Introdução

O primeiro passo no estudo da estabilidade trabalhista para as gestantes é compreender os motivos pelos quais esse benefício existe. Essa modalidade se relaciona com a tutela dos direitos das mulheres, do nascituro e da maternidade - diante de um mercado de trabalho tradicionalmente discriminatório, foi necessária a criação de mecanismos para resguardar a mulher em estado gravídico.

O período de gravidez e de início de maternidade é extremamente delicado, pois trata-se da concepção e desenvolvimento de um novo ser humano, de uma nova vida. Nesse sentido, a dispensa arbitrária viola toda a proteção constitucional conferida à criança, já que o trabalho é o que proporciona à mulher as condições para preservar a vida de seu futuro filho.

Apesar da evolução recente do Direito no que tange à igualdade de gênero, ainda está presente o ideário de que a mulher deve se dedicar exclusivamente à maternidade, prejudicando seu crescimento profissional. Dessa forma, as mulheres em idade fértil, grávidas ou com filhos, são vítimas de práticas discriminatórias no mercado de trabalho.

Abaixo estão elencados alguns dos fundamentos normativos para a existência da estabilidade da gestante:

CF/88

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

I - homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações, nos termos desta Constituição;

Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:

XX - proteção do mercado de trabalho da mulher, mediante incentivos específicos, nos termos da lei;

Código Civil

Art. 2º.  A personalidade civil da pessoa começa do nascimento com vida; mas a lei põe a salvo, desde a concepção, os direitos do nascituro.

  • Convenção nº 100 OIT: Igualdade de remuneração entre homens e mulheres trabalhadores por trabalho de igual valor;
  • Convenção nº 103 OIT: Amparo à maternidade.

Prazo e Condições da Estabilidade

A estabilidade da gestante dura desde a confirmação da gravidez até cinco meses após o parto (vide art. 10, II, 'b', ADCT). Assim, presentes essas condições, a mulher só poderá ser dispensada por justa causa (sem a necessidade de inquérito para a apuração de falta grave). Importante notar que, assim como toda a gama de direitos trabalhistas, a estabilidade da gestante aplica-se à empregada doméstica:

LC 150/2015

Art. 25.  A empregada doméstica gestante tem direito a licença-maternidade de 120 (cento e vinte) dias, sem prejuízo do emprego e do salário, nos termos da Seção V do Capítulo III do Título III da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), aprovada pelo Decreto-Lei no 5.452, de 1o de maio de 1943. 

Parágrafo único.  A confirmação do estado de gravidez durante o curso do contrato de trabalho, ainda que durante o prazo do aviso prévio trabalhado ou indenizado, garante à empregada gestante a estabilidade provisória prevista na alínea “b” do inciso II do art. 10 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias. 

Uma decisão importante sobre o tema é a do STF no julgamento do RE 629.053, em sede de repercussão geral. A corte estabeleceu que a aplicação da estabilidade só depende da anterioridade da gravidez e da ausência de justa causa para a dispensa - a comunicação ao empregador não é um elemento imprescindível. Isso porque, muitas vezes, a própria mulher ainda não tem o conhecimento sobre a gravidez, então seria incoerente exigir a comunicação de seu estado gravídico.

Outra informação interessante é a aplicabilidade da estabilidade para o empregado adotante, visto que não há discriminação entre a parentalidade sanguínea e a socioafetiva.

CLT

Art. 391. Não constitui justo motivo para a rescisão do contrato de trabalho da mulher o fato de haver contraído matrimônio ou de encontrar-se em estado de gravidez.

Parágrafo único. Não serão permitidos em regulamentos de qualquer natureza contratos coletivos ou individuais de trabalho, restrições ao direito da mulher ao seu emprego, por motivo de casamento ou de gravidez.

Art. 391-A.  A confirmação do estado de gravidez advindo no curso do contrato de trabalho, ainda que durante o prazo do aviso prévio trabalhado ou indenizado, garante à empregada gestante a estabilidade provisória prevista na alínea b do inciso II do art. 10 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias.

Parágrafo único.  O disposto no caput deste artigo aplica-se ao empregado adotante ao qual tenha sido concedida guarda provisória para fins de adoção.

Entendimentos do TST

Súmula 244. GESTANTE. ESTABILIDADE PROVISÓRIA (redação do item III alterada na sessão do Tribunal Pleno realizada em 14.09.2012) - Res. 185/2012, DEJT divulgado em 25, 26 e 27.09.2012

I - O desconhecimento do estado gravídico pelo empregador não afasta o direito ao pagamento da indenização decorrente da estabilidade (art. 10, II, "b" do ADCT).

II - A garantia de emprego à gestante só autoriza a reintegração se esta se der durante o período de estabilidade. Do contrário, a garantia restringe-se aos salários e demais direitos correspondentes ao período de estabilidade.

III - A empregada gestante tem direito à estabilidade provisória prevista no art. 10, inciso II, alínea “b”, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, mesmo na hipótese de admissão mediante contrato por tempo determinado.

A partir dessa súmula podemos tirar duas constatações importantes:

  1. A mulher pode ser reintegrada caso a dispensa ocorra dentro do período de estabilidade ou pode receber indenização se este período for superado;
  2. A estabilidade provisória também se aplica aos contratos por tempo determinado, prorrogando o termo final do contrato pelo tempo necessário.

