Nos dois blocos anteriores, foram analisadas as hipóteses legais que autorizam a prevalência do negociado sobre o legislado.
Foi possível constatar que o Acordo e a Convenção Coletiva de Trabalho possuem ampla margem de atuação, mas não são instrumentos absolutos e ilimitados.
Tal conclusão decorre, entre outros fatores, do princípio da adequação setorial negociada, estudado no início do curso, que impõe limites à negociação coletiva.
O presente bloco visa detalhar esses limites.
Historicamente, as normas trabalhistas foram compreendidas como normas de ordem pública, de natureza indisponível, o que significa que, em regra, não podiam ser objeto de transação.
Dentro desse contexto, distinguem-se dois tipos de normas:
Exemplos clássicos de normas de indisponibilidade absoluta incluem: normas sobre duração do trabalho, segurança e saúde no trabalho, medidas antidiscriminatórias, como a Cota Legal de Aprendizagem e para Pessoas com Deficiência, bem como normas de inserção, proteção e manutenção da mulher no mercado de trabalho.
As normas constitucionais também se enquadram nessa categoria, sendo vedada sua redução ou supressão por meio de negociação coletiva.
A Reforma Trabalhista, por meio do art. 611-A da CLT, trouxe um rol exemplificativo de temas que podem ser flexibilizados por negociação coletiva, em que o negociado prevalece sobre o legislado.
Por outro lado, o art. 611-B estabelece um rol taxativo de direitos que não podem ser objeto de acordo ou convenção coletiva de trabalho.
Art. 611-B. Constituem objeto ilícito de convenção coletiva ou de acordo coletivo de trabalho, exclusivamente, a supressão ou a redução dos seguintes direitos:
I - normas de identificação profissional, inclusive as anotações na Carteira de Trabalho e Previdência Social;
II - seguro-desemprego, em caso de desemprego involuntário;
III - valor dos depósitos mensais e da indenização rescisória do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS);
IV - salário mínimo;
V - valor nominal do décimo terceiro salário;
VI - remuneração do trabalho noturno superior à do diurno;
VII - proteção do salário na forma da lei, constituindo crime sua retenção dolosa;
VIII - salário-família;
IX - repouso semanal remunerado;
X - remuneração do serviço extraordinário superior, no mínimo, em 50% (cinquenta por cento) à do normal;
XI - número de dias de férias devidas ao empregado;
XII - gozo de férias anuais remuneradas com, pelo menos, um terço a mais do que o salário normal;
XIII - licença-maternidade com a duração mínima de cento e vinte dias;
XIV - licença-paternidade nos termos fixados em lei;
XV - proteção do mercado de trabalho da mulher, mediante incentivos específicos, nos termos da lei;
XVI - aviso prévio proporcional ao tempo de serviço, sendo no mínimo de trinta dias, nos termos da lei;
XVII - normas de saúde, higiene e segurança do trabalho previstas em lei ou em normas regulamentadoras do Ministério do Trabalho;
XVIII - adicional de remuneração para as atividades penosas, insalubres ou perigosas;
XIX - aposentadoria;
XX - seguro contra acidentes de trabalho, a cargo do empregador;
XXI - ação, quanto aos créditos resultantes das relações de trabalho, com prazo prescricional de cinco anos para os trabalhadores urbanos e rurais, até o limite de dois anos após a extinção do contrato de trabalho;
XXII - proibição de qualquer discriminação no tocante a salário e critérios de admissão do trabalhador com deficiência;
XXIII - proibição de trabalho noturno, perigoso ou insalubre a menores de dezoito anos e de qualquer trabalho a menores de dezesseis anos, salvo na condição de aprendiz, a partir de quatorze anos;
XXIV - medidas de proteção legal de crianças e adolescentes;
XXV - igualdade de direitos entre o trabalhador com vínculo empregatício permanente e o trabalhador avulso;
XXVI - liberdade de associação profissional ou sindical do trabalhador, inclusive o direito de não sofrer, sem sua expressa e prévia anuência, qualquer cobrança ou desconto salarial estabelecidos em convenção coletiva ou acordo coletivo de trabalho;
XXVII - direito de greve, competindo aos trabalhadores decidir sobre a oportunidade de exercê-lo e sobre os interesses que devam por meio dele defender;
XXVIII - definição legal sobre os serviços ou atividades essenciais e disposições legais sobre o atendimento das necessidades inadiáveis da comunidade em caso de greve;
XXIX - tributos e outros créditos de terceiros;
XXX - as disposições previstas nos arts. 373-A, 390, 392, 392-A, 394, 394-A, 395, 396 e 400 desta Consolidação.
Parágrafo único. Regras sobre duração do trabalho e intervalos não são consideradas como normas de saúde, higiene e segurança do trabalho para os fins do disposto neste artigo.
Conforme o caput, constitui objeto ilícito de convenção ou acordo coletivo de trabalho a redução, ou supressão dos direitos elencados no referido dispositivo.
O art. 611-B traz uma lista extensa dos direitos que não podem ser flexibilizados, entre os quais se destacam:
É importante não confundir o conteúdo do art. 611-B com o disposto no art. 611-A. Este último permite, por exemplo, a negociação sobre o enquadramento do grau de insalubridade (mínimo, médio ou máximo), mas não autoriza a redução do percentual do adicional correspondente ao grau de exposição.
Ainda no rol de vedações do art. 611-B, não se pode dispor, por acordo ou convenção coletiva de trabalho, sobre:
Sobre este último ponto, é necessário destacar um adendo importante: no âmbito do curso de organização sindical, foi estudado o Tema 935 de repercussão geral do STF, em que a Corte entendeu ser constitucional a instituição de contribuição assistencial por meio de acordo ou convenção coletiva, aplicável a todos os trabalhadores (filiados ou não ao sindicato), desde que garantido o direito de oposição.
Essa contribuição tem por objetivo custear os gastos da entidade sindical com a negociação coletiva. Assim, é válida a sua imposição, desde que se respeite o direito do trabalhador de manifestar formalmente sua discordância.
Ainda segundo o art. 611-B, é vedado negociar:
Por fim, o parágrafo único do art. 611-B estabelece que as regras sobre duração do trabalho e intervalos não são consideradas normas de saúde, higiene ou segurança do trabalho para os fins desse artigo.
Isso significa que tais regras não possuem natureza de ordem pública absoluta e, portanto, podem ser objeto de flexibilização por meio de negociação coletiva.