Características Essenciais
Na formulação tradicional, de Sieyès, o poder constituinte é dotado de atributos que o diferenciam dos poderes constituídos. Trata-se de poder:
- Inicial;
- Ilimitado;
- Incondicionado;
- Indivisível;
- Permanente.
Poder Inicial
O poder constituinte originário funda a ordem jurídica e institui o Estado, rompendo com o passado e a ordem jurídica precedente. A nova ordem jurídica é instituída sem fundamento de validade em outra norma positiva, de modo que as normas infraconstitucionais compatíveis com a nova constituição são recepcionadas, recebendo um novo fundamento de validade.Contudo, tal ideia recebe algumas críticas, como:
- A decisão do constituinte não “nasce do nada”, como sugere o fato de ser um poder inicial;
- A constituição congrega elementos do presente, do passado e do futuro, expressando “situação cultural dinâmica”; funcionando para o povo como “fundamento de suas esperanças”, não só como “espelho de seu legado cultural”. Para que se possa falar em unidade constitucional, o novo texto deve ser capaz de congregar estes aspectos.
Poder Ilimitado
Não está sujeito a limites jurídicos, especialmente às prescrições da ordem jurídica passada, ou seja, é juridicamente onipotente. Críticas a tal ideia:
- O poder constituinte seria limitado pelo Direito Natural, entendimento defendido desde o Jusnaturalismo, quando sequer havia uma teoria do poder constituinte propriamente dita;
- Atualmente, inúmeros são os limites apontados ao poder constituinte, como, por exemplo, os direitos humanos internacionalmente reconhecidos e os princípios supra positivos de justiça;
- "Condicionamentos pré-constituintes” (Barroso) – há limites materiais impostos pelas normas que convocam a Assembleia Constituinte que devem ser respeitados na elaboração do texto.
Jorge Miranda traz outras limitações materiais ao poder constituinte originário, o qual se sujeita a três tipos principais de limites:
- Limites transcendentes: advindos de imperativos do Direito Natural, de valores éticos costumeiramente reconhecidos, inerentes ao homem, que dizem respeito a uma consciência jurídica coletiva;
- Limites imanentes: relacionados à própria identidade do Estado e, portanto, variam a depender dos valores consagrados no Estado. Por exemplo: soberania, forma republicana de governo;
- Limites heterônomos: provenientes da conjugação com outros ordenamentos jurídicos. Por exemplo: obrigações impostas pela ordem jurídica internacional a um ou outro país.
Poder Incondicionado
O próprio poder constituinte originário poderia estabelecer sua forma de manifestação, não devendo obediência a nenhum procedimento previamente definido. É possível, contudo, que possam ser editadas regras prévias à elaboração da nova Constituição, definindo seu procedimento.
A ideia de poder incondicionado diz respeito ao fato de que o poder constituinte originário não está sujeito a nenhuma condição imposta pelo ordenamento jurídico precedente, ditando suas próprias regras e forma de manifestação.
É possível que o próprio ato convocador do poder constituinte originário traga algumas limitações materiais ao exercício do poder, mas não significa que estaria condicionado, pois não são limitações trazidas pela ordem jurídica antecedente, mas sim pelo próprio poder constituinte originário.
Críticas:
- Não se pode aceitar a validade de todo e qualquer processo constituinte, a exemplo de procedimentos autoritários, como a outorga unilateral da constituição pelos detentores do poder ou a imposição de um texto constitucional por países estrangeiros. Embora não esteja condicionado a uma ordem precedente, não se pode aceitar toda e qualquer forma de manifestação deste poder. É imprescindível que não seja proveniente de processos autoritários.
Poder Indivisível
preciso conferir unidade à atuação do poder constituinte, mesmo diante da pluralidade dos cidadãos que o cotitularizam e das visões de mundo presentes na sociedade no momento constituinte. Decisões fundamentais, de caráter vinculante, precisam ser adotadas.
Embora determinado Estado tenha diversidade de opiniões, cultura, interesses sociais e políticos, no momento de manifestação do poder constituinte é imprescindível que haja uma unidade, de modo a conferir identidade à Constituição.
No momento em que é feita determinada escolha, consequentemente, renuncia-se a uma escolha antagônica. Por isto é essencial a unidade que diga respeito à indivisibilidade do poder constituinte.
Ou estamos diante de um poder constituinte originário, com pleno exercício da soberania e unidade, ou estamos diante de um poder constituído. Daí a expressão “não há poder constituinte pela metade”.
Críticas:
- A ideia de indivisibilidade não pode ser aceita se importar na adoção de uma compreensão fechada sobre a identidade constitucional, de forma a violar os ideários do pluralismo e da democracia. A indivisibilidade não pode se sobrepor às diferenças presentes no Estado no determinado momento. Assim a indivisibilidade não é absoluta;
- Concepção abalada pelo advento do constitucionalismo supraestatal no contexto da União Europeia, em que diversos Estados com valores completamente diferentes formaram uma unidade e seguem diversos tratados.
Poder Permanente
Possibilidade de se manifestar a qualquer tempo.O poder constituinte deve manter-se oculto na maior parte do tempo. Ou seja, deve estar presente, mas não exercido, pois a frequência excessiva de manifestações do poder constituinte originário gera instabilidade política e compromete o florescimento de uma cultura constitucional.
O que está por trás da ideia de poder permanente é que a soberania popular permanece, isto é, ainda que seja elaborada e promulgada uma nova constituição, nada impede que o povo reclame, no futuro, a edição de outra constituição, caso se verifique que a existente não atende mais aos seus anseios.