Art. 331, CP. Desacatar funcionário público no exercício da função ou em razão dela:

Pena - detenção, de seis meses a dois anos, ou multa.

A conduta consiste em desacatar o funcionário no exercício da função ou em razão dela. É importante perceber a conjunção “ou”. Portanto, há desacato quando o particular ofende o guarda de trânsito que pede seu documento. Mais uma vez, busca-se proteger o respeito e o prestígio da Administração Pública, protegendo quem exerce a sua função de forma legítima. É um crime comum, que pode ser praticado por qualquer pessoa.

O funcionário público pode ser autor do desacato? Há divergência doutrinária. A primeira corrente sustenta que o funcionário público  jamais será autor do desacato. A segunda corrente defende que é possível, mas somente se isso ocorrer quando o delito for cometido contra seu superior hierárquico. Por fim, a posição do STJ é a de que o funcionário público pode ser autor do desacato, independentemente da função que exerça.

O advogado pode cometer desacato? Sim, apesar de o Estatuto da OAB prever que advogado não comete calúnia, difamação e desacato no exercício das suas funções, o STF considerou inconstitucional este último preceito.

O que significa desacatar, o núcleo do tipo? É menosprezar, humilhar, desprestigiar por meio de palavras, gestos ou escritas. Ainda, a ofensa deve ocorrer na presença da vítima. Não existe, por exemplo, desacato por telefone, imprensa ou escrita à distância. Portanto, o desacato pode ocorrer por violência, como lesão corporal e vias de fato, por gestos ou expressões que impliquem em calúnia, injúria ou difamação, humilhando e desprestigiando o funcionário público.

Qual a diferença do desacato para a resistência? Ambos admitem o emprego de violência ou grave ameaça (é uma elementar na resistência), mas o interesse é diverso. O desacato visa apenas a humilhação, ao passo que resistência intui a oposição ao ato praticado pelo funcionário público.

Na ADPF 496/DF, de 2020, relatada pelo Min. Luís Roberto Barroso, houve decisão de que o desacato foi recepcionado pela Constituição Federal de 1988. Isso porque havia quem entendesse pela sua incompatibilidade com a ordem democrática, pois violaria o direito de crítica do cidadão. A Corte Interamericana de Direitos Humanos já entendeu este delito como contrário à Convenção Americana de Direitos Humanos (o Pacto de San José da Costa Rica, que tem status supralegal). O STF entendeu pela recepção do delito com base em alguns fundamentos:

  • Primeiramente, a liberdade de expressão, assim como os demais direitos fundamentais, não é absoluta, mas deve ser sopesada diante dos demais direitos envolvidos no caso concreto;
  • A diversidade de regime jurídico entre particulares e agentes públicos é uma “via de mão dupla”, apresentando, naturalmente, consequências diversas quando autor e/ou vítima dos diversos delitos é o particular ou o funcionário público;
  • O desacato protege a função pública, sem conferir qualquer privilégio ao funcionário. Ainda, os agentes públicos trabalham para o bem da coletividade, de maneira que são mais expostos à crítica do que um cidadão no seu particular. 

É um crime doloso, jamais culposo, que se consuma quando o funcionário público conhece do desacato. É formal, pois pouco importa se o funcionário público se sinta ofendido ou não com o que foi proferido. Portanto, admite tentativa. O Código Penal Militar apresenta hipóteses específicas nos arts. 328 e 330.

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