condenação e se está em cumprimento de pena, o Juiz da execução penal poderá declarar a extinção da punibilidade de ofício ou a requerimento, nos termos do art. 187 da Lei de Execução Penal:

Art. 187. Concedida a anistia, o Juiz, de ofício, a requerimento do interessado ou do Ministério Público, por proposta da autoridade administrativa ou do Conselho Penitenciário, declarará extinta a punibilidade.

O Congresso Nacional tem liberdade e competência para definir os termos da anistia, concedendo-a de forma geral, sem impor limitações quanto aos agentes ou aos fatos, ou de forma parcial, excluindo determinados indivíduos ou circunstâncias da conduta.

Os agentes beneficiados pela anistia não precisam concordar com sua concessão, mas podem recusá-la quando não concordarem com eventuais restrições impostas pela lei que conceder a anistia.

Ainda que o Congresso Nacional tenha liberdade e competência para conceder a anistia também para outros crimes comuns, inclusive podendo restringir aspectos de sua concessão, há restrições legais para o exercício desta competência: não se pode conceder anistia a crimes hediondos e equiparados a hediondos, como determina o art. 5º, XLIII da Constituição Federal:

XLIII - a lei considerará crimes inafiançáveis e insuscetíveis de graça ou anistia a prática da tortura, o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, o terrorismo e os definidos como crimes hediondos, por eles respondendo os mandantes, os executores e os que, podendo evitá-los, se omitirem

Vale lembrar que os crimes hediondos são os descritos na Lei nº 8.072/90, sendo que os equiparados a hediondos são aqueles assim determinados em sua legislação específica, como é o caso dos crimes tipificados pela Lei Antiterrorismo (Lei nº 13.260/2016), todos equiparados a crimes hediondos.

Graça e Indulto

São atos privativos do Presidente da República, como prevê a Constituição Federal:

Art. 84. Compete privativamente ao Presidente da República:

XII - conceder indulto e comutar penas, com audiência, se necessário, dos órgãos instituídos em lei;

Parágrafo único. O Presidente da República poderá delegar as atribuições mencionadas nos incisos VI, XII e XXV, primeira parte, aos Ministros de Estado, ao Procurador-Geral da República ou ao Advogado-Geral da União, que observarão os limites traçados nas respectivas delegações.

Veja que, dentre as atribuições privativas do Presidente, a concessão de graça e de indulto são atos elencados como passíveis de serem delegados aos Ministros de Estado, ao Procurador-Geral da República, ou ao Advogado da União, de acordo com o parágrafo único do art. 84 da Constituição Federal.

Aqui também se verificam as limitações à concessão da graça e do indulto, que não podem alcançar crimes hediondos ou equiparados, por força do art. 5º, XLIII da Constituição Federal.

Neste caso, contudo, a forma de sua concessão é diversa da verificada na anistia: a graça e o indulto, sendo atos privativos do Presidente da República, dão-se por decreto, que determina os efeitos da extinção da punibilidade.

Também diferentemente do que se verifica na anistia, a graça e o indulto pressupõem o trânsito em julgado da sentença condenatória, e não retroagem para extinguir os efeitos penais da condenação, como o registro de antecedentes. Assim, não necessariamente serão extintos todos os efeitos penais da conduta, mas apenas aqueles determinados no decreto que concede a extinção da punibilidade, mais atinentes à pena em si.

Vistos estes aspectos gerais, não podemos confundir a graça com o indulto. Vejamos os principais pontos de distinção entre estas duas causas de extinção da punibilidade:

Indulto

Tem caráter coletivo, ou seja, dirige-se a um determinado grupo de indivíduos; é referente a fatos e circunstâncias específicos, e é concedido de maneira espontânea pela Presidência, sem a necessidade de prévio requerimento.

Pode ser pleno, quando extingue completamente a punibilidade (eliminando a pena determinada na condenação), ou parcial, quando apenas diminui a pena.

Assim como se dá na anistia, não é necessária a concordância do agente beneficiado, que, contudo, pode recusar o indulto se este for condicionado a determinadas restrições com as quais não concorda.

Tradicionalmente, a Presidência concede indulto por ocasião do Natal ou Ano Novo a presos de bom comportamento condenados a pequenas penas. Veja aqui, como exemplo, o indulto natalino concedido em 2017 pelo Decreto nº 9.246/2017.

A Lei de Execuções Penais disciplina aspectos formais e práticos para a declaração da extinção da punibilidade, quando concedido o indulto:

Art. 192. Concedido o indulto e anexada aos autos cópia do decreto, o Juiz declarará extinta a pena ou ajustará a execução aos termos do decreto, no caso de comutação.

Art. 193. Se o sentenciado for beneficiado por indulto coletivo, o Juiz, de ofício, a requerimento do interessado, do Ministério Público, ou por iniciativa do Conselho Penitenciário ou da autoridade administrativa, providenciará de acordo com o disposto no artigo anterior.

Graça

A graça tem caráter individual, sendo concedida pessoalmente e apenas mediante solicitação formal do condenado, do Ministério Público, do Conselho Penitenciário ou da autoridade administrativa, cabendo ao Presidente da República avaliar os requisitos de oportunidade e conveniência para sua concessão.

Por este aspecto pessoal, a Lei de Execuções Penais disciplina a concessão da graça, tratando-a por indulto individual:

Art. 188. O indulto individual poderá ser provocado por petição do condenado, por iniciativa do Ministério Público, do Conselho Penitenciário, ou da autoridade administrativa.

Art. 189. A petição do indulto, acompanhada dos documentos que a instruírem, será entregue ao Conselho Penitenciário, para a elaboração de parecer e posterior encaminhamento ao Ministério da Justiça.

Art. 190. O Conselho Penitenciário, à vista dos autos do processo e do prontuário, promoverá as diligências que entender necessárias e fará, em relatório, a narração do ilícito penal e dos fundamentos da sentença condenatória, a exposição dos antecedentes do condenado e do procedimento deste depois da prisão, emitindo seu parecer sobre o mérito do pedido e esclarecendo qualquer formalidade ou circunstâncias omitidas na petição.

Art. 191. Processada no Ministério da Justiça com documentos e o relatório do Conselho Penitenciário, a petição será submetida a despacho do Presidente da República, a quem serão presentes os autos do processo ou a certidão de qualquer de suas peças, se ele o determinar.

Fique de olho

Apesar de terem efeitos exclusivamente sobre a pena, já que não retroagem para extinguir os efeitos da condenação, a graça e o indulto não se confundem com benefícios de saída temporária ou de permissão de saída. Estes são benefícios, direitos decorrentes da própria execução penal, e não extinguem a punibilidade.

A saída temporária, disciplinada nos arts. 122 a 125 da Lei de Execução Penal, aplica-se aos presos em regime semiaberto, que podem ser autorizados pelo juízo da Execução a saídas para visita à família, frequência a cursos ou participação em atividades que concorram para o retorno ao convívio social, como o exercício de um trabalho.

Por sua vez, a permissão de saída se dá aos presos em regime fechado ou semiaberto (ou mesmo aos presos provisórios) em caso de falecimento ou doença grave de cônjuge, ascendente, descendente ou irmão, ou para tratamento médico. Nesses casos, a permissão é concedida pelo diretor do estabelecimento e a saída se dá mediante escolta, como disciplinam os arts. 120 e 121 da Lei de Execução Penal.

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