A Lei 12.846/2013 é conhecida como Lei Anticorrupção (LAC). Ela trata da responsabilização administrativa e civil de pessoas jurídicas pela prática de atos contra a Administração Pública, nacional ou estrangeira.
A LAC inspira-se em modelos legais estrangeiros (como o Foreign Corruption Practice Act, dos Estados Unidos, e o Bribery Act, da Grã-Bretanha) e honra compromissos internacionais firmados pelo Brasil na Convenção sobre o Combate da Corrupção de Funcionários Públicos Estrangeiros em Transações Comerciais Internacionais da OCDE (1977), na Convenção Interamericana contra a Corrupção da OEA (1996), e na Convenção da ONU contra a Corrupção (2003).
Diante da pré-existência de normas que tratam do combate à corrupção no Brasil - no Código Penal e na Lei de Improbidade Administrativa - a inovação da LAC consistiu em alcançar, na esfera civil e administrativa, as pessoas jurídicas. E, embora não seja objeto deste curso, cabe apontar que a LAC é regulamentada pelo Decreto 11.129/2022.
Veremos agora do que tratam os arts. 1º a 4º da LAC.
A LAC prevê as condutas consideradas ilícitas praticadas contra a Administração pública por pessoas jurídicas bem como as sanções decorrentes dessas práticas e os procedimentos civis e administrativos para aplicação das sanções.
A Administração Pública aqui é o sujeito passivo atingido pelo ato de corrupção e abrange qualquer pessoa jurídica, órgão ou agente público dedicado a funções administrativas, de qualquer nível da federação (União, Estados, Município ou Distrito Federal) e de qualquer dos poderes (executivo, legislativo e judiciário).
Já as pessoas jurídicas abrangidas pela LAC, isto é, os possíveis sujeitos ativos das condutas corruptoras, compreendem:
Um dos principais aspectos da LAC é que há responsabilidade objetiva, tanto civil quanto administrativa, das pessoas jurídicas pelos atos lesivos praticados em seu interesse ou benefício, exclusivo ou não.
Vamos olhar com maior atenção alguns aspectos desta norma:
Podemos dizer que a responsabilidade civil significa o dever do agente de reparar um dano causado, sendo tutelada pelo Poder Judiciário da esfera cível. Já a responsabilidade administrativa significa o dever de certo agente de responder pela infração a normas administrativas, sendo tutelada pelos órgãos ou entidades do Poder Executivo. Uma não exclui a outra, de modo que poderá haver, pelos mesmos fatos e contra a mesma pessoa jurídica, um processo administrativo e um processo cível, ao mesmo tempo ou sucessivamente.
Naturalmente, apenas as más condutas que tenham visado ao interesse ou benefício da pessoa jurídica podem também atingi-la e gerar sanção. Note que o benefício não precisa ter sido concretizado, basta que tenha sido pretendido.
Existindo esses tipos de condutas, então, haverá responsabilidade objetiva das pessoas jurídicas. Isso significa que, se houver um dano e um nexo causal entre tais condutas e o dano, a pessoa jurídica será responsabilizada (civil e administrativamente, como vimos) independentemente da comprovação de seu dolo (que ela tenha agido conscientemente para provocar o dano) ou culpa (que ela tenha agido com negligência, imprudência ou imperícia). É isto que significa a responsabilidade objetiva. Na subjetiva, verificar-se-ia a existência de dolo ou culpa para que se atribuísse a responsabilização pelo ilícito.
A LAC deixa claro que a pessoa física que efetivamente praticou a conduta (dirigente, administrador ou qualquer pessoa natural, autora, coautora ou partícipe do ato ilícito) também poderá responder individualmente pelo dano causado. É a responsabilidade pessoal.
Nesse caso, a responsabilidade é subjetiva, ou seja, depende da comprovação do dolo e da culpa da pessoa. Isso também faz com que sua responsabilização (civil, penal ou administrativa) seja determinada na exata medida da sua participação e intenção para ocorrência do dano - na medida da sua culpabilidade.
Mas vale ressaltar que a responsabilização da pessoa jurídica e a responsabilização pessoal do autor da conduta são independentes. A pessoa jurídica responde pela conduta e o dano ainda que nenhuma medida tenha sido ainda tomada contra a pessoa natural.
Conforme o art. 4º da LAC, subsistirá (persistirá) a responsabilidade da pessoa jurídica mesmo se houver eventual:
No entanto, nos casos de fusão e incorporação mencionados acima, a responsabilidade da sociedade sucessora ficará restrita à:
Assim, não serão aplicáveis as demais sanções previstas na LAC, decorrentes de atos e fatos anteriores à data da fusão ou incorporação.
É evidente que, com tal regra, a LAC buscou fazer com que a responsabilidade de certa pessoa jurídica por ato de corrupção não atinja de modo indevido ou excessivo a pessoa jurídica sucessora resultante de operação de fusão ou incorporação.
EXCEÇÃO: haverá aplicação de todas as sanções previstas na LAC para as sucessoras nos casos em que houver simulação ou evidente intuito de fraude na fusão ou incorporação, devidamente comprovados. Ou seja, se tais operações forem comprovadamente utilizadas com o propósito especial de amenizar a responsabilidade da pessoa jurídica fundida ou incorporada, todas as sanções da LAC serão plenamente aplicáveis.
A fraude deve ser entendida como qualquer ardil (truque) utilizado para fazer com que uma operação aparentemente lícita alcance um fim ilícito. A simulação é um tipo de fraude, assim definida pela Lei 10.406/02:
Art. 167
§1º Haverá simulação nos negócios jurídicos quando:
I - aparentarem conferir ou transmitir direitos a pessoas diversas daquelas às quais realmente se conferem, ou transmitem;
II - contiverem declaração, confissão, condição ou cláusula não verdadeira;
III - os instrumentos particulares forem antedatados, ou pós-datados.
Haverá responsabilidade solidária entre a pessoa jurídica responsabilizada e as sociedades, nos termos da LAC:
Isso significa que as sociedades listadas acima responderão junto à pessoa jurídica “principal”, responsável pela prática dos atos previstos na Lei, bem como pelos danos causados por ela.
MAS, ATENÇÃO: assim como nos casos de fusão e incorporação, a responsabilidade solidária é restrita à: