A Relevância do Consentimento

A adoção exige, em certos casos, que haja um consentimento no seu processo. Com a adoção, haverá uma relação jurídica paterno-filial que não pode ser imposta, mas sim voluntária, exigindo a concordância de ambas as partes envolvidas. No caso dos menores, exige-se o consentimento dos pais ou representantes legais, havendo a ruptura definitiva deste laço após o trânsito em julgado da decisão de adoção, criando uma nova relação de filiação.

Existe alguma situação em que o vínculo com os pais biológicos é mantido? Sim, no caso dos impedimentos matrimoniais. Logo, o adotando não pode, por exemplo, se casar com a sua mãe biológica, mesmo com a extinção dos vínculos jurídicos entre seus pais biológicos e si.

A adoção é ato personalíssimo e exclusivo, de maneira que ambos os pais devem concordar com a adoção a ser realizada, não bastando que apenas um dos pais tenha o interesse em encaminhar seu filho à adoção. O consentimento, neste caso, não pode ser presumido. Mesmo que o menor esteja sob a guarda de apenas um dos pais ou de terceiros, o genitor segue devendo consentir, salvo se houve destituição do poder familiar anteriormente.

Desnecessidade de Ação Autônoma Para a Destituição do Poder Familiar

Não se exige que primeiro haja uma ação autônoma desconstituindo o poder familiar para que a adoção ocorra. É o que diz o didático art. 166, que admite a formulação em cartório. Ou os pais foram previamente destituídos do poder familiar ou desejam entregar a criança a adoção, fazendo este ato em cartório. 

Art. 166.  Se os pais forem falecidos, tiverem sido destituídos ou suspensos do poder familiar, ou houverem aderido expressamente ao pedido de colocação em família substituta, este poderá ser formulado diretamente em cartório, em petição assinada pelos próprios requerentes, dispensada a assistência de advogado.

Se houver concordância dos pais, o juiz, junto do MP, ouvirá as partes, devidamente assistidas, em 10 dias do protocolo da petição ou entrega da criança, para verificar a voluntariedade e extinguir, posteriormente, o poder familiar. Isto até porque é possível futuro arrependimento.

Em suma, os pais podem mudar de ideia. Isto pode ocorrer antes ou depois da audiência, situações que gerarão consequências e nomenclaturas diversas:
- Antes ou até a audiência: desistência ou retratação (arts. 19-A, § 8º e 166, § 5º, ECA).
- Até 10 dias após a audiência: arrependimento – portanto, a extinção do poder familiar em audiência é uma decisão sob condição suspensiva de 10 dias. 

Tipos de Consentimento

Consentimento Esclarecido

Conforme preconiza o art. 166, § 2º do ECA, o consentimento é precedido de oitiva e diálogo com uma equipe profissional especializada neste sentido, visando analisar se a adoção será a melhor pedida para os interesses do futuro adotando.

§2º O consentimento dos titulares do poder familiar será precedido de orientações e esclarecimentos prestados pela equipe interprofissional da Justiça da Infância e da Juventude, em especial, no caso de adoção, sobre a irrevogabilidade da medida.

Sigilo do Consentimento

É garantida a livre manifestação de vontade e o sigilo das informações, para que, diante da segurança do sigilo, eles possam tomar uma decisão sem julgamento e dotada de honestidade. 

Ratificação do Consentimento

O consentimento prestado por escrito só vale se vier a ser ratificado na audiência perante o juiz que foi mencionada. O juiz, portanto, estará ao lado do Ministério Público e da equipe profissional ouvindo novamente os pais.

Direito de Retratação

O art. 166, § 5º do ECA admite que os pais venham a exercer o direito de retratação até 10 dias da sentença que extinguiu o poder familiar. Isto ocorre porque pode ser que, quando o rompimento do poder familiar se torna “real”, os pais se arrependam e queiram se manter com o adotando. É perceptível que o ECA se preocupa com a certeza total dos pais que consentem com a adoção.

