Defeitos dos Negócios Jurídicos: Erro

Erro

Nesta aula iremos tratar daquilo que a doutrina e a lei chamam de defeitos do negócio jurídico. Mas antes, façamos breve recapitulação: estudamos, em algumas aulas, que um dos elementos que atribuem existência a um negócio jurídico é a declaração de vontade

Estudamos também que, para que este negócio seja válido, é necessário que a vontade seja manifestada de maneira livre. Acontece que, não raras vezes, pode ocorrer de a vontade vir a ser declarada de maneira distorcida ou deficiente em desfavor do próprio declarante, de uma terceira pessoa ou em prejuízo da ordem pública.

A partir deste encontro, vamos estudar cada um dos defeitos do negócio jurídico, cuja previsão legal torna o negócio anulável (passível de anulação). Como bem aponta o Professor Carlos Roberto Gonçalves, com exceção da fraude contra credores, que é considerada um vício social, os outros defeitos, como o erro, dolo, coação, estado de perigo e lesão são todos chamados de vícios do consentimento.

E os vícios do consentimento são assim chamados porque implicam uma manifestação da vontade que não corresponde com o íntimo, com o verdadeiro querer do agente. Vamos começar a estudar, então, o primeiro dos defeitos do negócio jurídico, o que chamamos de erro, ou ignorância.

Nas palavras de Flávio Tartuce, erro ou ignorância é o engano fático. Uma falsa noção em relação à pessoa, ao objeto do negócio ou a um direito, o que acomete uma das partes do negócio jurídico.

Orlando Gomes complementa o conceito que acabamos de estudar afirmando que, tendo uma noção sobre o fato ou sobre um preceito uma noção inexata ou incompleta, o agente emite sua vontade de modo diverso que manifestaria se dele tivesse conhecimento exato ou completo. Ele resume: crer verdadeiro o que é falso, ou falso o que é verdadeiro.

Para que o erro seja capaz de anular o negócio jurídico, ele tem que ser substancial, partindo-se do princípio, segundo o Professor Renan Lotufo, de que, sem que tivesse sido cometido erro, o negócio não teria se realizado. Ou, se o agente conhecesse a verdade, não manifestaria vontade de concluir o negócio jurídico.

Em outras palavras, o erro não pode ser acidental. Ou seja, ele não pode estar relacionado a características secundárias do objeto ou da pessoa, de modo que, ainda que conhecida a realidade o negócio, ele ainda seria realizado.

O erro substancial, que é o que nos interessa, já que pode anular o negócio jurídico, pode dar-se:

  • Sobre a natureza do negócio, chamado de error in negotio, que se dá com relação à categoria jurídica. Por exemplo, uma pessoa que empresta algo a alguém, e esse alguém entende que ocorreu uma doação.
  • Sobre o objeto principal da declaração, chamado de error in corpore. Este erro se dá quando a manifestação do agente se dá com relação ao objeto diverso daquele que ele tinha imaginado. Por exemplo, a pessoa que adquire uma obra de arte de um aprendiz quando imaginava que essa obra fosse de um célebre pintor.
  • Sobre as qualidades essenciais do objeto principal, chamado de error in qualitate ou error in substantia. Neste caso, o negócio é celebrado justamente porque se supunha que existia uma determinada qualidade do bem. Um exemplo importante para esta compreensão é citado por Silvio Rodrigues: uma pessoa que compra um relógio dourado apenas folheado a ouro quando se considerava que se tratava de ouro maciço.
  • Sobre à qualidade da pessoa a quem se refere a declaração de vontade, é o chamado error in personae, tendo este aspecto influído de maneira relevante para a celebração do negócio. Por exemplo, uma doação feita a quem teria salvado a vida do doador, e depois descobriu-se que não era essa pessoa.
  • Segundo Caio Mário, há erro substancial que dá-se quando um agente emite a declaração de vontade no falso pressuposto de que se procede segundo preceitos legais. Vejamos um exemplo dado pelo Professor Carlos Roberto Gonçalves: uma pessoa que contrata a importação de determinada mercadoria, ignorando que existia uma lei que proibia esta importação, e, como essa ignorância foi a causa determinante do ato, ela pode ser alegada para anular o contrato.
  • Por fim, pode dar-se erro quando da existência de falso motivo (artigo 140 do Código Civil de 2002), o qual só vicia a declaração de vontade quando é expresso como razão determinante. O fato é que, via de regra, o direito não cuida do aspecto psicológico, ou seja, dos motivos das razões subjetivas que levaram alguém a celebrar um contrato, um negócio jurídico. Mas se este motivo foi a razão determinante para a celebração do negócio e o agente foi prejudicado por uma falsa representação da realidade, transmitida pelo outro, o motivo, então, passa a ser relevante ao direito. Olhe só o exemplo que dá Silvio Rodrigues: se a aquisição de um estabelecimento comercial teve por motivo determinante a perspectiva de que havia uma boa e numerosa freguesia, garantia e apontada pelo vendedor no próprio contrato, tem-se aí o pressuposto ou razão determinante em negócio. Assim é porque, não se concretizando aquela perspectiva, o negócio é anulável por erro. Importante destacar que os motivos devem ter sido apontado de maneira expressa. Ou seja, neste exemplo que acabamos de ver, o dono do estabelecimento indicou expressamente a perspectiva da boa freguesia e o comprador foi motivado justamente por essa causa.
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