Funções e Poderes

A aplicação da teoria de Montesquieu nos Estados de Direito

A teoria da Separação dos Poderes antecipa que os poderes são autônomos entre si como um pressuposto de legitimidade para o Estado Democrático de Direito. O conceito de que o poder deve ser comedido por si implica que as ações dos entes  no campo público sejam conectadas e coesas, dividindo-se suas competências para garantir a interdependência dos agentes e instrumentalizar gestão estatal compartilhada e harmônica. Assim, os atos dos poderes Executivo, Legislativo e Judiciário devem ser autônomos e atuar de maneira a se complementar.

Atualmente, grande parte dos ordenamentos jurídicos mundiais adotam a Tripartição de Poderes de forma um pouco diversa da teorizada por Montesquieu. É inerente à  teoria que as ações desempenhadas pelo Executivo, Legislativo e Judiciário sejam autônomas e complementares. O empecilho à legítima atuação de qualquer deles implica abuso de poder institucionalEntretanto, a atual conjuntura brasileira delineia uma outra realidade. O uso de Medidas Provisórias pelo Executivo, a instauração de Comissões Parlamentares de Inquérito pelo Legislativo e a utilização de Ações Diretas de Inconstitucionalidade por Omissão (ADIN), dentre outros exercícios de funções atípicas, pelo Judiciário, assinala que as delimitações entre as esferas de poder dos entes estatais destoam da ideia arquitetada pelo filósofo.

Funções típicas e atípicas dos três poderes

A divisão dos poderes no Brasil é realizada pela atribuição das funções governamentais (legislativa, executiva e jurisdicional) a órgãos específicos O Poder Executivo tem a função executiva ou administrativa. O poder Legislativo, por sua vez, desempenha a função Legislativa; o Poder Judiciário, desempenha a atividade jurisdicional do Estado. Cada um destes poderes tem suas funções típicas e atípicas; a que é exercida com preponderância é a típica e a função exercida secundariamente é a atípica.

Uma função típica de um órgão é atípica dos outros. Por exemplo, o Poder Legislativo tem a principal função de organizar e atualizar o ordenamento jurídico do Estado, sendo esta a sua função típica, preponderante. Entretanto, ele ainda administra seus órgãos, momento em que exerce uma atividade típica do Executivo, podendo, também, julgar seus membros, exercendo atividade típica do Judiciário. Da mesma forma, a edição de medidas provisórias pelo Presidente da República é uma função atípica do Poder Executivo.

Órgão

Função Típica

Função Atípica

Legislativo

Legislação;

Fiscalização contábil, financeira, orçamentária e patrimonial do executivo.

Natureza executiva: dispõe sobre sua organização, provendo cargos, concedendo férias, licenças a servidores etc;

Natureza jurisdicional: o Senado julga o presidente da república nos crimes de responsabilidade (art. 51, 1, CF).

Executivo

Prática de atos de chefia de estado, chefia de governo e atos de administração.

Natureza legislativa: o Presidente da República, por exemplo, adota medida provisória, com força de lei (Art. 62, CF);

Natureza jurisdicional: o Executivo julga, apreciando defesas e recursos administrativos.

Judiciário

Julgar (função jurisdicional), dizendo o direito no caso concreto e dirimindo os conflitos quando da aplicação da lei.

Natureza legislativa: edita regime interno de seus tribunais (Art. 96, I, “a”, CF);

Natureza executiva: administra, por exemplo, ao conceder licenças e férias aos magistrados e serventuários (Art. 96, I, “f”, CF).

O poder e sua manifestação

O poder do qual tratamos é, em essência, o poder político. Nas democracias consolidadas é exercido pela vontade do povo. Sua imposição ao corpo social acontece por meio de sua legitimação, que é justamente a soberania da vontade popular. Institucionalmente, é estabelecido por meio de estruturas organizadas, de forma a possibilitar o exercício do controle geral. As entidades, dotadas de certa autonomia, possuem regras pré-estabelecidas para que seja exercido o poder político de acordo com a vontade popular que o legitima.

O conceito de poder e o art.2º da Constituição Federal

O art. 2º do texto constitucional, em seu inteiro teor, afirma:

Art.2º. São Poderes da União, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário.

Estes poderes diferenciam-se do poder político, pois são a institucionalização deste. O poder público é a denominação dada ao conjunto de órgãos e entidades competentes a realizar as atividades estatais. São o Legislativo, o Executivo e o Judiciário.

O Poder Executivo é exercido em três esferas no Estado brasileiro: a esfera federal, a estadual e a municipal, além do Distrito Federal, que é um caso híbrido. Da mesma forma, é distribuído o Poder Legislativo, atuando nestas mesmas esferas. O Poder Judiciário, entretanto, por critérios de conveniência, é exercido apenas nos âmbitos federal, estadual e no DF. Municípios não possuem poder judiciário próprio.

Princípio da Indelegabilidade de Atribuições

Um órgão só poderá exercer atribuições de outro, ou da natureza de outro, quando houver previsão (como função atípica) e, diretamente, quando houver delegação por parte do constituinte originário.

 Art. 68. As leis delegadas serão elaboradas pelo Presidente da República, que deverá solicitar a delegação ao Congresso Nacional.

§1º Não serão objeto de delegação os atos de competência exclusiva do Congresso Nacional, os de competência privativa da Câmara dos Deputados ou do Senado Federal, a matéria reservada à lei complementar, nem a legislação sobre:

I - organização do Poder Judiciário e do Ministério Público, a carreira e a garantia de seus membros;

II - nacionalidade, cidadania, direitos individuais, políticos e eleitorais;

III - planos plurianuais, diretrizes orçamentárias e orçamentos.

§2º A delegação ao Presidente da República terá a forma de resolução do Congresso Nacional, que especificará seu conteúdo e os termos de seu exercício.

§3º Se a resolução determinar a apreciação do projeto pelo Congresso Nacional, este a fará em votação única, vedada qualquer emenda.

A separação de poderes e sua inalterabilidade na Constituição Federal

A separação de poderes na Constituição Federal constitui uma das cláusulas pétreas do texto constitucional. As cláusulas pétreas são disposições constitucionais que não podem ser alteradas. Estes dispositivos instituem limitações materiais ao poder de reforma da Constituição. Não podem atingir os aspectos por eles enumerados nem mesmo Propostas de Emenda à Constituição (PEC). As cláusulas pétreas inseridas na Constituição do Brasil de 1988 estão dispostas em seu art.60, §4º. São elas: a forma federativa de Estado; o voto direto, secreto, universal e periódico; a separação dos Poderes; e os direitos e garantias individuais.

Art. 60. A Constituição poderá ser emendada mediante proposta: [...]

§4º Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir:

I - a forma federativa de Estado;

II - o voto direto, secreto, universal e periódico;

III - a separação dos Poderes;

IV - os direitos e garantias individuais.

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