Publicado em: 05/02/2025 por Guilherme Carvalho - Equipe


foto 1: Rubens Paiva (foto: reprodução arquivo pessoal/ divulgação Ainda Estou Aqui
Rubens Paiva (foto: reprodução arquivo pessoal/ divulgação Ainda Estou Aqui

Fala trilheiros! No post de hoje trazemos uma sugestão feita pela PGR ao STF sobre o caso que envolve os acusados de envolvimento no desaparecimento e morte do ex-deputado Rubens Paiva. Além disso, vamos explicar alguns conceitos e contextualizar o porquê da discussão sobre a Lei de Anistia estar em alta nos últimos anos. 

PGR, STF e Rubens Paiva 

Na última terça-feira (28), a Procuradoria-Geral da República (PGR) defendeu que o Supremo Tribunal Federal (STF) analise a legalidade da aplicação da Lei da Anistia no caso dos cinco militares acusados pela morte do ex-deputado federal Rubens Paiva, ocorrida durante a ditadura militar no Brasil.

O pedido da Procuradoria objetiva reverter a decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) que suspendeu a ação penal contra os militares com base na Lei da Anistia. Em 2010, o STF já havia validado a norma em razão da qual o STJ decidiu interromper o andamento do processo.

Ainda de acordo com a PGR, Rubens Paim Sampaio, Jacy Ochsendorf, Raymundo Ronaldo Campos, José Antônio Nogueira Belham e Jurandyr Ochsendorf são apontados como envolvidos na morte de Rubens Paiva, ocorrida em janeiro de 1971 no Destacamento de Operações de Informações do Exército, no Rio de Janeiro (RJ).

No documento enviado ao Supremo, a subprocuradora Maria Caetana Cintra Santos defendeu que o entendimento internacional sobre o tema reconhece que a Lei da Anistia brasileira não pode ser aplicada em casos de graves violações de direitos humanos, como o que envolve a ditadura militar. 

A subprocuradora cita em sua argumentação o caso da Guerrilha do Araguaia, julgado em 2010 pela Corte Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), que determinou a inaplicabilidade da Lei da Anistia. "O crime de ocultação de cadáver, imputado aos denunciados na ação penal originária, não seria suscetível da anistia instituída na lei 6.683/1979, tendo em vista seu caráter de permanência porquanto nunca se revelou o paradeiro do corpo, impedindo, assim, a consumação do lapso temporal prescricional e o consequente trancamento da ação penal", apontou.

A defesa dos militares acusados de participarem do desaparecimento e da ocultação do corpo de Rubens Paiva, trabalha para tentar arquivar a ação penal, alegando que a Lei da Anistia contempla os crimes cometidos durante a ditadura militar, o que impede a aplicação de qualquer punição.

Lei da Anistia: o que é? 

foto 2: Ato pela anistia na Praça da Sé, em São Paulo (foto: Ennco Beanns/Arquivo Público do Estado de São Paulo)
Ato pela anistia na Praça da Sé, em São Paulo (foto: Ennco Beanns/Arquivo Público do Estado de São Paulo)

A Lei decretada em 28 de agosto de 1979 ainda durante a Ditadura Militar, anistiou, isto é, perdoou todos aqueles que haviam cometido crimes políticos no período. Prevista no Código Penal, a anistia é o "perdão" dado a um ou mais indivíduos que respondem criminalmente na Justiça. Quando concedida, extingue-se a punibilidade - ou seja, o Estado perde o direito de punir o condenado pelo ato praticado.
O mecanismo é semelhante ao indulto e à graça, que são formas de extinção da punibilidade, conforme o art. 107, II, do Código Penal, que prevê:

Art. 107 - Extingue-se a punibilidade: (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)
I - pela morte do agente;
II - pela anistia, graça ou indulto;
III - pela retroatividade de lei que não mais considera o fato como criminoso;
IV - pela prescrição, decadência ou perempção;
V - pela renúncia do direito de queixa ou pelo perdão aceito, nos crimes de ação privada;

Mas há diferenças, enquanto a graça e o indulto são benefícios concedidos pelo presidente da República através de decreto, a anistia é uma atribuição do Congresso Nacional. Ou seja, só é concedida mediante aprovação de projeto de lei nas duas Casas Legislativas, Câmara dos Deputados e Senado Federal.

