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Aspectos Iniciais

A ação civil pública é o instrumento processual previsto na Constituição Federal e em normas infraconstitucionais, de que se podem valer o Ministério Público e outras entidades legitimadas para a defesa de interesses difusos, coletivos e individuais homogêneos.

Destarte, a ação civil pública é um processo coletivo e não pode ser utilizada para a defesa de direitos e interesses disponíveis, nem para interesses propriamente privados, salvo se, pela sua abrangência e dispersão, puderem interessar a grupos, classes ou categorias de pessoas que se encontrem na mesma situação de fato e de direito.

A ACP, embora não possa ser chamada de ação constitucional (como a Ação Direta de Inconstitucionalidade - ADI), tem, segundo a doutrina, um status constitucional, já que a Constituição coloca a sua propositura como função institucional do Ministério Público (art. 129, II, III e IV, da CF), mas sem dar-lhe exclusividade, pois sua legitimidade é concorrente com a de outros colegitimados (art. 5º da Lei nº 7.347/85):

Art. 5º Têm legitimidade para propor a ação principal e a ação cautelar:

I - o Ministério Público;

II - a Defensoria Pública;

III - a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios;

IV - a autarquia, empresa pública, fundação ou sociedade de economia mista;

V - a associação que, concomitantemente:

a) esteja constituída há pelo menos 1 (um) ano nos termos da lei civil;

b) inclua, entre suas finalidades institucionais, a proteção ao patrimônio público e social, ao meio ambiente, ao consumidor, à ordem econômica, à livre concorrência, aos direitos de grupos raciais, étnicos ou religiosos ou ao patrimônio artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico.

Quanto à associação, importante lembrar que o §4º faz uma ressalva, permitindo a dispensa do requisito de pré-constituição pelo juiz quando haja manifesto interesse social, evidenciado pela dimensão ou característica do dano, ou pela relevância do bem jurídico a ser protegido.

A Lei nº 7.347/85 regula as disposições gerais da Ação Civil Pública, mas é importante ressaltar que o Código de Processo Civil e o Código de Defesa do Consumidor serão utilizados de forma subsidiária à legislação supracitada, conforme arts. 19 e 21, respectivamente.

A ação civil pública, da mesma forma que a ação popular, busca proteger os interesses da coletividade. Cabe ação pública, por exemplo, quando uma comunidade é atingida pelo rompimento de uma barragem. A expressão interesse coletivo não está empregada em sentido restrito, mas como sinônimo de interesse público ou geral. Abrange, especialmente, a proteção de direitos transindividuais, quais sejam:

  1. Direitos difusos, que possuem natureza indivisível, que sejam de titularidade de pessoas indeterminadas e ligadas por circunstância de fato;
  2. Direitos coletivos, também de natureza indivisível, de titularidade de grupo, categoria ou classe de pessoas ligadas entre si; e
  3. Direitos individuais homogêneos, assim entendidos os decorrentes de origem comum.

Importante fazer uma observação quanto aos direitos individuais homogêneos, vez que decorrem de uma origem comum, possuem transindividualidade artificial. Os seus titulares são pessoas determinadas, o seu objeto é divisível e admite reparabilidade direta, ou seja, reparação individual.

O tratamento especial conferido aos direitos individuais homogêneos tem razões pragmáticas, objetivando unir várias demandas individuais em uma única coletiva por razões de facilitação do acesso à justiça e priorização da eficiência e da economia processuais. Como exemplo de situação que envolve direitos individuais homogêneos, a dos compradores de carros de um determinado lote que tenha ficado comprometido por um mesmo defeito de fabricação.

Ademais, como principais exemplos, o rol (exemplificativo) de direitos do art. 1º da Lei da ACP: direito ao meio ambiente, do consumidor, ao patrimônio histórico ou cultural, à ordem econômica, à ordem urbanística, à honra e à dignidade de grupos raciais, étnicos ou religiosos e ao patrimônio público e social.

Nesse sentido, conforme disposto no art. 1º, parágrafo único da Lei nº 7347/85, não será cabível ação civil pública para veicular pretensões que envolvam tributos, contribuições previdenciárias, o FGTS ou outros fundos de natureza institucional cujos beneficiários possam ser individualmente determinados.

Assim, feita essa ressalva, essencial lembrar que existem outras hipóteses em legislação específica acerca do cabimento de ACP.  A primeira aparece no ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente), no art. 208, §1º, enquanto a segunda se encontra no Estatuto do Idoso (Lei nº 10.741/03), em seu art. 79, parágrafo único.

Art. 208. Regem-se pelas disposições desta Lei as ações de responsabilidade por ofensa aos direitos assegurados à criança e ao adolescente, referentes ao não oferecimento ou oferta irregular: [...]

§1º As hipóteses previstas neste artigo não excluem da proteção judicial outros interesses individuais, difusos ou coletivos, próprios da infância e da adolescência, protegidos pela Constituição e pela Lei.   

Art. 79. Regem-se pelas disposições desta Lei as ações de responsabilidade por ofensa aos direitos assegurados ao idoso, referentes à omissão ou ao oferecimento insatisfatório de: [...]

Parágrafo único. As hipóteses previstas neste artigo não excluem da proteção judicial outros interesses difusos, coletivos, individuais indisponíveis ou homogêneos, próprios do idoso, protegidos em lei.

A competência para processamento e julgamento da ação civil pública é do juízo do foro do local onde ocorreu o dano ou onde houver a ameaça de dano, conforme dispõe o art. 2º, da Lei nº 7.347/85. Trata-se de competência absoluta, logo, não cabe flexibilização pelas partes.

Caso a lesão se perpetue no âmbito nacional, a competência será concorrente, podendo optar o legitimado ativo por propor a demanda na Capital de Estado ou no Distrito Federal, isto, em nome do acesso à justiça e em benefício da defesa dos interesses transindividuais. Ademais, a propositura é causa de prevenção do juízo para todas as ações posteriores, cuja causa de pedir e objeto sejam os mesmos.

A Lei nº 7.347/85 prevê no art. 4º a possibilidade de ajuizamento de ação cautelar e, no art. 12, o mandado liminar. Ambas são formas de tutela preventiva na busca de evitar o dano aos bens jurídicos tutelados.

Dessa forma, o Código de Processo Civil será aplicado subsidiariamente quanto à essas medidas, vez que a Lei da ACP não dispõe sobre esses procedimentos. Assim, essencial a presença dos requisitos desse tipo de medida, quais sejam, o fumus boni juris e periculum in mora.

Por fim, quanto aos pedidos, a Ação Civil Pública pode ser preventiva ou ressarcitória, conforme o art. 3º da Lei nº 7.347/85, podendo ter por objeto a condenação em dinheiro ou por cumprimento de obrigação de fazer ou não fazer. Dessa forma, importante também verificar a necessidade da inserção de pedido liminar, nos moldes supracitados.

Em seguida, é importante realizar apontamentos acerca da necessidade de realização de audiência de conciliação ou mediação (art. 319, VII, CPC); requerer a intimação do Ministério Público (art. 5º, §1º, Lei da ACP); requerer a produção de todas as provas admitidas no Direito; requerer a procedência da ação e a sucumbência do réu.

Ressalte-se que a ACP é uma ação gratuita, não sendo necessário adiantamento de custas, emolumentos ou honorários periciais. Nesse sentido, apesar da gratuidade,
deve ser apontado um valor da causa, nos termos do art. 291 do CPC, que, caso não seja auferível, pode ser indicado no montante de R$ 1.000,00 (mil reais).

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