Controle Interno
A gestão pública, tanto no planejamento quanto na execução, é regida por leis e praticada por agentes públicos, muitos dos quais exercem seus cargos por meio de mandato eletivo. Frequentemente, essas autoridades não possuem pleno conhecimento de todas as normas aplicáveis, tornando essenciais mecanismos que garantam o seu cumprimento para a correta destinação dos recursos e a observância dos princípios da administração pública, prevenindo o abuso de poder.
Essa supervisão é denominada controle, que, na definição do renomado administrativista Hely Lopes Meireles, consiste na capacidade de fiscalizar, orientar e corrigir a conduta funcional de outro poder, órgão ou autoridade.
O controle se manifesta de diversas maneiras, sendo o foco aqui o controle interno, ou seja, aquele exercido pela própria administração sobre seus serviços e seus agentes. Além dessa classificação “interno/externo”, a doutrina divide o controle de diversas outras maneiras:
- Quanto ao fundamento, à existência de hierarquia e à amplitude
- Hierárquico: resulta de escalonamento hierárquico dos órgãos administrativos.
- Finalístico: não possui fundamento na hierarquia.
- Quanto ao órgão que o exerce
- Administrativo: aquele que decorre das funções administrativas do órgão.
- Legislativo: controle realizado no exercício da função típica do Poder Legislativo de fiscalizar. Divide-se em controle parlamentar direto (exercido diretamente pelo Congresso Nacional) e controle parlamentar indireto (exercido pelo Tribunal de Contas da União).
- Judiciário: realizado pelo Poder Judiciário sobre a atuação da Administração Pública.
- Quanto ao momento em que se efetua
- Prévio: controle preventivo realizado antes do início da prática do ato ou antes de sua conclusão.
- Concomitante: acompanhamento da realização da atividade administrativa no momento do ato, para que este não se desvirtue da sua natureza, evitando falhas, desvios e até mesmo fraudes.
- Posterior/Subsequente: ocorre após a conclusão do ato.
- Quanto ao aspecto da atividade administrativa controlada
- De legalidade/legitimidade: procura verificar a conformação do ato ou do procedimento com as normas legais que o regem.
- De mérito: objetiva comprovar a eficiência e os resultados do ato, além dos aspectos de conveniência e oportunidade.
Ainda, a Instrução Normativa MP/CGU n° 01/2016 dispõe que a implementação dos controles internos deverá ocorrer com a estruturação de um modelo de governança constituído por meio das seguintes linhas de atuação:
- primeira linha, que compreende as atividades da gestão operacional relacionadas ao gerenciamento de riscos e de controles internos com vistas a fornecer segurança razoável quanto ao alcance dos objetivos institucionais (art. 3°);
- segunda linha, que compreende as funções de gestão relativas ao assessoramento, à coordenação, à supervisão e ao monitoramento das atividades de gerenciamento de riscos e controles internos executadas no âmbito da primeira linha (art. 6°);
- terceira linha, representada pela função de auditoria interna, que atua com base nos pressupostos de independência e objetividade, com o propósito de adicionar e proteger valor, melhorar as operações e contribuir para o alcance dos objetivos organizacionais, mediante prestação de serviços de avaliação e de consultoria sobre os processos de governança, gerenciamento de riscos e controles internos (art. 2°, III).
Os diversos controles mantidos em todos os setores organizacionais devem funcionar integrados, em forma de sistema, e subordinados a um órgão central de coordenação, orientados para o desempenho das respectivas atribuições. Esse órgão poderá ser instituído como unidade central de controle interno ou como controladoria, conforme venha regrado em cada nível de governo.
Assim, não se deve confundir o controle interno administrativo com o órgão ou unidade de controle interno ou de auditoria interna, cuja função é avaliar a qualidade dos outros controles implantados pelos gestores, como a Controladoria Geral da União. A CGU é órgão central do sistema no âmbito federal, exercendo o papel de orientação normativa e supervisão técnica sobre a atividade de auditoria interna do Poder Executivo Federal.
Determinadas no art. 74 da Constituição e no art. 59 da Lei de Responsabilidade Fiscal, as atribuições do Controle Interno podem ser entendidas de acordo com o que traz o Manual de Controle Interno do TCE/SP, quais sejam:
- Avaliar o cumprimento das metas propostas nos três instrumentos que compõem o processo orçamentário: o Plano Plurianual (PPA), a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) e a Lei Orçamentária Anual (art. 74, I, da CF e art. 75, III, da Lei 4.320, de 1964). Exemplo: se a LDO propôs a construção de duas escolas e uma creche, deve o Controle Interno observar o atingimento dessa intenção.
