Publicado em: 23/03/2020 por Mariana Cunha


Como ficam as relações trabalhistas em tempos de pandemia? 

Diante de tudo isso que estamos vivendo, muita coisa teve que ser adaptada: nossa vida, nossas relações sociais, nossa rotina, nossos hábitos e, também, nossas relações de trabalho. Diante da obrigação de garantir a saúde e a segurança dos seus empregados (art. 157, da CLT), o empregador deve adotar medidas excepcionais. 

Nesse sentido, a Lei nº 13.979, de 6 de fevereiro de 2020, trouxe algumas medidas de enfrentamento à pandemia do Coronavírus, e dentre elas, o §3º do artigo 3º da legislação prevê que “será considerado falta justificada ao serviço público ou à atividade laboral privada o período de ausência decorrente das medidas previstas neste artigo”.  Isso significa que esse período de ausência se trata de hipótese de interrupção do contrato de trabalho. Então, o empregado continuará recebendo seu salário regularmente e seu afastamento será computado para todos os fins (férias, 13º salário etc.)

Lembrando que lei traz diferentes situações que podem justificar essa ausência do empregado: o isolamento, quando há a certeza da contaminação pelo vírus; a quarentena, quando há fundada suspeita da contaminação; e a realização de exames compulsórios

Desse modo, com o objetivo de evitar aglomerações desnecessárias de pessoas, recomenda-se a implementação temporária de teletrabalho, que se trata da prestação de serviços fora das dependências da empresa com a utilização de meios telemáticos. Nada mais é do que o trabalho remoto, o famoso home office. Embora a CLT estabeleça requisitos específicos para esse tipo de contrato de trabalho, tendo em vista a situação de emergência que estamos vivendo em razão da COVID-19, a adoção do trabalho remoto pode ser feita sem muitas formalidades. 

A antecipação de férias e a concessão de férias coletivas também têm sido medidas adotadas, principalmente para os estabelecimentos de ensino, devido a suspensão das aulas em diversas regiões do país. 

Pode ou não pode suspender?

No dia 22/03/2020, o Presidente Bolsonaro editou uma MP (MP n. 924/2020), que vem como uma tentativa de evitar demissões em massa. Essa medida entra em vigor imediatamente, mas precisa ser aprovada pelo Congresso Nacional em até 120 dias para não perder a validade. 

O ponto mais importante da MP era a permissão da suspensão do contrato de trabalho e do pagamento de salário por até 4 meses durante o período de calamidade pública

Segundo o texto do art. 18 da MP, durante esse período de até 4 meses de suspensão do contrato de trabalho, o empregado não trabalharia e o empregador não pagaria seu salário. Entretanto, o empregador deveria garantir a participação do empregado em curso ou programa de qualificação profissional não presencial - ou seja, online - oferecido pelo próprio empregador ou algum terceiro. Além disso, a empresa também seria obrigada a manter os benefícios do trabalhador, como plano de saúde, por exemplo.

De acordo com a MP, a suspensão dos contratos de trabalho não dependeria de acordo ou convenção coletiva, mas poderia ser feita de forma individual ou coletiva, sendo registrada em carteira de trabalho física ou eletrônica. Os acordos individuais entre o empregador e os trabalhadores estariam, portanto, acima de acordos coletivos e da lei trabalhista durante o período de validade da MP para que fosse garantida a manutenção do vínculo empregatício. 

Entretanto, o presidente Jair Bolsonaro anunciou hoje (dia 23/03/2020) no Twitter que ordenou a retirada do artigo 18, que previa essa suspensão de quatro meses de salário do trabalhador durante a pandemia de coronavírus. 

Teletrabalho

Em relação ao teletrabalho, a MP estabelece que o empregador poderá "a seu critério, alterar o regime de trabalho presencial para o teletrabalho, o trabalho remoto ou outro tipo de trabalho a distância e determinar o retorno ao regime de trabalho presencial". E isso se dará "independentemente da existência de acordos individuais ou coletivos, dispensado o registro prévio da alteração no contrato individual de trabalho".

Férias e Banco de Horas

Sobre a antecipação de férias individuais, a MP diz que o empregador informará ao empregado com antecedência de, no mínimo, 48 horas, por escrito ou por meio eletrônico, com a indicação do período a ser gozado. Cabe acrescentar que, segundo a MP, os trabalhadores que pertençam ao grupo de risco do coronavírus terão prioridade para o gozo de férias.

A MP diz também que os empregadores poderão antecipar o gozo de feriados não religiosos federais, estaduais, distritais e municipais, desde que sejam notificados com ao menos 48h de antecedência.

Com relação ao uso de banco de horas, a MP permitiu a interrupção das atividades pelo empregador e a constituição de regime especial de compensação de jornada, em favor do empregador ou do empregado. Isso significa que pode haver a interrupção da jornada de trabalho durante o período de calamidade pública para que as horas não trabalhadas sejam compensadas no futuro, no prazo de até 18 meses, contado da data de encerramento do estado de calamidade pública.

Outros Tópicos

A MP também suspendeu, durante o estado de calamidade, a obrigatoriedade de realização dos exames médicos ocupacionais, clínicos e complementares, exceto dos exames demissionais.

E, também, determinou a suspensão da exigência de recolhimento do FGTS pelos empregadores, referente a março, abril e maio de 2020, com vencimento em abril, maio e junho de 2020, respectivamente. A empresa tem essa possibilidade independentemente do número de empregados, do regime de tributação, da natureza jurídica, do ramo de atividade econômica e da adesão prévia.

Em resumo, além da suspensão do contrato de trabalho e do salário, a MP estabelece, como formas de combater os efeitos do novo coronavírus:

  • teletrabalho (trabalho à distância, como home office)
  • suspensão de férias para trabalhadores da área de saúde e de serviços considerados essenciais
  • antecipação de férias individuais, com aviso ao trabalhador até 48 horas antes
  • concessão de férias coletivas
  • aproveitamento e antecipação de feriados
  • banco de horas
  • suspensão de exigências administrativas em segurança e saúde no trabalho
  • direcionamento do trabalhador para qualificação
  • adiamento do recolhimento do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS)