Princípio da Irretroatividade
O princípio da irretroatividade da legislação tributária é uma garantia essencial para a segurança jurídica do contribuinte. Em essência, ele assegura que o contribuinte saiba exatamente quais tributos deve pagar, como deve pagá-los e com base em qual legislação vigente no momento da ocorrência do fato gerador.
A previsão legal deste princípio está disposta no art. 150, III, a, da Constituição Federal, que estabelece que não se pode cobrar tributos relacionados a fatos geradores ocorridos antes do início da vigência da lei que os instituiu. Ou seja, o fato gerador de um tributo será regido pela lei vigente no momento de sua ocorrência.
Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: [...]
III - cobrar tributos: [...]
b) no mesmo exercício financeiro em que haja sido publicada a lei que os instituiu ou aumentou;
Fato gerador é o evento ou situação descrito pela lei que dá origem à obrigação tributária, ou seja, é o acontecimento que torna exigível o pagamento de um tributo. É o vínculo jurídico que conecta o contribuinte à necessidade de recolher o imposto, taxa ou contribuição correspondente.
Essa diretriz constitucional é complementada pelo art. 105 do Código Tributário Nacional, segundo o qual a legislação tributária aplica-se de forma imediata apenas a fatos geradores futuros, não podendo ser aplicada a fatos geradores pretéritos ou pendentes, salvo em situações específicas.
Art. 105. A legislação tributária aplica-se imediatamente aos fatos geradores futuros e aos pendentes, assim entendidos aquêles cuja ocorrência tenha tido início mas não esteja completa nos têrmos do artigo 116.
Exceções ao princípio da irretroatividade
Embora a regra geral seja a irretroatividade, o art. 106 do CTN prevê situações excepcionais em que a legislação tributária pode retroagir. Essas exceções ocorrem apenas em casos específicos, como segue:
Art. 106. A lei aplica-se a ato ou fato pretérito:
I - em qualquer caso, quando seja expressamente interpretativa, excluída a aplicação de penalidade à infração dos dispositivos interpretados;
II - tratando-se de ato não definitivamente julgado:
a) quando deixe de defini-lo como infração;
b) quando deixe de tratá-lo como contrário a qualquer exigência de ação ou omissão, desde que não tenha sido fraudulento e não tenha implicado em falta de pagamento de tributo;
c) quando lhe comine penalidade menos severa que a prevista na lei vigente ao tempo da sua prática.
Leis meramente interpretativas
As leis interpretativas, que têm por objetivo apenas esclarecer o alcance de legislações anteriores, podem ser aplicadas retroativamente aos fatos geradores ocorridos anteriormente, desde que não impliquem a aplicação de penalidades.
Um exemplo notável é a lei complementar 118/2005, que buscava interpretar a questão da decadência tributária, ampliando o prazo de cobrança.
Contudo, o Poder Judiciário entendeu que essa lei modificava a tributação, e não apenas a interpretava, retirando, assim, seu caráter interpretativo e aplicando o princípio da irretroatividade.
Leis mais benéficas ao contribuinte
Outra exceção ocorre quando uma legislação posterior estabelece regras mais favoráveis ao contribuinte em relação a penalidades tributárias.
É importante destacar que, diferentemente do direito penal, no direito tributário, a retroatividade benéfica não se aplica ao tributo em si, mas exclusivamente às penalidades.
Por exemplo: se a alíquota de um tributo era 3% no momento do fato gerador e uma lei posterior reduziu a alíquota para 2%, essa nova alíquota não será aplicada retroativamente. No entanto, se a penalidade de 20% sobre determinado ato for reduzida para 10%, a nova regra poderá retroagir para beneficiar o contribuinte.
A retroatividade também é permitida quando:
- Uma nova lei deixa de considerar determinada conduta como infração tributária.
- A penalidade é reduzida, desde que não haja fraude e que o pagamento tenha sido realizado.
Aplicação da lei no lançamento tributário
O art. 144 do CTN reforça o princípio da irretroatividade ao determinar que o lançamento tributário deve reportar-se à data de ocorrência do fato gerador. Assim, mesmo que o lançamento ocorra posteriormente, ele considerará a legislação vigente no momento da ocorrência do fato gerador, e não a legislação em vigor na data do lançamento.
Art. 144. O lançamento reporta-se à data da ocorrência do fato gerador da obrigação e rege-se pela lei então vigente, ainda que posteriormente modificada ou revogada.
Por exemplo, um fato gerador ocorrido em 21 de novembro de 2024 será regido pela lei vigente nessa data, ainda que o lançamento do tributo seja efetuado somente em 2026.