Estrutura da CF/88 e Preâmbulo Constitucional

A Constituição Federal de 1988 é composta pelo Preâmbulo, 9 Títulos e pelo Ato das Disposições Transitórias (ADCT). Cabe notar que, em sua estrutura, a Carta Maior do ordenamento jurídico brasileiro adota seu título X como o ADCT:

  • PREÂMBULO

  • TÍTULO I -  Dos Princípios Fundamentais (art. 1° ao 4°)
  • TÍTULO II -  Dos Direitos e Garantias Fundamentais (art. 5° ao 17)
  • TÍTULO III -  Da Organização do Estado (art. 18 ao 43)
  • TÍTULO IV -  Da Organização dos Poderes (art. 44 ao 135)
  • TÍTULO V - Da Defesa do Estado e Das Instituições Democráticas (art.136 ao 144)
  • TÍTULO VI -  Da Tributação e do Orçamento (art. 145 ao 169)
  • TÍTULO VII -  Da Ordem Econômica e Financeira (art. 170 ao 192)
  • TÍTULO VIII -  Da Ordem Social (art. 193 ao 232)
  • TÍTULO IX -  Das Disposições Constitucionais Gerais (art. 233 ao 250)
  • TÍTULO X -  Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (art. 1° ao 114)

O Preâmbulo Constitucional

O Preâmbulo é um texto introdutório, nele se estrutura o prefácio do texto constitucional. Seu objetivo é explicitar os valores que guiam o texto constitucional, servindo de orientação interpretativa para a aplicação das disposições contidas na Carta Maior e no ordenamento jurídico brasileiro.

A Constituição Federal brasileira de 1988, sendo o instrumento normativo norteador do ordenamento jurídico brasileiro, traz em sua estrutura o corpo fundacional da sociedade, tendo em vista que é a partir de seus ditames que é emanada e legitimada a estrutura do Estado Democrático de Direito brasileiro.

Natureza jurídica do Preâmbulo Constitucional

Acerca de sua natureza jurídica, existem três vertentes de grande relevância doutrinária, sendo elas a da Plena Eficácia, a da Relevância Jurídica Indireta e a da Irrelevância Jurídica.

Teoria da Plena Eficácia

A Teoria da Plena Eficácia do preâmbulo constitucional, como já aduz sua nomeação, admite que o texto vestibular da Constituição Federal possui eficácia jurídica equivalente ao restante do texto constitucional. Esta teoria é muito pouco adotada por doutrinadores. Alguns nem a reconhecem como uma teoria, levando em consideração que o procedimento constituinte não dita que o preâmbulo constitucional deva ser obrigatório na redação do texto constitucional.

Teoria da Relevância Jurídica Indireta

A Teoria da Relevância Jurídica Indireta, por sua vez, elenca que o preâmbulo constitucional desempenha função de orientar a identificação das características que regem o texto constitucional, sem possuir, por si próprio, caráter normativo. Nesta teoria, então, o preâmbulo desempenha um papel orientador na identificação das características da Constituição, mas não se confunde com suas normas, não equivale a elas.

Teoria da Irrelevância Jurídica

A tese da Irrelevância Jurídica do preâmbulo constitucional é a mais aceita entre os doutrinadores do direito brasileiro. A tese afirma que o preâmbulo não está situado no campo jurídico, sendo ele exclusiva manifestação das posições políticas adotadas pelo constituinte. É a tese acatada pelo Supremo Tribunal Federal.

Entendimento do Supremo Tribunal Federal (STF) acerca da natureza jurídica constitucional

A corte constitucional brasileira conclui que o preâmbulo constitucional não se situa no âmbito jurídico, mas única e exclusivamente no âmbito político, tendo como finalidade evidenciar a ideologia constituinte. No julgamento da ADI 2076, a excelsa corte entendeu que a supressão da expressão “sob a proteção de Deus” na Constituição estadual acreana não materializa inconstitucionalidade, justificando que o preâmbulo constitucional não possui força normativa, conforme o voto do ministro relator:

O preâmbulo [...] não se situa no âmbito do Direito, mas no domínio da política, refletindo posição ideológica do constituinte. É claro que uma Constituição que consagra princípios democráticos, liberais, não poderia conter preâmbulo que proclamasse princípios diversos. Não contém o preâmbulo, portanto, relevância jurídica. O preâmbulo não constitui norma central da Constituição, de reprodução obrigatória na Constituição do Estado-membro. O que acontece é que o preâmbulo contém, de regra, proclamação ou exortação no sentido dos princípios inscritos na Carta: princípio do Estado Democrático de Direito, princípio republicano, princípio dos direitos e garantias, etc. Esses princípios, sim, inscritos na Constituição, constituem normas centrais de reprodução obrigatória, ou que não pode a Constituição do Estado-membro dispor de forma contrária, dado que, reproduzidos, ou não, na Constituição estadual, incidirão na ordem local. (ADI 2.076, voto do Rel. Min. Carlos Velloso, julgamento em 15-8-2002, Plenário, DJ de 8-8-2003.)