§5º O consentimento é retratável até a data da realização da audiência especificada no § 1 o deste artigo, e os pais podem exercer o arrependimento no prazo de 10 (dez) dias, contado da data de prolação da sentença de extinção do poder familiar.

Adoção de Pessoa Adulta

Apesar de não se exigir o consentimento dos pais biológicos, entende-se, na doutrina, que eles devem ser citados e para que protejam interesses jurídicos que podem advir desta desconstituição do poder familiar. Mesmo sem determinação legal, portanto, é recomendável que esta prática seja adotada.

Consentimento do Maior de 12 Anos

Conforme o art. 45, § 2º do ECA, o maior de 12 anos, além de ter o consentimento dos seus pais biológicos, devem consentir para que seu processo de adoção ocorra. É uma idade em que ela tem discernimento suficiente de que compreender a sua situação e decidir o que é melhor para si.

§ 2º. Em se tratando de adotando maior de doze anos de idade, será também necessário o seu consentimento.

Oitiva do Menor de 12 Anos

Enquanto o consentimento do maior de 12 anos é necessário para que a adoção ocorra, a oitiva do menor de 12 anos deve acontecer sempre que for possível, através de equipe interprofissional, sendo devidamente considerada (mas não uma conditio sine qua non, como ocorre com os adolescentes, ou seja, os maiores de 12 anos), conforme aponta o art. 28, § 1º do ECA.

§1º Sempre que possível, a criança ou o adolescente será previamente ouvido por equipe interprofissional, respeitado seu estágio de desenvolvimento e grau de compreensão sobre as implicações da medida, e terá sua opinião devidamente considerada.

Forma do Consentimento

Apesar de não existir uma forma específica exigida em lei para que se formalize o consentimento, exige-se, como já dito, que haja sua ratificação perante o juiz e o Ministério Público em audiência específica.

Conflito de Interesses

Neste caso, conforme art. 39, § 3º, ECA, se houver conflito de interesses entre o adotando e terceiros, devem prevalecer os interesses daquele, mesmo que contra seus próprios pais biológicos. Como será melhor visto, o princípio do melhor interesse da criança e do adolescente é o principal norte do Estatuto da Criança e do Adolescente, admitindo-se até mesmo decisões contrárias à lei quando ele é atingido, de forma que esta deve ser a baliza em conflitos de interesses.

Dispensa do Consentimento

O consentimento é dispensado quando os pais são desconhecidos ou tenham perdido o poder familiar, por uma questão até mesmo lógica. O art. 1.638, CC/02, elenca as situações em que os pais perderão, por decisão judicial, o poder familiar. 

Art. 1.638. Perderá por ato judicial o poder familiar o pai ou a mãe que:
I - castigar imoderadamente o filho;
II - deixar o filho em abandono;
III - praticar atos contrários à moral e aos bons costumes;
IV - incidir, reiteradamente, nas faltas previstas no artigo antecedente.
V - entregar de forma irregular o filho a terceiros para fins de adoção.  

Parágrafo único. Perderá também por ato judicial o poder familiar aquele que: 

I – praticar contra outrem igualmente titular do mesmo poder familiar:  
a) homicídio, feminicídio ou lesão corporal de natureza grave ou seguida de morte, quando se tratar de crime doloso envolvendo violência doméstica e familiar ou menosprezo ou discriminação à condição de mulher;  
b) estupro ou outro crime contra a dignidade sexual sujeito à pena de reclusão;  

II – praticar contra filho, filha ou outro descendente: 
a) homicídio, feminicídio ou lesão corporal de natureza grave ou seguida de morte, quando se tratar de crime doloso envolvendo violência doméstica e familiar ou menosprezo ou discriminação à condição de mulher;  
b) estupro, estupro de vulnerável ou outro crime contra a dignidade sexual sujeito à pena de reclusão.

Conforme o art. 1.638, CC/02, é proibido a entrega do filho a terceiros com o fim de adoção, sob pena de destituição do poder familiar e de efeitos criminais. Isto será melhor estudado, mas é chamado de “adoção à brasileira”, situação em que se busca burlar o procedimento legal estabelecido para a adoção regular.

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