- Comprovar a legalidade da gestão orçamentária, financeira e patrimonial (art. 74, II, da CF e art. 75, I, da Lei 4.320, de 1964). A modo do art. 77 da Lei 4.320, essa verificação será prévia (antes de o ato financeiro produzir efeitos), concomitante (ao longo da execução do ato financeiro) e subsequente (após a realização do ato financeiro em certo período de tempo). Exemplos: havia suficiência de dotação na abertura do procedimento licitatório? O pagamento da despesa aconteceu após o efetivo recebimento do material ou serviço? O empenho do gasto onerou a adequada verba de orçamento? O adiantamento foi feito a servidor e, não, a agente político? A Câmara Municipal está adimplindo os limites constitucionais da despesa total, remuneração dos Vereadores e folha de pagamento?
- Comprovar a eficácia e a eficiência da gestão orçamentária, financeira e patrimonial (art. 74, II, da CF). Exemplo: a construção do posto de saúde está de acordo com o cronograma físico-financeiro? Tal projeto era a solução mais econômica para enfrentar o problema de saúde naquela região do Município?
- Comprovar a adequada aplicação dos recursos entregues a entidades do terceiro setor (art. 74, II, da CF). Exemplos: as instituições subvencionadas vêm empregando os dinheiros tal qual dito nos planos de trabalho? A prestação de contas é composta por confiável documentação fiscal? O atendimento terceirizado está cumprindo as metas físicas e qualitativas? O salário dos dirigentes não está acima da realidade de mercado?
- Assinar o Relatório de Gestão Fiscal em conjunto com o Prefeito ou o Presidente da Câmara Municipal e, também, com o responsável pela administração financeira (art. 54, parágrafo único, da LRF).
- Atentar se as metas de superávit orçamentário, primário e nominal devem ser cumpridas (art. 59, I, da LRF). Exemplo: ante uma considerável dívida líquida de curto prazo (déficit financeiro), a marcha orçamentária sinaliza um superávit orçamentário para o exercício em curso? Fez o Tribunal de Contas recomendação para que tal acontecesse?
- Observar se as operações de créditos se sujeitam aos limites e condições das Resoluções 40 e 43/2001, do Senado (art. 59, II, da LRF).
- Verificar se os empréstimos e financiamentos vêm sendo pagos tal qual previsto nos respectivos contratos (art. 59, II, da LRF).
- Analisar se as despesas dos oito últimos meses do mandato têm cobertura financeira, o que evita, relativamente a esse período, transferência de descobertos Restos a Pagar para o próximo gestor político (art. 59, II, da LRF).
- Verificar se está sendo providenciada a recondução da despesa de pessoal e da dívida consolidada a seus limites fiscais (art. 59, III e IV, e 66 da LRF).
- Comprovar se os recursos da alienação de ativos estão sendo despendidos em gastos de capital e, não, em despesas correntes; isso, a menos que lei municipal permita destinação para o regime próprio de aposentadorias e pensões dos servidores (art. 59, VI, cc art. 44, ambos da LRF).
- Constatar se está sendo satisfeito o limite para gastos totais das Câmaras Municipais (art. 59, VI, da LRF). À vista do porte populacional do Município, as Edilidades podem gastar entre 3,5% e 7,0% da receita tributária ampliada do ano anterior (art. 29-A da Constituição).
- Verificar a fidelidade funcional dos responsáveis por bens e valores públicos (art. 75, II da Lei 4.320, de 1964). Exemplo: a comprovação do adiantamento foi regularmente feita pelo servidor responsável? Não foram desviados dinheiros da Tesouraria ou bens de consumo do Almoxarifado?
Verifica-se, portanto, que o controle interno é realizado no âmbito da própria Administração ou por órgão do mesmo Poder que editou o ato que está sendo controlado. Exerce uma função crucial na gestão pública, atuando como guia e fiscalizador das ações dos administradores. Seu propósito fundamental é garantir a eficiente arrecadação de receitas e a correta aplicação dos recursos públicos, constituindo-se, assim, um instrumento eficaz na prevenção de erros e fraudes.
Para tanto, deve fundamentar-se em um sistema de informação e avaliação robusto, capaz de inibir irregularidades e alcançar os objetivos de proteção dos bens públicos, além de avaliar o desempenho governamental em relação ao cumprimento de metas e à execução orçamentária.
Para ser efetivo, o Controle Interno deve ser um processo contínuo, eficaz e consistente, assegurando um sistema de informação gerencial que atenda às demandas da gestão pública. Isso permite identificar a necessidade de ajustes de rumo para evitar o desperdício ou o desvio de recursos públicos e para corrigir irregularidades.
O objetivo primordial do Controle Interno em uma entidade pública é a salvaguarda do patrimônio, o que se configura como um resultado direto de sua atuação. Ele também serve como um importante suporte à gestão, dada a relevância de um Sistema de Controle Interno que evidencie indicadores de excelência na implementação das políticas públicas.