Introdução

A garantia de determinados direitos aos pacientes gera automaticamente um rol de deveres para os médicos. Dentre essas obrigações, estão o dever de informar e o dever de sigilo, enquadrados como os dois pilares da atuação médica diante do paciente.

Dever de Informar

É dever do médico prestar todas as informações necessárias, de maneira clara e coerente, de forma que todas as dúvidas do paciente possam ser esclarecidas e, a partir desse momento, possa exercer a sua autonomia de vontade de forma segura e devidamente consentida.

Esse dever decorre da garantia de dois princípios: dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, CF) e autonomia da vontade (art. 31, CEM).

É importante que o profissional informe corretamente o paciente sobre sua condição e as possibilidades de tratamento porque é isso que permite que o paciente escolha livremente o que será realizado em prol de sua saúde. O descumprimento deste dever pelo médico gera responsabilidade disciplinar e civil, visto que a necessidade de informação adequada está presente no CEM e no CDC:

CEM

É vedado ao médico:

Art. 24. Deixar de garantir ao paciente o exercício do direito de decidir livremente sobre sua pessoa ou seu bem-estar, bem como exercer sua autoridade para limitá-lo.

Art. 34. Deixar de informar ao paciente o diagnóstico, o prognóstico, os riscos e os objetivos do tratamento, salvo quando a comunicação direta possa lhe provocar dano, devendo, nesse caso, fazer a comunicação a seu representante legal.

CDC

Art. 6º São direitos básicos do consumidor:

III - a informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com especificação correta de quantidade, características, composição, qualidade, tributos incidentes e preço, bem como sobre os riscos que apresentem;

Ao informar o paciente, o médico deve ser preciso, evitando exageros no diagnóstico ou prognóstico - essa é considerada informação de qualidade. Além disso, pensando no melhor para o paciente, o médico não pode complicar as terapias (ou tratamentos) nem se exceder no número de visitas e consultas, realizando procedimentos desnecessários. Trata-se do chamado "Equilíbrio das Informações Médicas".

CEM

Art. 35. Exagerar a gravidade do diagnóstico ou  do prognóstico, complicar a terapêutica ou exceder-se no número de visitas, consultas ou quaisquer outros procedimentos médicos.

Resta, ainda, tratar dos casos em que o paciente se encontra em situação que necessite de procedimentos complexos ou que possam gerar consequências raras. Sobre este ponto, o CFM e o poder judiciário divergem.

Enquanto o judiciário entende que todas as informações devem ser fornecidas ao paciente, independentemente da incidência dos eventos, o CFM interpreta que a disposição de todas as informações de procedimentos complexos pode tornar a comunicação e o documento (prontuário) muito prolixo e pouco acessível, contrariando a própria ideia de informar o paciente.

Tal entendimento está presente na Recomendação nº 1 de 2016:

9.1.3. O que devem conter o termo de consentimento e o termo de assentimento livre e esclarecido?

[...]

Em procedimentos complexos, o oferecimento de todas as informações pode tornar o documento excessivamente prolixo e caracterizar a situação de “saturação informativa”. Uma alternativa é oferecer ao paciente as informações necessárias para contemplar o máximo de situações possível, e, para as intercorrências extremamente raras, pode solicitar-lhe no próprio termo se deseja recebê-las. Caso o paciente deseje, recomenda-se dar-lhe os meios de acesso.

Dever de Sigilo

Cabe ao médico guardar sigilo de todas as informações que tiver tomado conhecimento em virtude do exercício da sua profissão, salvo as exceções.

Mais uma vez temos um dever médico intimamente ligado a uma previsão constiucional de garantia de direitos fundamentais:

CF/88

Art. 5º [...]

X - são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação;  

A violação desse dever de sigilo pelo médico acarreta consequências no âmbito civil e penal, como é possível notar:

Código Penal

Art. 154 - Revelar alguém, sem justa causa, segredo, de que tem ciência em razão de função, ministério, ofício ou profissão, e cuja revelação possa produzir dano a outrem.

CEM

Princípios Fundamentais

XI - O médico guardará sigilo a respeito das informações de que detenha conhecimento no desempenho de suas funções, com exceção dos casos previstos em lei.

É vedado ao médico:

Art. 73. Revelar fato de que tenha conhecimento em virtude do exercício de sua profissão, salvo por motivo justo, dever legal ou consentimento, por escrito, do paciente. 

Parágrafo único. Permanece essa proibição: a) mesmo que o fato seja de conhecimento público ou o paciente tenha falecido; b) quando de seu depoimento como testemunha. Nessa hipótese, o médico comparecerá perante a autoridade e declarará seu impedimento; c) na investigação de suspeita de crime, o médico estará impedido de revelar segredo que possa expor o paciente a processo penal.

Exceções ao Sigilo

Existem situações em que o médico pode se escusar do dever de sigilo. Entende-se que a falta de notificação ou informação sobre a situação do paciente pode ser mais prejudicial do que o seu sigilo.

Dever Legal

Nos casos em que é imposto ao médico a notificação compulsória para determinadas doenças, não há que se falar em violação do dever de sigilo, visto que é a própria norma que impõe essa conduta ao médico.

Consentimento do Paciente

Quando o paciente, por escrito, concordar expressamente com a divulgação das informações. Ocorre nos casos de personalidades públicas, que autorizam a emissão de um Boletim Médico em coletiva de imprensa para atualizar a sociedade sobre o seu estado de saúde.

 Atenção: o paciente pode limitar o tipo de informação que será repassada através da imprensa!

Motivo Justo

A depender do caso concreto, é possível que se constate uma motivação justa para a quebra do dever de sigilo, extinguindo a possibilidade de punição do profissional médico.

Um exemplo de motivo justo é a legítima defesa em um processo no qual foi demandado, com acusações sobre o procedimento adotado. Nesta situação, o médico pode revelar as informações que eram sigilosas para comprovar a sua inocência com relação àquela acusação.

Outros Deveres Médicos

Dever de atualização

O médico deve sempre se manter atualizado às pesquisas e terapêuticas disponíveis. Isso permite que o profissional consiga utilizar métodos mais eficazes e menos danosos ao paciente.

Dever de vigilância e de cuidados

O médico não pode abandonar o paciente e deve manter-se sempre vigilante quando o paciente estiver sob tratamento.

Dever de abstenção de abuso

O médico deve se embasar na ciência e nas técnicas comprovadamente eficazes, evitando abusos decorrentes de métodos não aprovados.

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