Introdução e Visão Geral da Fixação da Pena Privativa de Liberdade

Introdução à Dosimetria da Pena

Vamos estudar a parte do Direito Penal que se ocupa de determinar a dosagem da pena a partir da legislação contida no Código Penal (CP) e nas leis esparsas.

Primeiramente, é necessário que nos lembremos do princípio da legalidade, uma garantia do Direito Penal.

  • Não há pena sem prévia cominação legal
  • Decorrência 1: legalidade é igual a reserva legal mais anterioridade da lei penal.
  • Decorrência 2: praticada a infração penal, nasce o poder-dever do Estado de aplicar a pena (monopólio estatal da aplicação de punições)
 Obs.: O Direito Penal dever ser aplicado única e exclusivamente pelo Estado por ser a ultima ratio (isto é, a possibilidade de intervenção nas vidas dos indivíduos deve ser usada apenas quando todos os outros meios de solução do problema se esgotarem), mas há uma exceção contida no art. 57 do Estatuto do Índio! Permite-se à tribo indígena aplicar pena criminal em alguns casos bastante específicos.

A dosimetria é uma forma de consagrar a individualização da pena (garantida pela Constituição Federal, no art. 5º, XLVI: “a lei regulará a individualização da pena”). Esta, por sua vez, tem alguns requisitos:

  • Requer-se o devido processo legal
  • Princípios do contraditório e da ampla defesa: a parte deve poder contraditar todo o processo e ter efetiva possibilidade de ampla defesa antes da fixação da pena
  • A sentença encerra o processo penal e fixa a pena
 IMPORTANTE: existe, no Direito Penal, a possibilidade de transação penal para casos de menor gravidade. Importante é lembrar que a transação penal NÃO é pena. Tanto não é que ela é aplicada sem a ampla defesa e o contraditório – ela é medida despenalizadora.

O mesmo ocorre com a suspensão condicional do processo, que também acontece em crimes de menor gravidade. Para esses dois casos, não existe execução da pena – porque não existe pena! O processo tem que seguir como se não houvesse transação penal/suspensão.

Neste momento, para prosseguir com a matéria, é necessário fixarmos alguns conceitos-chave:

  1. Reincidência – no Direito Penal, significa já se ter uma condenação transitada em julgado antes da prática de novo fato (sujeita à limitação que veremos no item 5);
  2. Preceito secundário do tipo – o tipo penal vem sempre acompanhado da pena cominada abstratamente (ex: no artigo 121 caput do CP, lê-se “Pena – reclusão, de seis a vinte anos”; este é o preceito secundário do tipo), o que é importante para que, na aplicação, o magistrado saiba quais são os limites legais para a pena que poderá impor ao condenado no caso concreto;
  3. Causas de aumento e de diminuição da pena – elas incidem na terceira fase da dosimetria da pena, também para auxiliar o juiz. Em regra, estão na parte geral do CP. Ex: a tentativa, segundo o art. 14, II, parágrafo único do CP, é causa de diminuição da pena, pois “pune-se a tentativa com a pena correspondente ao crime consumado diminuída de um a dois terços”
  4. Agravantes e atenuantes – não têm quantum definido na lei, não é possível saber quanto o juiz aumentará ou diminuirá a pena. As circunstâncias são de natureza genérica, e sua definição cabe à pessoa do julgador. Também estão previstas, em regra, na parte geral.
  5. Maus antecedentes – condenações com trânsito em julgado que não servem para reincidência. Trânsitos em julgado que tenham ocorrido a mais de 5 anos da data do novo crime cometido não serão computados para reincidência! Só serão considerados, então, quando se for verificar o histórico do indivíduo para verificar possíveis maus antecedentes. 
    Obs. 1: o STF já entendeu que não é possível aumentar a pena por conta de maus antecedentes, porque esta possibilidade faz que o indivíduo pague pelo mesmo crime mais de uma vez. A pena aplicada a um crime só deveria pesar temporariamente sobre a pessoa, não devendo ser reavivada uma vez que já cumprida. O entendimento majoritário, no entanto, continua sendo contrário a este.
    Obs. 2: o STJ veda a utilização de inquéritos penais e ações penais em curso para agravar pena-base (Súmula 444). Não se os consideram para maus antecedentes nem para fins de reincidência.
  6. Qualificadoras – são circunstâncias de natureza subjetiva ou objetiva que modificam o preceito secundário do tipo penal.

Visão Geral da Fixação da Pena Privativa de Liberdade

O sistema trifásico de Nelson Hungria é o que se adota no Brasil. Segundo o art. 68 do CP:

Art. 68 - A pena-base será fixada atendendo-se ao critério do art. 59 deste Código; em seguida serão consideradas as circunstâncias atenuantes e agravantes; por último, as causas de diminuição e de aumento.

Esse artigo remete-se ao art. 59, que se refere às circunstâncias judiciais. A segunda fase considera agravantes e atenuantes e a terceira, aumento e diminuição.

PRIMEIRA FASE

- juiz fixa a pena base a partir do preceito secundário do tipo;

► lembrar que, caso exista qualificadora, a pena base já parte de um patamar superior (ex.: homicídio qualificado tem pena cominada abstratamente de 12 a 30 anos)

SEGUNDA FASE

- fixação da pena intermediária, após análise de agravantes e atenuantes;

TERCEIRA FASE

- o juiz parte da pena intermediária e analisa se há causas de aumento e de diminuição, e as aplica.

Obs.: depois da fixação da pena, passa-se à fixação do regime. Nessa etapa, verifica-se se é possível substituir pena privativa de liberdade por pena restritiva de direitos (o que o juiz pode fazer mas não obrigatóriamente). Verifica-se também se é possível a suspensão condicional do processo antes do cumprimento da pena.

Para a substituição, é necessário que se observem os incisos do art. 44 do CP:

  Art. 44. As penas restritivas de direitos são autônomas e substituem as privativas de liberdade, quando:
        I – aplicada pena privativa de liberdade não superior a quatro anos e o crime não for cometido com violência ou grave ameaça à pessoa ou, qualquer que seja a pena aplicada, se o crime for culposo;
        II – o réu não for reincidente em crime doloso;
        III – a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social e a personalidade do condenado, bem como os motivos e as circunstâncias indicarem que essa substituição seja suficiente.”

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