Trabalho Temporário (IAC 5639-31.2013.5.12.0051)

No julgamento de um Incidente de Assunção de Competência, o TST fixou o entendimento de que a estabilidade da gestante é incompatível com o regime de trabalho temporário. Essa modalidade contratual serve para atender situações excepcionais de necessidade transitória da empresa, inexistindo expectativa de transformação em contrato por prazo indeterminado.

Diante disso, compreendendo a iminência da extinção do próprio serviço e a impossibilidade de prorrogar indefinidamente o contrato, o tribunal determinou que a estabilidade da gestante é inaplicável ao contrato temporário, regido pela Lei nº  6.019/74.

Por outro lado, o contrato de experiência possui prazo determinado, mas existe a justa expectativa de transformação em contrato por prazo indeterminado. A empresa "testa" o trabalhador para entender o seu encaixe naquela função e, obtendo resultados positivos, efetivá-lo como funcionário.

Contrato de Aprendizagem (RR 1001175-75.2016.5.02.0032)

A hipótese de estabilidade no contrato de aprendizagem foi abordada no Tema 497 do STF e também pela 4ª turma do TST. Em ambos os julgamentos, prevaleceu a interpretação de que a estabilidade não é aplicável.

De acordo com a turma do TST, o advento do termo final do contrato não configura uma dispensa, mas  uma simples resolução do contrato, algo acordado entre as partes. Como a estabilidade depende de gravidez prévia e dispensa sem justa causa, o benefício foi negado.

Outros Aspectos Importantes

Pedido de demissão

Todo empregado estável pode pedir demissão, mas deve fazer isso com a assistência de um órgão competente. Essa exigência legal serve para evitar que existam pressões sobre o trabalhador para pedir a rescisão do contrato e ficar prejudicado. A assistência deve vir do sindicato ou da autoridade local vinculada ao Ministério do Trabalho ou Justiça do Trabalho.

Art. 500, CLT.  O pedido de demissão do empregado estável só será válido quando feito com a assistência do respectivo Sindicato e, se não o houver, perante autoridade local competente do Ministério do Trabalho e Previdência Social ou da Justiça do Trabalho.

Indenização

A mulher que inicia seu período gravídico durante o contrato de trabalho e é dispensada sem justa causa, faz jus à reintegração durante todo o período de estabilidade (gravidez até 5 meses após o parto). Superado este prazo, surge o direito à indenização no valor dos salários correspondentes ao período de estabilidade.

Ainda que a mulher não comunique seu estado gravídico ao empregador após a dispensa por, intencionalmente, não querer a reintegração, o direito de estabilidade permanece e ela faz jus à indenização. Este entendimento está presente no julgamento do Recurso de Revista RR-496-89.2019.5.23.0004.

Teste de Gravidez

A realização do teste de gravidez na empregada no ato de demissão não é considerado uma conduta abusiva ou discriminatória por parte do empregador. A interpretação do TST vai em sentido contrário inclusive. Entende-se que o teste dá maior segurança jurídica para a mulher, visto que muitas vezes ela desconhece seu estado gestacional. Descobrindo a gravidez, o empregador pode mantê-la no cargo ou pagar a indenização pertinente de forma adiantada, sem que a mulher precise recorrer ao judiciário.

Assim, o teste de gravidez só configura um ato discriminatório na admissão ou promoção da mulher, mas não em sua dispensa. Este entendimento está presente no julgamento do Recurso de Revista RR-61-04.2017.5.11.0010.

Fechamento do Estabelecimento ou Empresa

Diferentemente da estabilidade do dirigente sindical, nas estabilidades subjetivas (por circunstâncias pessoais) o direito acompanha a pessoa. Sendo assim, a mulher grávida que se encontra em empresa no procedimento de fechar ou encerrar atividades tem direito à indenização (se não for possível manter a prestação de serviços).

Conversão de reintegração em indenização

É admitida a possibilidade do juiz competente converter, de ofício, a reintegração em indenização, nos casos em que o período de estabilidade acaba durante o processo. A Súmula 396 do TST evidencia este entendimento:

Súmula nº 396 do TST. ESTABILIDADE PROVISÓRIA. PEDIDO DE REINTEGRAÇÃO. CONCESSÃO DO SALÁRIO RELATIVO AO PERÍODO DE ESTABILIDADE JÁ EXAURIDO. INEXISTÊNCIA DE JULGAMENTO "EXTRA PETITA" (conversão das Orientações Jurisprudenciais nºs 106 e 116 da SBDI-1) - Res. 129/2005, DJ 20, 22 e 25.04.2005.

I - Exaurido o período de estabilidade, são devidos ao empregado apenas os salários do período compreendido entre a data da despedida e o final do período de estabilidade, não lhe sendo assegurada a reintegração no emprego. (ex-OJ nº 116 da SBDI-1 - inserida em 01.10.1997)

II - Não há nulidade por julgamento “extra petita” da decisão que deferir salário quando o pedido for de reintegração, dados os termos do art. 496 da CLT. (ex-OJ nº 106 da SBDI-1 - inserida em 20.11.1997).

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