Introdução e Visão Geral da Fixação da Pena Privativa de Liberdade
Introdução à Dosimetria da Pena
Vamos estudar a parte do Direito Penal que se ocupa de determinar a dosagem da pena a partir da legislação contida no Código Penal (CP) e nas leis esparsas.
Primeiramente, é necessário que nos lembremos do princípio da legalidade, uma garantia do Direito Penal.
- Não há pena sem prévia cominação legal
- Decorrência 1: legalidade é igual a reserva legal mais anterioridade da lei penal.
- Decorrência 2: praticada a infração penal, nasce o poder-dever do Estado de aplicar a pena (monopólio estatal da aplicação de punições)
A dosimetria é uma forma de consagrar a individualização da pena (garantida pela Constituição Federal, no art. 5º, XLVI: “a lei regulará a individualização da pena”). Esta, por sua vez, tem alguns requisitos:
- Requer-se o devido processo legal
- Princípios do contraditório e da ampla defesa: a parte deve poder contraditar todo o processo e ter efetiva possibilidade de ampla defesa antes da fixação da pena
- A sentença encerra o processo penal e fixa a pena
O mesmo ocorre com a suspensão condicional do processo, que também acontece em crimes de menor gravidade. Para esses dois casos, não existe execução da pena – porque não existe pena! O processo tem que seguir como se não houvesse transação penal/suspensão.
Neste momento, para prosseguir com a matéria, é necessário fixarmos alguns conceitos-chave:
- Reincidência – no Direito Penal, significa já se ter uma condenação transitada em julgado antes da prática de novo fato (sujeita à limitação que veremos no item 5);
- Preceito secundário do tipo – o tipo penal vem sempre acompanhado da pena cominada abstratamente (ex: no artigo 121 caput do CP, lê-se “Pena – reclusão, de seis a vinte anos”; este é o preceito secundário do tipo), o que é importante para que, na aplicação, o magistrado saiba quais são os limites legais para a pena que poderá impor ao condenado no caso concreto;
- Causas de aumento e de diminuição da pena – elas incidem na terceira fase da dosimetria da pena, também para auxiliar o juiz. Em regra, estão na parte geral do CP. Ex: a tentativa, segundo o art. 14, II, parágrafo único do CP, é causa de diminuição da pena, pois “pune-se a tentativa com a pena correspondente ao crime consumado diminuída de um a dois terços”
- Agravantes e atenuantes – não têm quantum definido na lei, não é possível saber quanto o juiz aumentará ou diminuirá a pena. As circunstâncias são de natureza genérica, e sua definição cabe à pessoa do julgador. Também estão previstas, em regra, na parte geral.
- Maus antecedentes – condenações com trânsito em julgado que não servem para reincidência. Trânsitos em julgado que tenham ocorrido a mais de 5 anos da data do novo crime cometido não serão computados para reincidência! Só serão considerados, então, quando se for verificar o histórico do indivíduo para verificar possíveis maus antecedentes.
Obs. 1: o STF já entendeu que não é possível aumentar a pena por conta de maus antecedentes, porque esta possibilidade faz que o indivíduo pague pelo mesmo crime mais de uma vez. A pena aplicada a um crime só deveria pesar temporariamente sobre a pessoa, não devendo ser reavivada uma vez que já cumprida. O entendimento majoritário, no entanto, continua sendo contrário a este.
Obs. 2: o STJ veda a utilização de inquéritos penais e ações penais em curso para agravar pena-base (Súmula 444). Não se os consideram para maus antecedentes nem para fins de reincidência. - Qualificadoras – são circunstâncias de natureza subjetiva ou objetiva que modificam o preceito secundário do tipo penal.
Visão Geral da Fixação da Pena Privativa de Liberdade
O sistema trifásico de Nelson Hungria é o que se adota no Brasil. Segundo o art. 68 do CP:
Art. 68 - A pena-base será fixada atendendo-se ao critério do art. 59 deste Código; em seguida serão consideradas as circunstâncias atenuantes e agravantes; por último, as causas de diminuição e de aumento.
Esse artigo remete-se ao art. 59, que se refere às circunstâncias judiciais. A segunda fase considera agravantes e atenuantes e a terceira, aumento e diminuição.
PRIMEIRA FASE
- juiz fixa a pena base a partir do preceito secundário do tipo;
► lembrar que, caso exista qualificadora, a pena base já parte de um patamar superior (ex.: homicídio qualificado tem pena cominada abstratamente de 12 a 30 anos)
SEGUNDA FASE
- fixação da pena intermediária, após análise de agravantes e atenuantes;
TERCEIRA FASE
- o juiz parte da pena intermediária e analisa se há causas de aumento e de diminuição, e as aplica.
Obs.: depois da fixação da pena, passa-se à fixação do regime. Nessa etapa, verifica-se se é possível substituir pena privativa de liberdade por pena restritiva de direitos (o que o juiz pode fazer mas não obrigatóriamente). Verifica-se também se é possível a suspensão condicional do processo antes do cumprimento da pena.
Para a substituição, é necessário que se observem os incisos do art. 44 do CP:
Art. 44. As penas restritivas de direitos são autônomas e substituem as privativas de liberdade, quando:
I – aplicada pena privativa de liberdade não superior a quatro anos e o crime não for cometido com violência ou grave ameaça à pessoa ou, qualquer que seja a pena aplicada, se o crime for culposo;
II – o réu não for reincidente em crime doloso;
III – a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social e a personalidade do condenado, bem como os motivos e as circunstâncias indicarem que essa substituição seja suficiente.”