Historicamente a anistia é utilizada para perdoar crimes de natureza política, não se enquadrando em qualquer tipo de crime. Segundo a Constituição Federal, o dispositivo não pode ser aplicado em benefício de quem cometeu crimes de natureza hedionda e nem para crimes inafiançáveis.

Anistia no Brasil: debates atuais

Você percebeu que nos últimos tempos muito tem se falado sobre anistia? A discussão aparece principalmente nos ambientes digitais, mas se intensifica fora deles nos debates políticos. Te explico agora algumas das motivações:

Essa discussão sobre a definição de anistia e sua aplicabilidade em diferentes casos judiciais se intensificaram no Brasil nos últimos anos, não apenas após o sucesso nos cinemas de “Ainda Estou Aqui” que retrata a história de Eunice Paiva, esposa do ex-deputado Rubens Paiva, mas desde a repercussão política dos atos de 8 de janeiro de 2023 na Praça dos Três Poderes em Brasília (DF). 

Em 2025, dois anos após os ataques criminosos, o Supremo Tribunal Federal já condenou 371 pessoas das mais de duas mil investigadas por suspeita de envolvimento direto nos atentados. A maioria dos condenados foram enquadrados nos crimes de tentativa de golpe de Estado, associação criminosa armada, abolição violenta do Estado Democrático de Direito, dano qualificado e deterioração do patrimônio tombado.

Desde a data dos fatos, discute-se a aplicabilidade da Lei de Anistia aos acusados de envolvimento nos atos. No Senado, o Projeto de Lei 5.064/23 proposto em outubro de 2023 pelo senador Hamilton Mourão, que foi vice-presidente da República no governo Bolsonaro, propõe a concessão de anistia aos acusados e condenados pelos crimes definidos nos artigos 359-L e 359-M do Código Penal, "em razão das manifestações ocorridas em Brasília, na Praça dos Três Poderes, no dia 8 de janeiro de 2023".

O texto proposto pelo ex-vice presidente Mourão não abrange as acusações e as condenações pelos crimes de dano qualificado, deterioração de patrimônio tombado e associação criminosa. Acontece que a Constituição não veta a anistia a estes crimes, mas impede o perdão pelo crime de terrorismo. 

O ministro Alexandre de Moraes, ao decidir sobre a competência do STF para as audiências de custódia dos participantes dos atos antidemocráticos, apontou os possíveis crimes cometidos, citando atos terroristas, previstos nos artigos 2º, 3º, 5º e 6º da lei 13.260/16, na qual prevê:

[...]
Art. 2º O terrorismo consiste na prática por um ou mais indivíduos dos atos previstos neste artigo, por razões de xenofobia, discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia e religião, quando cometidos com a finalidade de provocar terror social ou generalizado, expondo a perigo pessoa, patrimônio, a paz pública ou a incolumidade pública.
Art. 3º Promover, constituir, integrar ou prestar auxílio, pessoalmente ou por interposta pessoa, a organização terrorista
Art. 5º Realizar atos preparatórios de terrorismo com o propósito inequívoco de consumar tal delito

Em várias de suas decisões o ministro usou os termos "ato terrorista" e "criminosos terroristas", como quando determinou a prisão do ex-ministro da Justiça Anderson Torres. Ele disse que "a democracia brasileira não será abalada, muito menos destruída, por criminosos terroristas" e que o "QG do Exército (...) estava infestado de terroristas".

Os novos presidentes do Congresso, eleitos no último sábado (1), afirmam que podem levar para discussão a anistia dos envolvidos nos atos de 8 de janeiro, mas ressaltam que o tema divide o Legislativo. Enquanto Hugo Motta (Republicanos-PB), eleito na Câmara, promete uma análise "imparcial" da proposta, Davi Alcolumbre (União Brasil-AP), que retorna ao comando do Senado, afirma querer uma discussão "pacífica" sobre o tema.

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