Desta forma, o Supremo Tribunal Federal firmou o entendimento de que o preâmbulo da Constituição Federal não tem eficácia normativa no texto constitucional e no ordenamento jurídico. Afirma que não há obrigatoriedade na evocação da proteção de Deus nos textos Constituições Estaduais. Assim, o preâmbulo se encontra na esfera política e não na jurídica.

A “Proteção de Deus” na CF

O preâmbulo constitucional afirma que:

[...] promulgamos, sob a proteção de Deus, a seguinte CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL.

Reprodução nas Constituições Estaduais

Dentre as Constituições Estaduais brasileiras, todas, com exceção da Constituição Estadual do Acre, invocam em seu texto introdutório a “proteção de Deus” à sua promulgação. O Plenário do Supremo Tribunal Federal considerou improcedente, por unanimidade, Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI 2076) do Partido Social Liberal (PSL) contra a Assembleia Legislativa do Acre por omissão, no preâmbulo da Constituição daquele estado, da expressão “sob a proteção de Deus”.

Na ação julgada, o autor declarava que a supressão desta expressão costumeira constituiria afronta ao preâmbulo da Constituição Federal, que mantém a expressão em seu texto. Para o PSL, tal omissão na Constituição do Acre tornava o estado “o único no país privado de ficar sob a proteção de Deus”. Afirmou-se também que, na Assembleia Nacional Constituinte, a emenda que visava a suprimir da Carta Maior a invocação divina foi derrotada na Comissão de Sistematização.

O relator da ação, o ex-ministro Carlos Velloso, sustentou em seu voto que o preâmbulo constitucional não cria direitos e deveres, nem tem força normativa, refletindo apenas a posição ideológica do constituinte. O preâmbulo da Constituição do Acre, alegou Velloso, não dispõe de forma contrária aos princípios consagrados na Constituição Federal pois enfatiza os princípios democráticos e a soberania popular. O ex-ministro afirmou, ainda, que a referência à proteção de Deus não tem grande significado, tanto que as constituições de países cuja população pratica, em sua maioria, o teísmo não contêm essa referência, como as dos Estados Unidos, França, Itália, Portugal e Espanha.

Decreto n. 119-A

O Decreto 119-A, de redação do jurista Ruy Barbosa, decretado no ano de 1890, o segundo ano da República do Brasil, proíbe a intervenção da Autoridade Federal e dos Estados Federados em matéria religiosa, tendo também por objetivo a consagração da plena liberdade de cultos, bem como extinguir o padroado brasileiro. Na prática, esta norma instituiu no Brasil a liberdade de culto, visto que a liberdade de crença já era aceita no período anterior à edição do decreto. A discussão elencada aqui é acerca do primeiro artigo do texto normativo, que disserta:

 Art. 1º E' prohibido á autoridade federal, assim como à dos Estados federados, expedir leis, regulamentos, ou actos administrativos, estabelecendo alguma religião, ou vedando-a, e crear differenças entre os habitantes do paiz, ou nos serviços sustentados à custa do orçamento, por motivo de crenças, ou opiniões philosophicas ou religiosas.

A questão que se quer levantar é: discriminar, no texto introdutório da Constituição Federal, a proteção de Deus à promulgação do texto constitucional não constituiria uma lesão aos princípios constitucionais?

Na prática, o art.restringe a qualquer autoridade do Poder Público a instituição de normas que estabeleçam alguma religião ou a vedem. No preâmbulo constitucional, a inserção da “proteção de Deus” pode gerar alguma dúvida, sobretudo por parecer contrariar o caráter de laicidade que a Carta exprime.

O tema, entretanto, como citado anteriormente no voto da ADI 2076, é tido como pacificado, tendo em vista que o preâmbulo constitucional fora acatado pelo STF como não situado no campo do Direito. É indiferente, então, a presença ou supressão do dito “sob a proteção de Deus”.

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