Homicídio Qualificado - Feminicídio
Primeiramente, é necessário diferenciar o feminicídio do femicídio. Femicídio ocorre sempre que a vítima é uma mulher. Já o feminicídio é o homicídio praticado contra mulher por razões da condição do sexo feminino (essa é a previsão do art. 121-A, CP).
Feminicídio
Art. 121-A. Matar mulher por razões da condição do sexo feminino:
Pena – reclusão, de 20 (vinte) a 40 (quarenta) anos.
§ 1º Considera-se que há razões da condição do sexo feminino quando o crime envolve:
I – violência doméstica e familiar;
II – menosprezo ou discriminação à condição de mulher.
Razões da condição do sexo feminino ocorrem quando:
- Homicídio decorre de violência doméstica e familiar, ou
- Quando decorre de menosprezo ou discriminação à condição de mulher.
O conceito de violência doméstica e familiar contra a mulher está na Lei Maria da Penha (Lei nº 11.340 de 2006):
Para os efeitos desta Lei, configura violência doméstica e familiar contra a mulher qualquer ação ou omissão baseada no gênero que lhe cause morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial.
Concretiza-se, por exemplo, quando o marido mata a esposa por ela se recusar a ter relações sexuais, ou por ter amigos homens.
O menosprezo à condição de mulher é uma forma de discriminação de gênero, pautada na ideia de inferiorização da mulher. Por exemplo: um homem que mata uma mulher que não quis beijá-o em uma balada; ou o homem que mata uma mulher que foi contratada em seu lugar na empresa. Nesse sentido:
O sujeito ativo do feminicídio pode ser qualquer pessoa, inclusive mulheres!
Já o sujeito passivo são apenas mulheres. Mas qual a abrangência do conceito de mulher na lei? Mulheres trans podem ser vítimas de feminicídio? Tem se consolidado a corrente que admite que mulheres trans sejam vítimas de feminicídio. Inclusive, o STJ reconheceu a aplicação da Lei Maria da Penha a mulheres trans, o que indica posição jurisprudencial no sentido da aplicação também do feminicídio para mulheres trans.
A figura do feminicídio conta, ainda, com causas de aumento de pena (terceira fase da dosimetria), previstas no art. 121-A CP. Assim, a pena é aumentada de um terço até a metade quando:
- O crime é praticado contra pessoa menor de 14 anos ou maior de 60 anos, com deficiência ou com doenças degenerativas que acarretem condição limitante ou de vulnerabilidade física ou mental – ela se justifica, uma vez que são pessoas em situação de maior vulnerabilidade. Entretanto, ela só se aplica quando o agente efetivamente conhece a idade da vítima ou a situação de deficiência.
- O crime é praticado durante a gestação ou nos três meses posteriores ao parto – ela se justifica por conta da maior fragilidade da mulher nesse período da vida, além da possibilidade de caracterização do aborto do bebê.
- No caso de morte do bebê, o agente responderá pelo feminicídio com a pena majorada, bem como pelo aborto praticado sem o consentimento da gestante, em concurso formal impróprio (pela existência de desígnios autônomos – há dolo do homicídio e pelo menos dolo eventual do aborto, e os delitos ocorrem por meio de ação única).
- O crime é praticado na presença física ou virtual (a pessoa não está fisicamente no local, mas assiste a morte, por exemplo em uma chamada de vídeo) de descendente ou ascendente da vítima – justifica-se pelo trauma emocional gerado ao descendente ou ascendente.
- Pratica o crime em descumprimento de determinadas medidas protetivas presentes na Lei Maria da Penha: suspensão da posse ou restrição do porte de armas, com comunicação ao órgão competente; afastamento do lar, domicílio ou local de convivência com a ofendida; e proibição de determinadas condutas, como aproximação ou contato com a ofendida.
Observe que há entendimento do STJ de que a qualificadora do crime de feminicídio é objetiva:
A jurisprudência vem se firmando no sentido de que "não há bis in idem no reconhecimento das qualificadoras do motivo torpe e do feminicídio, porquanto a primeira tem natureza subjetiva e a segunda, objetiva. (Informativo 625 do STJ)