Introdução e Metodologia

O que é Direito Penal Sexual?

No século XIII, foi apresentada pela Igreja Católica a lista final dos setes pecados capitais, conceito muito difundido ainda hoje. Trata-se de sete vícios da condição humana, cujos conceitos foram usados para ensinar os fiéis a compreender e controlar seus instintos básicos, e com isso se aproximar de Deus. Dentre estes pecados está a luxúria, que consiste em se deixar dominar pelo desejo passional por prazeres sexuais e materiais. Note que há séculos a humanidade tenta regular a sexualidade e lascívia extremas, o que persiste ainda hoje no sistema penal brasileiro.

Nesse sentido, o ramo do Direito Penal Sexual é aquele que regulamenta a vida e o comportamento sexual dos indivíduos dentro dos limites do direito e do costume. O objetivo seria, portanto, impedir abusos causados pela luxúria e pela excitação, como a ofensa à honra sexual alheia.

Proteção aos Costumes - Direito Penal e o Pecado

Historicamente, o Direito Penal Sexual surgiu de forma muito conectada com a tipificação do pecado e a delicta carnis, ou seja, com delitos relacionados aos prazeres carnais como o adultério e a prostituição.

Apesar de existir, assim, uma relação muito próxima com a moral, nem toda conduta sexual é regulada, pois existem condutas sexuais que podem não ser morais mas que não constituem crimes. Um exemplo disso seria o fetichismo, a prática sexual com um objeto como uma boneca. Aqui, por mais que diferentes pessoas possam achar tal conduta certa ou errada, não existe nenhum tipo de impedimento legal. 

Porém, nem tudo pode ser aceito como um fetiche que se encontra apenas no campo moral e é juridicamente irrelevante. Por isso, é importante estabelecer limites para a regulação do DPS, partindo do conceito de mínimo ético de Jellinek, segundo o qual o Direito seria um instrumento para o cumprimento de preceitos morais básicos, que permitiria a estabilidade social e a sobrevivência da sociedade. Outra linha de raciocínio relevante para a delimitação é a de Hans Welzel, para o qual a proteção de bens jurídicos é efetivada por meio da tutela de valores ético-sociais elementares.

Regulação Moral: Lei de Contravenções Penais

Pensando em como a regulação da moral se aplica na lei penal brasileira, é possível citar o art. 65 da Lei de Contravenções Penais sobre o ato de molestar ou perturbar alguém, que traz o motivo sexual como algo reprovável.

Proteção à Pessoa - A Honra

Ainda hoje, boa parte dos crimes sexuais são crimes que ocorrem contra a pessoa, e isso decorre diretamente das raízes históricas do Direito Penal Sexual, tendo em vista que, no direito medieval, ele se dá no âmbito da proteção do indivíduo como tutela da honra. Nesse sentido, historicamente, a resposta para um crime contra a honra é a resistência ao ato sexual, como uma violência reversa. O Código Penal brasileiro vigente determina que, por exemplo, para se configurar crime de estupro, deve haver indícios ou prova de violência ou coação.

Apesar das convergências com a regulação da vida sexual na época medieval, que era pautada na proteção da honra, o Direito moderno traz essa tutela tendo como foco a autonomia da vítima. A premissa hoje é a liberdade sexual negativa, isto é, a ideia de que ninguém é obrigado a tolerar um ato que não queira. Tudo isso, tendo em vista o conceito de Feinberg de “padrão de evitabilidade razoável”, para que não sejam tipificados ou punidos meros dissabores morais.

Conceitos chaves

Ato sexual tem duas esferas: subjetiva e objetiva.

Vontade que é a construção racional das expectativas.

Significado de “não” e “sim”.  Discussões doutrinárias atuais apontam que, de fato, não é não, mas o sim nem sempre significa sim, sendo importante fazer uma análise aprofundada da situação que o envolve.

Pontos Controvertidos

  • O Direito Penal Sexual não regula somente atos direcionados às genitálias, sendo possível considerar um ato como libidinoso mesmo tendo como objeto outras partes do corpo como pernas, pés, boca e seios.
  • Além disso, atos neutros não se tornam sexuais pela percepção do agressor. Por exemplo, uma massagem nos pés pode não significar nada demais para quem o faz, mas a vítima que a recebe pode identificar certo cunho sexual. Essa massagem, por si só, não é considerada um ato sexual.
  • A tipicidade de um ato depende de uma ofensa a algum bem jurídico, uma vez que no Direito Penal Sexual, assim como o Direito Penal, deve haver uma violação nesse sentido para ser aplicável. Isso faz com que seja necessário existir um padrão mínimo de ofensividade.

Problemas específicos do Direito Penal Sexual Brasileiro

  • Problema de proporcionalidade: No Brasil, os atos com contato e sem contato estão inclusos em uma mesma categoria, de modo que são analisados com uma mesma régua um beijo e uma relação sexual.
  • Atentado violento ao pudor vs estupro: A graduação dos atos sexuais para fins de imputação penal não tem nada a ver com a discussão do atentado violento ao pudor, que seria uma versão mais leve do estupro. Ocorre que isso é uma reminiscência da legislação anterior, que tipificava o atentado violento ao pudor como um ato contra homens ou mulheres, enquanto o estupro era tipo como um ato apenas contra mulheres.
  • Ato obsceno é diferente de ato sexual: Aqui, vale destacar que o ato contra indivíduo menor de 14 anos é sempre considerado como ato sexual.
  Ato Obsceno Ato Sexual
Tipo de Ofensa Meramente Moral Ato contra a autonomia sexual
Existência de uma vítima Independe da vítima Depende da vítima
Contato Sem Com

Bem Jurídico e Extensão da Proteção

O bem jurídico tutelado pelo Direito Penal Sexual é a moral e a liberdade sexual. Esta última é cancelada para os menores de 14 anos, mitigada para os maiores de 14 e menores de 18 anos e livre para os maiores de 18 anos. Ter liberdade sexual significa a liberdade de consentir com a prática de atos sexuais sem intervenção do Estado, exceto em casos graves como coação e violência.

Apesar da terminologia utilizada pelo Título VI do Código “Dignidade sexual”, a pessoa vítima de qualquer um dos crimes previstos neste rol não se torna indigna depois de sofrer o abuso, de modo que hoje se considera o uso do termo no título impróprio.
 

 

 

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